Ela retirou a mama e optou pela não reconstrução; saiba o porquê
A assistente social apoia mulheres, cis e trans, com câncer de mama e faz do próprio corpo uma bandeira da liberdade
Jacqueline Faria foi diagnosticada com câncer de mama em estágio avançado em 2004, passou por uma mastectomia radical e optou por não fazer a reconstrução. Hoje, aos 53 anos, a assistente social vive bem consigo mesma e com sua aparência e luta por mulheres que passam pelo mesmo.
O diagnóstico para ela foi um susto. “Eu tinha acabado de desmamar a minha filha caçula, não estava inclusa naquele rol de grupo de risco, não era uma paciente que tomava anticoncepcional, não tinha histórico na família nem nada”, conta Jacqueline à CLAUDIA.
Passado o baque inicial, ela estava decidida a seguir sua vida normalmente. Passou pelo tratamento e retirou uma das mamas. Pouco usual, ela optou por não fazer a reconstrução mamária, pois não queria ser submetida a mais uma cirurgia.
“Eu já tinha passado por dois tumores benignos e, depois disso, ainda sofri um acidente de avião [ela foi atropelada por uma das turbinas] e fiquei muito machucada”, afirma.
Quando se viu sem um dos seios, Jacqueline tinha algumas preocupações. Ir à praia, por exemplo, era um hábito estranho porque os biquínis e os maiôs não sustentavam a prótese que ela usa no dia a dia por baixo da roupa. Mas ela não queria deixar de fazer as coisas que amava. Então, cobriu a cicatriz com uma tatuagem e ganhou confiança para tomar sol de biquíni mesmo sem um seio.
“Eu não levanto a bandeira da não reconstrução, mas sim a de ser feliz com o próprio corpo”, ressalta. “Eu quero que as mulheres entendam que elas não são obrigadas a reconstruir, que na verdade é uma opção, é isso que eu quero mostrar pra elas”.
Mulheres de peito e cor
Com o objetivo de falar sobre o assunto e abranger mais públicos que sofrem com o câncer de mama, como os homens e as mulheres transexuais, Jacqueline criou uma página no Facebook chamada “Mulheres de Peito e Cor”.
“A gente fala muito de câncer de mama em relação às mulheres cis [que se identificam com o gênero biológico], mas tem um outro público que sofre muito com isso, que são as trans. Elas vivem situações bem complicadas de tumores e muitas vezes não têm acesso a médicos nem a tratamentos, porque sempre são colocadas de lado”, explica. “Se fala muito sobre as mulheres, pouco sobre os homens e nada sobre as trans.”
Além disso, Jacqueline se preocupa com a quantidade de mulheres negras que morrem por câncer de mama – elas tendem a ter alterações genéticas que favorecem o aparecimento do câncer de mama antes dos 40 anos de idade, de acordo com o estudo “Jewels in our Genes” realizado entre 2009 e 2011 na Universidade de Buffalo, nos Estados Unidos.
“Quando eu comecei a questionar esse assunto, eu percebi que as pessoas de periferia não têm acesso a tratamento adequado e vêm a óbito mais frequentemente”, comenta Jacqueline. “Além disso, os mamógrafos oferecidos à população não são de ponta. E a negra tem uma tendência a uma mama muito densa, que tem melhor diagnóstico em mamógrafos digitais e quando ela recebe o resultado, a doença já está mais avançada”.
Em 2017, a assistente social montou, com a ajuda de um colega, Robson, um calendário com fotos dela trajando pouca roupa. A ideia é mostrar às mulheres com câncer que elas podem e devem ter uma vida sexualmente ativa.
“Eu sou uma pessoa que não está enquadrada no padrão de beleza, não sou magrinha, sou negra, de cabelo crespo e sem uma mama, mas mesmo assim tirei as fotos e montei o calendário. Era autoconfiança que eu queria mostrar para as outras mulheres”. O dinheiro arrecadado com as vendas do calendário foi revertido à Associação de Apoio à Mulher Portadora de Neoplasia (AAMPN).
Para as mulheres, Jacqueline traz uma mensagem especial: “Antes de tudo, a gente tem que se amar. Se a gente se ama, tudo vai dar certo. Não tem como dar errado.”
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