Que discursos de ódio rolam soltos pela internet, isso todo mundo já sabe. O que raras vezes capta realmente nossa atenção é a consciência de que até o menor dos comentários online pode sustentar atos muito, mas muito mais odiosos no mundo real. Na sexta-feira passada (15), uma controversa celebridade das redes sociais paquistanesas foi asfixiada até a morte por seu próprio irmão, Muhammad Waseem. Ele alegou não estar arrependido, e ter defendido a “honra” de sua família ao matá-la.
Qandeel Baloch, cujo nome verdadeiro era Fauzia Azeem, tinha 26 anos e mais de 120 mil seguidores em sua conta no Instagram – que está atualmente desativada. Ao procurar seu nome no Google, uma das primeiras sugestões com a qual você provavelmente pode se deparar é “Qandeel Baloch hot”, ou “Qandeel Baloch gostosa”. Isso porque, em suas fotos, a jovem não tinha medo de expor sua vida pessoal. Pra nós, acostumados com as Kardashians, isso pode parece banal, mas, no país de Malala Yousafzai, o ato é tudo, menos isso.
Em relato ao BuzzFeed americano, a repórter paquistanesa Imaan Sheikh alega que “todos nós matamos Qandeel”, querendo dizer que as tradições de seu país (e do sul da Ásia como um todo) são extremamente hostis, quando não letais, à vida suas mulheres. “Muitos descreviam os vídeos como ‘sem vergonha’”, conta ela. “Mas, em um país onde ‘ser mulher’ é há muito tempo definido por diferentes versões e graus de vergonha, a sua ‘sem vergonhice’ me parecia uma revolução”.
Nas redes sociais Qandeel se aventurava a falar de assuntos restritos ao âmbito familiar no Paquistão, como o fato de que seu ex-marido (com quem foi forçada a se casar com apenas 17 anos) já ameaçou queimar seu rosto com ácido. A jovem costumava receber comentários extremamente hostis em suas redes sociais, e, após o anúncio de sua morte, muitos ainda comemoraram na internet.
#QandeelBaloch morta por seu próprio irmão, e os paquistaneses estão felizes. Chocante ver que até mulheres se juntam a eles!!
Em entrevista à Al Jazeera, vários paquistaneses se pronunciaram sobre o assassinato. “Eu não concordo com o comportamento de Qandeel em seus vídeos e fotos”, revela Shamayel Tareen, atriz. “Mas eu evitava visitar suas páginas. Não somos ninguém para julgar”.