Lembro de uma coletiva de imprensa após uma manifestação no Centro de São Paulo quando uma autoridade fez comentários um tanto libidinosos para mim na frente de diversos colegas de outros veículos de imprensa. Eu não consegui reagir, mesmo me considerando uma pessoa de postura bastante firme, mas não foi só eu. Lembro do clima estranho que tomou conta daquele momento, mas a vida seguiu.
Aquela atitude não me abalou emocionalmente e nem profissionalmente, mas também nunca esqueci. Ser lida como mulher numa sociedade machista, misógina e patriarcal é extremamente cansativo.
A postura do técnico Abel Ferreira com a repórter Alinne Fanelli não foi muito diferente, assim como a não-reação dela também não. O técnico, durante uma coletiva de imprensa, deu uma resposta desnecessária, atravessada e machista à repórter que o questionou sobre a lesão de um jogador.
“Mais uma lesão. Eu tenho que dar satisfações a três mulheres só: minha mãe, minha mulher e a presidente Leila. São as únicas que têm o direito de vir falar comigo e pedir explicações. Por que perdeu, por que lesionou? As únicas. Os outros podem falar, se manifestar, elogiar ou criticar, o treinador tem que saber ouvir elogios e críticas.”
Ignorando completamente o fato básico de que o trabalho de uma jornalista é perguntar o “porquê” das coisas, o técnico ainda deu um show de machismo ao dar uma resposta que só poderia ser dada a uma mulher no atual momento da sociedade.
Abel Ferreira supervaloriza a importância de mulheres específicas em sua vida em detrimento da importância do trabalho de outra mulher. E sejamos realistas, ele jamais daria uma resposta como essa a um homem. Quando nos leem através das lentes do gênero é que percebemos a quantidade de violências pelas quais estamos suscetíveis.
O técnico performou a masculinidade e catapultou a repórter para um estado de incredulidade diante do que ouviu. Eu sei como é. Não há personalidade que não fique surpresa diante de uma atitude a qual o destinatário não somos nós, mas sim a um grupo do qual fazemos parte de forma compulsória.
Porque não se trata de nascer fêmea, se trata do que é feito de nós a partir dessa constatação biológica, o que parece dar um aval imaginário, principalmente aos homens, de que podem nos tratar e destratar chamando isso posteriormente de mal entendidos, que são raros, mas acontecem muito.
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