“Apesar de sermos conhecidas, não temos espaço nem voz”, diz Cris Rozeira
O Prêmio CLAUDIA 2019 homenageou a seleção feminina brasileira, que participou da Copa do Mundo 2019
Há muitos anos, na noite de entrega do Prêmio CLAUDIA, a Sala São Paulo, que fica no centro da capital paulista e recebe concertos e apresentações sinfônicas, é tomada por um grande e animado público. Essa comunhão de pessoas de diferentes áreas profissionais, crenças e origens cria o ambiente ideal para homenagear mulheres e homens que, espalhados pelo Brasil, trabalham incansavelmente para transformar seu entorno, cada qual em seu campo de atuação.
As histórias dos finalistas deste ano foram contadas ao longo dos meses nas páginas de CLAUDIA, e o site da revista ficou aberto para a votação popular, que, somada à apreciação do júri, elegeu as vencedoras e o vencedor.
O resultado foi revelado em 11 de novembro na cerimônia conduzida pela jurada do programa Masterchef, Paola Carosella. A paraense Gaby Amarantos encantou o público interpretando canções compostas por mulheres. Ela usou um figurino pink volumoso com a frase de protesto “Fora, padrão”, referindo-se às pressões impostas aos corpos femininos.
Duas das oito categorias de premiação – Educação e Influenciadora Social – fizeram sua estreia nesta edição. Desta vez, CLAUDIA decidiu prestar também uma homenagem especial às mulheres que tiveram atuação marcante para o país, de maneira geral, e ofereceu o prêmio Mulheres do Ano para a seleção feminina brasileira, que participou da Copa do Mundo 2019.
Como na data do evento as meninas do futebol estavam na China para um torneio amistoso, elas enviaram um vídeo com uma mensagem de agradecimento. Para receber o tributo, anunciado pela comunicadora e empresária Camila Coutinho, subiu ao palco a jogadora Cristiane Rozeira.
Atualmente atleta do São Paulo, ela é a maior artilheira em Jogos Olímpicos e já disputou quatro Copas, inclusive a deste ano. “É muito importante esse tipo de reconhecimento, porque, apesar de sermos muito conhecidas e ganharmos visibilidade de quatro em quatro anos, no restante do tempo não temos espaço nem voz”, disse Cris. Essa foi apenas uma das várias emoções da noite, que podem ser conferidas a seguir.
Conheça os vencedores do Prêmio CLAUDIA:
Neide de Jesus, vencedora na categoria Políticas Públicas:
Em Alcântara, no Maranhão, a primeira vencedora da noite, Neide de Jesus, lidera há quatro décadas a comunidade quilombola Itamatatiua. Neide contrariou as convenções ao ser eleita liderança pelos outros moradores mesmo sendo solteira e mãe, uma afronta para os valores da época.
Com grande capacidade de diálogo e articulação, uniu as mulheres para criar uma associação e um centro de produção de cerâmica, arte centenária na região. Ela é uma das responsáveis por gerar renda e autonomia entre as artesãs, que revertem o desenvolvimento para a comunidade.
Por causa deste trabalho já viajou por todo o Brasil para apresentar a arte da sua região e participar de debates políticos para a demarcação das terras onde fica o seu quilombo. Muito discreta, ficou emocionada ao receber o prêmio.
Nilza de Jesus Santos, vencedora na categoria Educação:
No ano passado, o Prêmio CLAUDIA teve como tema central a educação e homenageou a escritora de literatura infantojuvenil Ruth Rocha. Neste ano, foi criada a categoria Educação para reconhecer profissionais que, em seu dia a dia, fazem do ensino uma ferramenta para transformar a sociedade.
Enfrentando diversas batalhas, a vencedora Nilza de Jesus Santos trabalha há três décadas na comunidade do Calabar, em Salvador. Sua atuação como líder da Escola Aberta do Calabar promove a valorização das raízes afro dos alunos e ressalta a importância da cidadania.
Construída por meio da união dos moradores, a instituição, além de atender as crianças da região, mantém projetos que auxiliam a comunidade a ter acesso a seus direitos. “Ninguém consegue se transformar sem educação. Por isso eu luto por essas crianças, para que elas tenham dignidade e possam ser o que quiserem”, disse Nilza no palco.
Juliana Estradioto, vencedora na categoria Inovação e Ciências:
Com 19 anos, Juliana Estradioto é mais jovem do que o Prêmio CLAUDIA, como ela própria ressaltou em seu discurso. Mas nem por isso menos importante. Em pesquisas durante o ensino médio público em Osório, interior do Rio Grande do Sul, ela usou rejeitos orgânicos de frutas para criar material ecológico capaz de substituir o plástico.
Além do trabalho que desenvolve em laboratório, ela atua para incentivar outras jovens a fazer pesquisa. “Eu nunca teria entrado no mundo da ciência se não fosse o caminho que percorri desde o ensino básico, tendo o apoio de educadores como a minha mentora, a professora Flávia Twardowski”, destacou.
