Mulheres chefiam o forno na Oli Pizzas
Com um misto de força e delicadeza, a chef Olivia Maita cria receitas italianas tradicionais, mas sempre com um toque de personalidade
Esqueça os ambientes industriais, a decoração sem graça ou quase inexistente e a brutalidade que pode carregar uma pizzaria. Nas mãos da chef Olivia Maita, esse cenário é ressignificado com delicadeza.
Mesmo diante do exaustivo calor do fogo, é com o semblante sereno — e com muita classe, diga-se de passagem — que ela abre as massas e as leva para assar nos fornos da Oli Pizzas.
A suavidade dessa atmosfera se expande também para o salão: o clássico e o contemporâneo se encontram nos lustres de diferentes alturas, nas louças de seu acervo pessoal e nos móveis de estilo vintage garimpados. É possível enxergar um pouco da Olivia — tanto a cozinheira quanto a mãe e a empreendedora — em cada detalhe de seu estabelecimento.
Se a figura de uma mulher comandando as etapas da confecção de uma pizza não é tão comum por aí, essa história é reescrita em seu restaurante em São Paulo. “Por que existem tão poucas mulheres nesse posto?”, a chef constantemente se pergunta. Pois quem visitar a casa, localizada no bairro do Itaim Bibi, irá sempre encontrar uma mulher à frente do forno à lenha.
“Eu nem entendo porque é um posto tão masculino, pois não exige nada que a gente não possa fazer como mulher. É algo cultural. Não conheço nenhuma pizzaria que tenha, que seja, uma mulher. Nem picando os ingredientes”, pontua a pizzaiola.
“Para mim foi uma coisa tão natural, nem passava pela minha cabeça que seria algo exclusivamente feito por homens. Hoje, de forma orgânica, só temos mulheres na pizzaria — sou eu e mais três. Nenhuma delas era pizzaiola, treinei todas. Vejo que a mulher tem um cuidado com o processo, com a massa… Elas são ágeis, cuidadosas e têm uma percepção final do produto muito interessante.”
Sua história com as massas de longa fermentação começou com o pão: Olivia desde criança foi uma apaixonada pela gastronomia, mas se encantou, sobretudo, pela persistência exigida para obter um bom fermento.
“Além dele ser um elemento vivo, a cada fornada você tem uma surpresa. O pão exige um cuidado no processo como um todo, isso me instigou. Lembro de levar o meu levain para onde eu ia, porque precisava alimentá-lo para que não morresse. Já cheguei a levar para um restaurante, de tão louca, sério, quase como um pet”, se diverte. O trabalho valeu a pena, já que o levain cultivado pela cozinheira está vivíssimo e é o mesmo utilizado nas receitas há sete anos.
A primeira pizza que executou foi um pedido de sua mãe, que a ajudava a tocar o dia a dia no restaurante e acreditava no potencial da filha. No começo do negócio, a ideia era ter uma minipadaria artesanal, atendendo por encomendas e fazendo eventos fechados. A pizza veio por acaso: “Logo que o forno chegou, minha mãe me pediu para fazer uma pizza, algo que eu nunca tinha feito”, relembra sobre sua primeira tentativa.
O resultado foi tão positivo que a experiência acabou se transformando em “pizzadas” servidas no restaurante às sextas-feiras — isso em 2019, ano de inauguração da casa, antes localizada na Vila Madalena. “Atendíamos de 30 a 40 pessoas com reserva, eu ficava na cozinha de manhã até à noite, porque eu fazia simplesmente tudo, e minha mãe era a garçonete. E assim a gente ia se virando.”
“Só temos mulheres na pizzaria − sou eu e mais três. Nenhuma delas era pizzaiola, treinei todas. Vejo que a mulher tem um cuidado com o processo”
Olivia Maita
A vontade de fazer o negócio dar certo, alavancada pela paixão de Olivia por cozinhar, fez com que a chef se desdobrasse no papel de empreendedora. Era ela quem realizava as compras dos insumos, cuidava das redes sociais, fazia todo o preparo dos pratos na cozinha, atendia aos clientes no salão e ainda lavava o chão ao final do expediente.
