Samantha sentiu tudo, e ao mesmo tempo não sentiu nada. Quando percebeu o caroço na mama direita, experimentou um daqueles momentos em que o mundo parece descontinuar e as emoções se confundem. No dia seguinte, foi correndo ao ginecologista com seu filho de 3 anos, porque não achou quem ficasse com ele, e, desesperada, convenceu a recepcionista de que devia fazer os exames imediatamente. O resultado confirmou o câncer em estágio avançado.
Encaminhada ao mastologista, passou por cirurgia dois meses depois para remover os nódulos e a mama, em 2015. Ao contrário do desespero inicial, sentiu-se calma, pronta para enfrentar o que viesse. “Minha mente estava focada em resolver o problema”, relembra.
A jornalista se preparava para a quimioterapia e suas consequências, mas os médicos disseram que, na verdade, ela tomaria um bloqueador de hormônios por 10 anos. Por ser um câncer hormonal, Samantha foi orientada a suspender o anticoncepcional que tomava.
Iniciou o tratamento e logo enfrentou os efeitos colaterais: inchaço, queda de cabelo, irritabilidade e oscilações de humor constantes. Além disso, começou a tomar medicações para o estômago, fígado e antidepressivos. “Demorei a aceitar que o remédio era a cura, não um veneno”, confessa.
A reviravolta
Quatro meses depois, em meio a uma crise causada pelo tratamento, ela comprou impulsivamente um teste de gravidez. Para sua surpresa, deu positivo. A ultrassonografia revelou que a gestação já somava o mesmo período da terapia.
“Evitamos pensar sobre a morte porque, se o fizermos, teremos que abandonar o que não faz sentido para correr atrás do que realmente importa”
Samantha Leal
Na época, foi duramente criticada. “As pessoas não entendiam como eu podia engravidar durante o tratamento, mas eu estava tomando o bloqueador e fui tentante por muito tempo para ter meu primeiro filho. O que parecia impossível aconteceu.” A terapia hormonal foi suspensa até o nascimento do bebê.
Tempos mais tarde, seu marido pediu a separação. Com o fim do casamento, Samantha fez as malas e partiu para Nova York em busca de autoconhecimento. Depois, no Brasil, conheceu seu atual esposo. Quando tudo parecia calmo, em 2022, ela encontrou mais um caroço, do mesmo lado em que retirara a mama.
O diagnóstico confirmou: o câncer havia voltado. “O tumor tinha 9 cm e já havia se espalhado para o pulmão.” A médica recomendou radioterapia e quimioterapia.
“Eu não tinha medo da morte, meu receio era, em vida, não conseguir trabalhar e sustentar minhas crianças”, relembra. Em conversa com a especialista, descobriu a possibilidade de um novo tratamento, uma medicação cara, recentemente aprovada, que só poderia ser obtida gratuitamente por meio de ação judicial.
Ambições e descobertas
Com a ajuda de ONGs, conseguiu o remédio, mas precisou reduzir a dose devido aos efeitos colaterais severos: dores articulares, fadiga, náuseas e diarreia. Muitas vezes, porém, o medicamento não chega. “Às vezes, fico um mês sem a medicação e, no mês seguinte, recebo três caixas de uma vez.”
Com as consequências do remédio, Samantha acabou entrando em depressão. Foi durante uma sessão de terapia que ela entendeu seu desejo de viajar e, ao lado de sua mãe, partiu para a Itália. Chegando no Duomo de Milão, diante de uma imagem que desconhecia, começou a chorar.
Descobriu que se tratava de Santa Ágata, protetora das mulheres com câncer de mama. “Desabei completamente.” Esse momento inspirou o surgimento de sua marca de roupas, Santa Ágata OncoClothes, criada para facilitar a vida de quem passa por tratamentos oncológicos. As peças contam com zíperes nas mangas e golas, ideais para quem usa cateter, faz hemodiálise ou coleta sangue.
Junto das transformações com os tratamentos, Samantha percebeu uma mudança em seu olhar. “Evitamos pensar sobre a morte porque, se o fizermos, teremos que abandonar o que não faz sentido para correr atrás do que realmente importa. Com o diagnóstico, passei a prestar atenção no que eu quero. Antes, trabalho e família vinham sempre à frente de mim. A doença me obrigou a me colocar em primeiro lugar, e não deixo que ela defina quem eu sou ou o que devo fazer. Penso na morte, mas não estou presa a ela.”
Ela também vê seu trabalho com a Santa Ágata OncoClothes como um legado. “Quem passa pelo tratamento merece se sentir acolhido e confortável.”
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