Durante a premiação, esteve ao lado de duas pesquisadoras experientes, as finalistas da mesma categoria, Fernanda Abra e Luciana Carvalho, que se emocionaram e comemoram a vitória da mais nova candidata desta edição.
Tuany Nascimento, vencedora na categoria Cultura:
Na mesma época em que soube que estava entre as finalistas do Prêmio CLAUDIA, a bailarina Tuany Nascimento foi aprovada em uma audição para passar uma temporada de quatro meses entre Grécia e Chile com a Cia. de Dança Nikos.
A viagem foi marcada para a manhã de 11 de novembro, mesma data da premiação. Ela compareceu ao jantar com as finalistas, na noite anterior, e sua irmã Ana Gabryelle Nascimento foi à Sala São Paulo representá-la.
“Fiquei muito dividida, mas, mesmo sabendo que não poderia estar na cerimônia, fiz questão de vir e conhecer as outras finalistas”, contou Tuany, ainda sem saber que seria vencedora.
Moradora de uma favela no Complexo do Alemão, no Rio de Janeiro, Tuany criou o projeto Na Ponta dos Pés para dar aulas de balé a meninas da comunidade. Durante o período em que estará fora, a irmã vai gerenciar a iniciativa. “Sou a única de seis filhos que não dança (risos). Mas tenho muito orgulho de ter a Tuany como irmã”, disse Ana.
Jefferson Drezett, vencedor na categoria Eles por Elas:
As mulheres e suas realizações sempre foram as protagonistas do Prêmio CLAUDIA em toda a sua história. Nesta edição, não seria diferente. Foram 22 finalistas em diferentes categorias, além das Mulheres do Ano.
No entanto, desde 2017, celebramos também o trabalho de homens que atuam em favor da equidade de gênero, chamando a atenção para a responsabilidade masculina nessa batalha.
“É profundamente triste que os homens estejam aqui por terem que ajudar mulheres porque elas são vítimas de violência. Mas que bom que, pelo menos, a gente pode ajudar”, disse o médico Jefferson Drezett ao subir ao palco.
Ele criou um modelo de atendimento a vítimas de estupro e acesso ao aborto legal como ginecologista do Hospital Pérola Byington, em São Paulo, que se tornou referência. Tratando de um tema que enfrenta resistência na sociedade brasileira, Jefferson revelou ter ficado surpreso com o reconhecimento do júri.
Adriana Barbosa, vencedora na categoria Empreendedorismo e Negócios:
Para entregar a estatueta da categoria, a apresentadora Paola Carosella chamou ao palco a “grande dama do empreendedorismo brasileiro”, como ela intitulou Luiza Helena Trajano, que venceu o Prêmio CLAUDIA em 2003.
A presidente do conselho de administração do Magazine Luiza homenageou a também empreendedora Adriana Barbosa, criadora da Feira Preta. Adriana trabalha para fortalecer negócios de pessoas negras no Brasil. Também organizou a PretaHub, empresa responsável pela feira, entre outros eventos, que oferece serviços como apoio à digitalização de negócios.
Em sua fala, Adriana comemorou não apenas a própria vitória mas a de outras mulheres negras na noite.
Maíra Azevedo, vencedora na categoria Influenciadora Social:
A categoria estreante Influenciadora Social reconhece mulheres que usam sua influência na internet para falar de causas sociais e ajudar a provocar mudanças. Acompanhada de uma torcida organizada composta por amigos e seguidores, a baiana Maíra Azevedo, conhecida como Tia Má, foi ovacionada após seu nome ser anunciado como vencedora.
Protagonista de stand-ups que rodam o Brasil e autora de vídeos de humor que divulga no YouTube, Maíra fala sobre racismo, amor-próprio e aceitação. Ressalta sempre que é preta, pobre, gorda, favelada e do candomblé.
Ela dedicou a vitória aos homens e mulheres cujas histórias são transformadas por seu trabalho. “Este prêmio é de toda mulher preta que nunca conseguiu se enxergar e que, por meio dos meus vídeos, se vê”, disse.
Sandra Santos, vencedora na categoria Trabalho Social:
A cozinheira Sandra Santos ficava arrasada ao observar o cansaço e a fragilidade de mulheres que passavam horas nas filas em frente a uma unidade de internação para adolescentes em conflito com a lei em Belford Roxo, no Rio de Janeiro.
Todas estavam ali esperando o horário da visita. Mães, tias e avós dos jovens frequentemente vinham de outros municípios e aguardavam sem ter acesso a alimentação adequada nem sequer a um banheiro.
Além de oferecer carinho e apoio, Sandra arrecadou fundos e alugou uma casa próxima à instituição, que recebeu o nome de Casa da Mãe Mulher. Nos dias de visita, às quartas e sábados, o lugar fica cheio.
Ali, as mulheres podem descansar. “Esse trabalho é muito gratificante. Eu amo o que eu faço, amo essas mulheres. Todos nós temos uma missão e cuidar delas é a minha”, disse Sandra, em fala que arrebatou o público que assistiu à premiação na Sala São Paulo.