A voz é, sem dúvidas, um elemento marcante na trajetória de Luciana Mariano. Em 1997, a comunicadora estreou como primeira narradora de futebol da televisão brasileira, pela Bandeirantes, no Torneio Primavera. Depois de 19 anos, o microfone voltou para suas mãos, na ESPN, e, agora, ela também participa do “Mina de Passe”, um programa voltado à modalidade feminina do esporte.
“Não tinha referências de mulheres narradoras na TV, então não pensava em ocupar esse espaço”, disse em exclusiva à CLAUDIA. Mas a vida se encarregou de dar um jeito: uma empresa descobriu naturalmente o talento e carisma de Luciana. Foi assim que ela passou dois anos na Rádio Difusora, fazendo entrevistas com torcedores e sendo repórter de campo.
Em seguida, surgiu o convite de Regiane Ritter, uma das precursoras no esporte, para entrar na Rádio Gazeta. As oportunidades para as mulheres nesse meio eram escassas, e cada espaço foi celebrado. “Descobri um concurso na Band focado em encontrar uma narradora e logo fiquei interessada. Ali começava tudo”, diz a profissional.
Depois de algumas gravações no estúdio, não restavam dúvidas sobre seu talento, e a competição foi encerrada antecipadamente. A contratação para narrar ao vivo o Torneio da Primavera chegou em clima de alegria, mas o nervosismo também bateu forte. Emoções à parte, ela conseguiu.
Disparidades de gênero, entretanto, fizeram Luciana congelar parte da carreira por praticamente duas décadas. “Um repórter recebeu a promoção para narrador e me retiraram o cargo de narradora para me tornar repórter. Mas eu disse ‘não’, passando a ter um programa ao invés disso”, diz.
Embora hoje entenda que a situação foi causada pelo machismo impregnado no setor, viveu com angústia durante a pausa da narração. “Eu me perguntava o que havia de errado comigo, se eu era incompetente”, lembra a narradora.
O sentimento só foi embora quando outras mulheres entraram no ramo e passaram a compartilhar suas experiências, como uma espécie de rede de apoio. “O ‘Mina de Passe’, principalmente, me levou a esse lugar de trocas, porque até então eu não tinha com quem conversar sobre esse aspecto, por ser algo muito específico de quem viveu isso.”
E os haters?
Esperar o fracasso de mulheres que ocupam espaços de destaque em ambientes historicamente masculinos as transformam em alvos para críticas. E, embora mudanças importantes tenham acontecido, a facilidade de comunicação, graças às tecnologias, tornou mais fácil a chegada de discursos de ódio a esse grupo.
“Naquela época, alguém precisava enviar a carta, esperar ela chegar e, só então, eu poderia ler a pessoa me xingando. Hoje, com as redes sociais, fica muito mais fácil essas falas chegarem até mim”, pontua ela.
Luciana, apesar das críticas, não se deixa abalar. Ela segue disposta a encarar de frente lógicas ultrapassadas, sem medo de transformar o que está ao seu redor. Foi assim com a narração, o futebol e, agora, com o etarismo. “Eu percebo uma preocupação coletiva entre as mulheres desse meio sobre o nosso futuro enquanto profissionais. Homens mais velhos são considerados experientes, portanto qualificados para continuar, por que nós não? Quero mudar isso.” Nós, daqui, torcemos para que ela continue transformando.