“Foi bem sacrificante, porque trabalhava de 15 a 18 horas por dia. Às vezes, eu não sentia minhas pernas de tanto que ficava em pé. Por outro lado, eu sei fazer de tudo, não me aperto. De certa forma, consegui equilibrar os pratinhos de uma maneira amadora, mas que me levou a profissionalizar o negócio.”
De lá para cá, a Oli Pizzas ganhou um cardápio mais encorpado, com opções que vão além da pizza, da entradinha à sobremesa, e noites de jazz às quartas-feiras. Com a mudança de bairro, agora no Itaim, a chef também prevê um brunch aos finais de semana e, muito em breve, a inauguração de sua tão sonhada padaria na mesma rua: a Oli Pane.
“A ideia é que seja uma salumeria bem fresca, então todo dia vai sair pão fresquinho para montar um panino; os embutidos vão ser fatiados na hora… Vai ser possível almoçar ou até comer uma tábua de frios no final do dia com uma taça de vinho…”, idealiza a chef.
UMA ODE AO CLÁSSICO
Assim como a decoração da Oli Pizzas impacta pela beleza da união entre o vintage e o moderno, o cardápio criado por Olivia tem o mesmo efeito. Fã das receitas tradicionais, a chef busca trazer para sua casa criações que respeitam as raízes culinárias, mas sem cair na monotonia.
Seus pratos brincam com diferentes texturas, evidenciam o agridoce e, principalmente, se destacam pela escolha dos ingredientes. Um exemplo é o vitello tonnato: “Algumas receitas exageram no atum e você não sente a carne, fica muito forte”.
O seu é feito com carne de vitela cozida lentamente e cortada em fatias finas. O toque da chef está no molho de atum, que ganha leveza com alcaparras e limão, depois servido com pão da casa.
Outro clássico italiano são as flores de abobrinha: o sabor suave e levemente adocicado rende uma entradinha suculenta ao ser recheada com ricota.
“É um ingrediente que você precisa saber trabalhar, porque é muito delicado. Depois do recheio, senti falta de um elemento. E assim passei a servir com molho de tomate, que traz uma acidez que a faz crescer na boca e ganhar complexidade. A bottarga em pó na finalização traz um salgadinho delicioso”, detalha.
Entre as opções de pizzas, estão coberturas clássicas, mas Olivia reserva também espaço para criações — sempre se mantendo fiel às suas convicções gastronômicas.
“Tenho um pouco de preconceito com certos ingredientes na pizza. Não uso catupiry, nem frango ou camarão, frutos do mar em geral. Minha pegada é mais tradicional mesmo, mas com os toques que trazem um pouco da Oli”, pontua. A belíssima Guanciale une produtos clássicos italianos numa combinação criada pela chef: queijo pecorino, aspargos e bochecha de porco.
Junto à evolução de seu negócio, Olivia enxerga um desenvolvimento pessoal. Se no início sua presença se fez essencial, chegou o momento de colher o resultado de tanto empenho.
“Desde que engravidei, precisei entender que não dava mais para fazer tudo. Fui obrigada a tirar esse controle de cima de mim e delegar”, relata ela, que é mãe do pequeno Vittorio.
“Hoje consigo ter uma visão do meu negócio muito mais esclarecida, tenho mais segurança e sei aonde quero chegar. As decepções têm outro impacto, antes achava que ‘acabou minha vida, vou fechar o restaurante’, mas é uma coisa que faz parte do jogo. Agora entendo que isso aqui é uma parte da minha vida, não é minha vida. É complexo, mas é o que me satisfaz. Estou envolvida em tudo, mas não preciso necessariamente fazer tudo.”
CRÉDITOS DE PRODUÇÃO
Texto: Marina Marques
Fotos: Bruno Geraldi
Edição de arte: Jessica Hradec
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