“Não cobram que as deficientes sejam mães, acham que somos dependentes”
Paraplégica desde os 20 anos e mãe de um menino de quase 3, Tabata Contri conta as alegrias e desafios da maternidade com deficiência física.
No Réveillon de 2000 para 2001, Tabata Contri estava sem cinto de segurança no banco de trás de um carro que capotou. O acidente a deixou paraplégica aos 20 anos, e naquela época ter um filho era a última de suas preocupações. O tempo passou e só depois dos 30 ela começou a pensar em maternidade.
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A atriz, escritora e consultora de inclusão da Talento Incluir (empresa especializada em recrutamento e seleção de pessoas com deficiência para empresas de todos os portes) engravidou aos 36 e teve seu filho, Francisco, aos 37 – ele hoje está com dois anos e sete meses. Mais ou menos na mesma época, os sintomas de Alzheimer de sua mãe começaram a avançar rapidamente. “Agora, sou mãe da minha mãe e mãe do meu filho. É muito louco”, afirma.
A seguir, Tabata conta com muita doçura um pouco sobre sua vida, focando nas experiências de gravidez, parto e criação de um menino que aprendeu a andar empurrando sua cadeira de rodas.
“Nunca planejei ser mãe. No Réveillon de 2000 para 2001, estava sem cinto de segurança no banco de trás de um carro que capotou e fiquei paraplégica. Tinha 20 anos e ter um filho nem me passava pela cabeça. O tempo foi passando e só fui pensar nisso depois dos 30.
Muitas mulheres, quando chegam a essa idade, reclamam da cobrança da sociedade para que sejam mães logo, dizem que têm que correr. Eu nunca passei por isso. Não cobram que as mulheres com deficiência sejam mães, acham que somos dependentes. Mas cada uma tem suas capacidades, independências e sabe até onde pode ir. No meu caso, eu sabia que dava para encarar.
A gravidez veio em um momento em que os sintomas de Alzheimer da minha mãe avançavam com rapidez. Ela havia sido diagnosticada em 2013 e já estava sob meus cuidados, os papeis já estavam invertidos. Engravidei no começo de 2016, o Francisco nasceu em outubro e agora, sou mãe da minha mãe e mãe do meu filho. É muito louco. Na mesma medida em que ele aprende tanto todos os dias, ela desaprende.
Mas minha gravidez foi muito tranquila, mais do que a de muitas amigas que não têm deficiência. Trabalhei até dez dias antes do parto – claro que sem dirigir no último mês e precisando de mais ajuda na transferência [para entrar e sair do carro, por exemplo], estava mais pesada. O pessoal tinha que me dar uns empurrões mais fortes. [risos]
No que diz respeito diretamente ao fato de eu ser cadeirante, precisei de alguns cuidados. Usei meias de compressão durante toda a gestação, o que foi até tranquilo, porque já estou acostumada com elas. Tive que tomar injeções anticoagulantes durante os nove meses e mais 40 dias depois do parto, para evitar trombose, e comprimidos de antibióticos ao longo da gravidez para evitar infecção urinária, que é a maior causa de aborto espontâneo em cadeirantes. Também precisei parar de tomar um medicamento para incontinência urinária, que faria mal ao feto, então usei fralda geriátrica.
O maior desafio da gravidez foi encontrar uma casa acessível para morarmos. Quando engravidei, o Márcio [Guimarães, músico e atleta de jiu-jitsu] e eu éramos namorados, e só então fomos morar juntos. A busca foi longa, eu já estava com oito meses de gravidez quando mudamos para a casa nova. Éramos eu grávida, ele, minha mãe e o cachorro. E no mês seguinte chegou o Francisco.
O parto foi uma cesárea agendada, porque não sabíamos se eu teria força para empurrar o suficiente em um parto vaginal. Essa foi a nossa decisão, muito bem pensada para a segurança tanto dele quanto minha. A única parte ruim foi que precisei de anestesia geral, porque exatamente onde se aplica a raquidiana eu tenho placas em decorrência do acidente. Então acabei vendo o Francisco só horas depois que ele nasceu.
O começo foi complicado, como é para qualquer mãe. Eu tinha muito sono, queria dormir, mas é muita responsabilidade cuidar daquele serzinho. Amamentei até os seis meses e meio e paramos porque tive celulite infecciosa [infecção bacteriana de pele que pode se tornar grave se não for tratada] e precisei tomar dois antibióticos muito fortes que fariam mal ao Francisco. Foi mais sofrido para mim do que para ele, com certeza.
O mobiliário dele não precisou de adaptação. O berço era do tipo com grade que pode ser abaixada, então eu o alcançava e conseguia puxá-lo para meu colo com um braço só. Engraçado que sempre fui desajeitada com bebês, mas com ele sempre ‘encaixou’ direitinho.
Uma coisa muito legal foi um rack de apoio para o bebê conforto acoplável à minha cadeira de rodas que a marca da cadeira mandou para mim [ele pode ser visto acima, na foto de destaque desta matéria]. Então era só encaixá-lo à minha frente e ir embora. Quando ele era menorzinho, também usei muito canguru, ele ia coladinho em mim.
Aos poucos, Francisco foi ganhando mais mobilidade e querendo explorar mais o ambiente, é claro. Ele aprendeu a andar empurrando minha cadeira pela barra traseira, eu fui meio que o andador dele [risos]. Também começou a subir e descer da cadeira de rodas com muita destreza para ficar no meu colo.
Hoje, tenho receio de sair sozinha com ele, porque não consigo segurá-lo quando ele inventa de correr. Então, sempre que vamos fazer algo fora, procuro alguém para nos acompanhar. Este é o único porém. De resto, seguimos normalmente: ele sobe no meu colo para me dar um beijo e um abraço, desce e vai fazer as artes dele. Está em uma fase muito independente. Tem uma dificuldade aqui, outra ali, mas é tudo muito possível e gostoso!”