É pouco generoso com uma pessoa tentar reduzi-la a uma palavra. Marisa Mestiço faz qualquer um ter certeza disso. Em uma longa conversa com CLAUDIA, ela deixou revelar as várias camadas que a completam, entre elas as de mulher trabalhadora, apaixonada, preocupada, perseverante, vibrante e merecedora do sucesso que está colhendo hoje, aos 38 anos.
Filha de uma costureira e de um borracheiro, Marisa saiu da Vila São José, bairro da periferia de São Paulo, onde cresceu, para se tornar diretora de um dos programas de maior sucesso da televisão brasileira, o Masterchef, em que lidera uma equipe de cerca de duzentas pessoas. Entre um ponto e outro, há uma história de bravura e inteligência.
“Eu nunca gostei de ser uma pessoa isolada do mundo, sempre fui muito corajosa e me projetava para alcançar algo maior”, diz. Foi essa astúcia que a ajudou desde menina a acertar seus alvos com precisão.
Aos 13 anos, para pagar o curso de teatro, começou a revender produtos de beleza e aos 14 foi ao shopping procurar emprego. Bateu de loja em loja, mas os estabelecimentos só contratavam a partir dos 16. “Tenho quase isso”, persuadiu a dona de uma butique. Quando uma cliente entrou, viu a oportunidade que precisava e se apressou a apresentar os produtos. “Não sei como, mas vendi o vestido mais caro do lugar.”
Conquistou o emprego, claro, e lá ficou durante cerca de um ano. Depois foi ser chapeira de eventos, entregadora de panfletos, vendedora de jornal… O importante era se virar, mas sem perder os estudos de vista. Era uma menina pobre, como ela mesmo diz, que usava o estímulo dos pais como combustível. “Meu pai dizia que eu podia não ter nada, mas que jamais deveria abrir mão do conhecimento”, lembra.
Na luta, anos mais tarde, formou-se em jornalismo e foi parar nos bastidores da televisão. O Masterchef entrou em sua vida em 2013, antes mesmo da estreia oficial do programa. Marisa, que trabalhava com pesquisa na época, participou da concepção do projeto que viria a se tornar um sucesso retumbante.
Foi ela a responsável, por exemplo, por ir atrás de Erick Jacquin, Henrique Fogaça e Paola Carosella, até então nomes desconhecidos do grande público. Participou de todos os processos da atração até se tornar coordenadora de conteúdo e depois diretora de estúdio.
Ascensão
Braço direito do argentino Patricio Diaz, a posição de chefia foi até ela naturalmente após o profissional ter sido escalado para a direção artística da Band. “Ele me ligou falando que havia uma especulação na imprensa sobre o assunto e o que eu achava de dirigir o programa. Pulei de felicidade”, conta empolgada.
O reconhecimento veio após 9 temporadas. A primeira, em especial, Marisa jamais irá esquecer. “Eu estava no pior ano da minha vida, meu pai morrendo de câncer, eu patinando profissionalmente e grávida.” O luto pela morte do pai foi vivido dentro do estúdio, mesmo lugar onde Luiza, hoje com quatro anos, praticamente nasceu.
O evento da maternidade teve um impacto revolucionário em Marisa, que chegou a se sentir insuficiente para exercer os papéis de boa profissional e mãe dedicada. Foi um momento de reflexão: “de que forma vou voltar a trabalhar?”
“Comecei a pensar que eu não queria ser frustrada porque tinha filhos. Não queria deixar de ser a Marisa que sou. Quando compartilhei isso com as pessoas a minha volta fui encorajada a acreditar que o meu tempo não estava diminuindo, mas que precisava de uma administração mais eficiente. Eu fui muito ajudada.”
A “forcinha” veio de pessoas que ela não esperava. Certa vez, Ana Paula Padrão fez as vezes de babá de Luiza. Era um dia de gravação externa em um local quentíssimo e a cuidadora oficial pegara dengue. Foi a apresentadora, impecável na vestimenta com que iria conduzir a atração, que ninou a filha da colega, situação que se repetiu ao longo das temporadas.
Já Paola Carosella, em um gesto que Marisa lembra com muito afeto, doou as roupinhas da filha Francesca para Luiza. “Ela pegou uma mala e falou ‘tá aqui, guardei essas roupas porque achei que tinha minha energia e queria te dar’. Achei tão bonito, ela estava me doando um pouca da história dela”, diz emocionada.
Paola e Ana Paula, Marisa conta, foram alguns dos presentes que o Masterchef a deu. Não que Jacquin e Fogaça não tenham importância em sua vida, mas a relação de sororidade faz diferença. “Elas me viam como uma mãe que precisava sair para trabalhar. Parece bobo, mas a gente se reconhece”, analisa.
Não é o topo
Ser diretora do Masterchef é um grande passo, mas ainda não é o topo da montanha que Marisa pretende alcançar. Ela diz ter coragem de sobra para enfrentar muitos outros combates. “Quero continuar fazendo programas que desafiem as pessoas a pensar sobre um assunto.”
Uma possibilidade é exatamente a maternidade. Após uma breve pausa para elaborar o pensamento, ela é certeira. “Gostaria de dialogar com mulheres que se sentem desestimuladas a fazerem coisas por se tornarem mães”, diz ela, que também deu à luz a Bento, seu segundo filho.
Enquanto isso, a mulher forte dá o seu melhor na nova temporada da atração que estreia no domingo (24), às 20h. Boa sorte, Marisa!