Amizades no trabalho: ter ou não ter?
As amizades em empresas são tema de vasta discussão. Especialistas explicam se é positivo
As amizades no trabalho rendem bastante discussão: ter ou não ter? Segundo dados da Gallup, um trabalhador passa, em média, 81.396 horas de sua vida no ambiente profissional. Portanto, há quem pense que é importante criar laços e relacionamentos para dar um senso de pertencimento, além de aumentar a participação ativa. Já outros discutem o cenário com outros olhares, enxergando neste vínculo a possibilidade de nutrir conflitos desconfortáveis.
“O desenvolvimento de amizades no ambiente de trabalho é um tópico que muitos profissionais questionam quanto à conduta nas organizações. Embora a presença de amigos no ambiente de trabalho, geralmente, tenha muitos benefícios, também pode apresentar desafios de convivência, além de potencialmente afetar a produtividade, dependendo de como essas amizades são gerenciadas”, pontua Samantha Mazzero, professora da FIA Business School com experiência extensiva em Inteligência Empresarial e Estratégia.
Benefícios de ter amizades no trabalho
Segundo estudo feito pelo site de empregos Comparably, ter amigos no trabalho não é apenas a chave para a felicidade, mas é essencial para ter uma carreira de sucesso.
As pessoas em cargos de nível de entrada, por exemplo, são as menos propensas a dizerem que têm um amigo próximo no trabalho (53%), enquanto 60% das pessoas que possuem entre um e seis anos de experiência responderam positivamente. Mas, no fim, existem benefícios em ter amigos no espaço de trabalho?
Pelo lado corporativo, a presença de amizades no local de trabalho pode contribuir para o desenvolvimento de um ambiente acolhedor e colaborativo: “Isso, por sua vez, pode impulsionar a produtividade, uma vez que, equipes coesas tendem a apresentar melhores resultados”, explica Larissa Fonseca, psicóloga e desenvolvedora de programas de saúde mental corporativa.
Isso também estimula uma comunicação aberta entre os colaboradores, o que leva a um ambiente com maior engajamento, pois os eles se sentem mais conectados à empresa e mais engajados em suas tarefas.
“A gestão de conflitos também pode ser uma consequência positiva, visto que relacionamentos entre colegas de trabalho podem ajudar a reduzir o conflito e a tensão que comumente paira no ambiente”, acrescenta Samantha.
Para além da produtividade, as amizades no ambiente corporativo também podem ter benefícios para os colaboradores. “Há uma perspectiva psicológica, visto que essas relações podem fornecer um sistema de apoio emocional para lidar com o estresse e os desafios do trabalho, de alguém que ‘entende’ a situação do outro, pois vivencia na sua realidade diária”, diz a especialista em Inteligência Empresarial.
Ainda nesse contexto, a ausência de laços pode contribuir para o adoecimento mental dos profissionais, visto que promove o isolamento e, por sua vez, favorece o desenvolvimento de transtornos mentais – afinal, passamos mais de 6 horas diárias ali.
“A falta de conexões sociais resulta em aumento do estresse, sintomas de ansiedade, depressão e transtornos alimentares. Reconhecemos que o trabalho não é o local ideal para buscar apoio emocional, porém, bons amigos tornam o dia mais leve e, ainda por cima, nos trazem o reconhecimento de nossas capacidades, o que fomenta a autoestima”, explica a psicóloga.
Segundo pesquisa do Instituto Gallup, ter pelo menos um amigo no local de trabalho pode fazer com que todos tenham uma maior satisfação com o emprego, com menos chances de procurar outro. Em 2022, por exemplo, o percentual de pessoas que consideravam trabalhar em um ótimo ambiente foi de 21% entre os que não tinham amigos, contra 44%.
Amizades no trabalho podem ser negativas?
Embora tenha diversos benefícios, as amizades no ambiente corporativo podem gerar desafios de convivência: “Podemos destacar situações desconfortáveis caso haja conflitos pessoais entre os amigos ou se as linhas entre o profissional e o pessoal se tornem turvas”, coloca Samantha.
As profissionais ainda destacaram que, caso haja tratamentos preferenciais, pode passar a gerar ressentimentos entre os demais colegas, o que pode ter impacto na produtividade.
“A sensação de serem preteridos e excluídos fomenta o isolamento social, a sensação de incapacidade e pode até levar ao burnout”, acrescenta a psicóloga.
Ainda sobre a produtividade, a mesma pode ser impactada conforme cada indivíduo se relaciona com prazeres, ambiente profissional, responsabilidades, procrastinação e até dificuldade em focar.
“Se as amizades se tornarem muito dominantes e interferirem no foco e na eficiência das tarefas, isso pode afetar negativamente a produtividade. Além disso, se os amigos passarem muito tempo socializando em detrimento do trabalho, isso também pode prejudicar”, explica Samantha.
Ademais, a psicóloga destaca que, entre os principais desafios, o maior deles reside em perceber uma fragilidade pessoal e não a utilizar como preconceito que julgue o profissional através do conhecimento de características pessoais.
Ter ou não ter?
Entre os benefícios e os desafios que enquadram o tema, essa é uma pergunta que muitas vezes fica sem resposta, porque, usualmente, isso depende de como você lida com relacionamentos.
“A mistura entre vida profissional e pessoal pode ser saudável até certo ponto, desde que haja a definição e o respeito por limites estabelecidos por todas as partes envolvidas. Contudo, é imperativo manter a discrição, confidencialidade, respeito e, principalmente, a responsabilidade individual nas próprias tarefas”, reflete Larissa.
Portanto, é essencial não interromper as atividades profissionais dos amigos – que, ao mesmo tempo, ainda são colegas de trabalho – para solicitar acolhimento ou, inclusive, um momento de descontração.
“É fundamental priorizar o sigilo, separar os papéis, manter a integridade da relação, a transparência emocional de desconfortos e, jamais, diminuir o profissional que há no colega dentro do ambiente profissional”, acrescenta a psicóloga.
Para o questionamento, a professora responde: “Invariavelmente, o trabalho é parte integrante e essencial de nossas vidas e, como seres humanos, criamos vínculos onde convivemos. Portanto, é natural que amizades surjam por interesses comuns.”
Como estabelecer limites nas amizades de trabalho?
Para que as amizades sejam benéficas, é indispensável estabelecer alguns limites entre os colegas, o que exige uma abordagem equilibrada entre amizade e trabalho.
“É crucial estabelecer uma clara separação entre assuntos pessoais e profissionais. Desta forma, garante que a amizade não comprometa a objetividade ou imparcialidade. É fundamental respeitar a confidencialidade das informações relacionadas ao trabalho e evitar qualquer forma de julgamento atribuído ao aspecto pessoal”, coloca a psicóloga.
Por fim, é importante lembrar que, mesmo com amizades, o trabalho continua sendo o que é: trabalho. Portanto, cultive suas amizades sem nutrir um esquecimento das suas tarefas diárias.