Vilão ou mocinho? Conheça os prós e contras do jejum intermitente
A dieta continua ganhando milhares de adeptos, mas ainda faltam estudos conclusivos sobre seus reais benefícios e perigos
Foi em um grupo do Facebook que a paulistana Tabata Novais, 27 anos, conheceu o jejum intermitente, plano alimentar que consiste em passar por longos e determinados períodos sem comer. “Eu estava infeliz com meu peso e buscava algo que ajudasse a emagrecer. Já havia tentado de tudo. Então resolvi dar uma chance ao método”, conta.
Assim como Tabata, outros milhares de pessoas se sentem de alguma forma atraídos pelas promessas compartilhadas na internet ou pelo famoso boca a boca. Apenas em um grupo do Facebook são 600 mil seguidores. No Instagram, o perfil mais famoso sobre o assunto conta com cerca de 550 mil. Apesar de haver também relatos negativos, as comunidades online crescem a cada dia.
“O jejum intermitente é visto como uma opção de dieta capaz de trazer benefícios em alguns casos, principalmente nos de obesidade, mas não há nenhuma comprovação de que seja mais eficiente que outros programas alimentares com restrição calórica”, afirma o endocrinologista Rodrigo de Oliveira Moreira, presidente da Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia (Sbem), do Rio de Janeiro.
Se não há nada de extraordinário que justifique a fama, como explicar tamanho sucesso? “Muita gente não consegue se organizar para manter uma dieta hipocalórica e prefere adotar um dos protocolos do jejum intermitente por ser mais fácil adaptá-lo à rotina ou simplesmente por não precisar seguir um cardápio”, conclui o médico nutrólogo Durval Ribas Filho, presidente da Associação Brasileira de Nutrologia (Abran).
O primeiro indício do conceito do jejum intermitente surgiu em 2013, com o best-seller britânico A Dieta dos 2 Dias (Sextante), dos autores Michael Mosley e Mimi Spencer. Mas foi há cerca de três anos que o assunto se popularizou por aqui, como dieta 5 por 2, cuja indicação era alternar cinco dias de alimentação normal com dois de calorias reduzidas.
Recentemente viralizaram atualizações dos protocolos. O mais praticado é o de 16 horas de jejum diário, com refeições leves no tempo restante. Há, ainda, a versão que envolve hiatos de 24 horas longe da mesa, uma ou duas vezes por semana. Nos períodos de lacuna, fica proibido qualquer alimento, exceto água, chá e café (sem açúcar).
Seja qual for a opção escolhida, o jejum intermitente não faz milagres. “A prática ajuda a emagrecer desde que a pessoa também se alimente de forma saudável e equilibrada nos momentos permitidos”, diz o endocrinologista Filippo Pedrinola, do Hospital Albert Einstein, em São Paulo.
Ou seja, de nada adianta passar longos períodos sem comer para atacar alimentos hipercalóricos depois – como bolos, massas e bebidas açucaradas. Em vez disso, os especialistas recomendam incluir no cardápio gorduras boas, como sementes e oleaginosas, proteínas magras, como peixes, além de grãos integrais, verduras e legumes.
O que diz a ciência
Quem segue à risca as regras do jejum intermitente – sob prescrição e supervisão médica – costuma ter sucesso no quesito perda de peso. “Mas isso não significa que seja uma dieta mais eficiente que as demais”, lembra Rodrigo.
Para tirar a prova, um trabalho científico feito pela Universidade de Illinois, nos Estados Unidos, acompanhou por seis meses 100 pessoas acima do peso que seguiram dietas diferentes. Quem contou calorias emagreceu a mesma porcentagem que aqueles que praticaram jejum (entre 5 e 6% do peso corporal).
Há ainda quem defenda que o grande trunfo das longas pausas nas refeições é a queima da gordura acumulada. “É uma vantagem, sim, mas não exclusiva. Qualquer programa alimentar com limitações acarreta esse mecanismo. Sem receber nutrientes, o organismo busca energia no que está estocado”, diz Durval.
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Diferentemente do que alguns estudos antigos chegaram a afirmar, concluiu-se que longos períodos sem comer não levam a estocar ainda mais gordura como estratégia de sobrevivência.
“Se a pessoa se alimentar de forma equilibrada nas quebras de jejum, a conversão em energia – e não em gordura – ocorre naturalmente, pois o corpo está precisando dela. O acúmulo ocorre quando há excesso e descontrole”, afirma Rodrigo.
Outros benefícios, como diminuição no nível de inflamação e das taxas de glicose no sangue, costumam ser associados ao jejum. Mas também são comuns às alimentações equilibradas. Sobre as consequências do método a longo prazo, o médico Filippo Pedrinola ressalta que ainda faltam estudos contundentes e conclusivos a respeito.
A opinião de quem testou
“Comecei com 12 horas em jejum e hoje já consigo chegar a 20. Achei que me sentiria fraca, mas, por incrível que pareça, me sinto mais disposta no dia a dia”, conta a professora de inglês Ludmilla Faria, 52 anos. Mas nem todo mundo vê positivamente o jejum intermitente. Os efeitos colaterais são frequentes e podem tornar a prática inviável. É o caso de Tabata, citada no início deste texto.
“Fiz por mais ou menos seis meses um protocolo que consistia em ficar 16 horas em jejum três vezes por semana e 18 horas em outros dois dias. Eu me sentia desafiada e, cada vez que notava a mudança no meu corpo, ficava mais motivada. Com o passar do tempo, minhas unhas começaram a quebrar, tive queda de cabelo e muita dor de cabeça. Mesmo assim eu continuava a fazer a dieta, pois via resultado. Para disfarçar, dizia às pessoas que era cansaço. Cheguei a perder 9 quilos, o que me deixou muito satisfeita, mas tenho consciência de que foi a um preço muito alto”, diz Tabata.
“Episódios de hipoglicemia, que provocam mal-estar e sensação de desmaio, não podem ser ignorados”, avisa a nutricionista Elaine de Pádua, de São Paulo. O maior perigo, segundo ela, está na falta de acompanhamento médico e/ou nutricional. Não é recomendado a quem tem distúrbio alimentar, grávidas, diabéticos e menores de 18 anos.
Por envolver práticas contraditórias, o jejum intermitente é comparado com a também comum recomendação de se alimentar a cada três horas, uma das máximas da reeducação alimentar. “São estratégias diferentes, cuja indicação depende do perfil e da resposta de cada um. Fracionar as refeições em períodos mais curtos funciona bem para quem tem tendência a perder o controle, por exemplo”, afirma Elaine.
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