Conheça Fabi Wan, uma apaixonada pelas manualidades e saberes ancestrais
Crochê, marcenaria, tricô... A jovem, criadora da Escola Vida Manual, mostra os detalhes de sua casa no litoral catarinense repleta de artes feitas à mão
Tricotar, aprender o básico de marcenaria ou fazer um pão com as próprias mãos podem ser, para muitos, atividades terapêuticas a serem cumpridas com o intuito de desestressar. Contudo, para Fabiana Wan, as manualidades sempre foram mais do que isso: são um ato de liberdade.
O primeiro aprendizado foi o da costura, um conhecimento passado de avó para neta que, mais tarde, serviria como uma ponte para tantos outros feitos na vida da jovem de 24 anos. “Minha avó é japonesa e meu avô chinês. Eles vieram de uma realidade muito dura, fugiram do Japão para o Brasil com meu pai ainda pequeno. Então, o ‘feito à mão’ era uma necessidade, mas acabava sendo divertido, de certa forma. Lembro de irmos a lojas de tecido para fazermos roupas, e da minha avó fazendo cola de arroz para brincarmos de colagem. Muitas coisas eram feitas em casa, em vez de compradas”, conta ela sobre o que define como uma infância criativa.
Moradora de Garopaba, em Santa Catarina, Fabi compartilha a rotina de um dia a dia norteado pelo “fazer com as mãos”. Além de mostrar suas habilidades no perfil @vidamanual, a paulista criada em Florianópolis montou a Escola Vida Manual, que traz tutoriais para disseminar o conhecimento adquirido ao longo dos anos.
Em 2018, enquanto cursava gastronomia, ela percebeu que seus interesses não estavam tão alinhados com os dos outros colegas de sala. Técnicas francesas e alta gastronomia não eram as aulas preferidas, mas seus olhos brilhavam ao falar de fermentação e alimentação como caminho para a saúde. “Tiravam muito sarro de mim, porque eu fazia kombucha e na época nem sabiam o que era. Contudo, foi um despertar”, define.
Dessa conexão de como a culinária poderia ser a transformação química das coisas, Fabi lançou, à época, o Corpo Casa Manual, programa online no qual dava o passo a passo de produtos de cuidado e higiene para o corpo e para a casa apenas com ingredientes naturais. “Comecei vendendo em feirinhas, mas, num determinado momento, achei que faria mais sentido ensinar as pessoas a fazerem seus próprios artigos.”
“A manualidade traz para as crianças outra qualidade de presença, é uma surpresa. É dar um voto de confiança para que ele faça as coisas”
Com a chegada de Lotus, seu primeiro filho, veio também o desejo de expandir a habilidade manual para outros campos: marcenaria, permacultura, construção e confecção de roupas para sua família. Essas vontades também foram impulsionadas por um projeto concretizado ao lado de seu ex-companheiro, quando encararam o desafio de construir uma casa do zero, pensando em soluções sustentáveis. A estrutura foi feita a partir de madeira de demolição e paredes de pau a pique — técnica em que se mistura barro, areia e palha.
Com a separação conjugal e a necessidade de trocar de moradia, a jovem enfrentou uma fase de incertezas. “A casa acaba sendo um referencial nesse estilo de vida, é diferente de jovens que hoje em dia moram em apartamentos em cidades grandes e a vida acontece fora, sendo a casa um lugar apenas de descanso. Na minha rotina, ainda mais tendo filhos, a casa é onde a vida acontece. Foi um processo de desapego e de avaliar o que era desnecessário. Reconstruir um ninho foi desafiador, mas também é entender que podemos fazê-lo em qualquer lugar, podendo, inclusive, ser numa casa alugada, que é a situação que estou hoje”, relata.
De fora para dentro
Fabi e o pequeno Lotus vivem em uma casa localizada num sítio no litoral catarinense rodeado por patos, cavalos, galinhas e um lago. Em busca de trazer esse cenário bucólico para dentro de casa, ela recorre a tons neutros e aposta na repetição de cores da natureza em detalhes da decoração.
“Quando você olha para a natureza, não vê cores gritantes, estampas… Eu gosto de reproduzir isso internamente, não só pela estética, mas por um aspecto emocional, de como me sinto em paz.”
Com uma planta simples, formada basicamente por um ambiente e poucas divisões, a casa traz a possibilidade de reunir tudo o que é importante no campo de visão da moradora. “Da sala, vejo a cozinha, meu lugar de trabalho e a área em que o Lotus brinca. É nesse espaço em que a vida acontece.”
Conhecimento que liberta
Mais que encontrar prazer nos fazeres manuais, Fabiana reconhece nesse exercício um caminho de liberdade. “Ser livre é ser capaz de realizar aquilo que precisamos para sobreviver. Mas gosto também de verbalizar que não precisamos fazer tudo o que consumimos. O saber te dá ferramentas para escolher o quê e quanto consumir. É muito precioso o fato de que, uma vez que a gente aprende, podemos repassar o aprendizado infinitamente.”
“Um dos pilares do fazer manual é o tempo: precisamos fazer as pazes com ele, pois as coisas mais bonitas vêm da persistência”
Compartilhar conhecimento é o que ela mais tem feito desde o nascimento de Lotus, há dois anos. “Ser mãe era um sonho, tinha claro que queria repetir com meu filho as coisas que fazia com meus pais. Foi incrível, desde grávida, costurar as roupas dele, as fraldas, tricotar as meias… Encontrei muito prazer na possibilidade de fazer coisas para outra pessoa. É lindo dar esse exemplo, ele sempre fala sobre as roupinhas que a mamãe fez.”
Desde muito pequeno, seu filho está inserido nas atividades manuais, seja nas confecções de marcenaria, na cozinha, no tricô e até mesmo capinando o mato ou colhendo os frutos da horta. “Nos primeiros anos de maternidade, você doa seu corpo para outra pessoa, tive que aprender a ter menos tempo disponível. Me baseio na pedagogia do fazer, que traz essa importância da gente realizar coisas úteis e mostrar isso para as crianças, ao mesmo tempo quebrando a expectativa de que elas precisam ser produtivas.
É abrir uma porta para o fazer, mas abrir mão de cobranças e resultados”, conta ela, que em breve terá o privilégio de repetir novamente o ciclos dos primeiros ensinamentos da vida de um bebê, já que está no aguardo da chegada do segundo filho. “Minha missão é mostrar valores e aprendizados positivos, para eles e para o mundo. E que eles possam caminhar sozinhos um dia”, profere, com um otimismo contagiante.