Paladar infantil: como lidar e superar o hábito na vida adulta
Quando não combatido, o paladar infantil pode se transformar num grave transtorno alimentar (chamado ‘TARE’)
“Chatos para comer”, “frescos” e “imaturos”: estes são os adjetivos mais comuns ouvidos por quem tem o famigerado paladar infantil. Porém, engana-se quem pensa que o comportamento é uma simples questão de frescura. Muitas vezes, essa limitação no paladar, que permanece durante a vida adulta, tem raízes em experiências incômodas (e até mesmo traumáticas) que aconteceram na infância.
“Eu já escutei vários relatos: em um deles, o paciente afirmou que não conseguia comer nada com a consistência de purê desde que viu o pai passando mal com um alimento pastoso. Outra vez, uma paciente revelou que a avó a obrigava a comer frutas até que passasse mal ou vomitasse. Portanto, esse ato de evitar determinadas consistências, texturas, cheiros e cores pode estar relacionado a um trauma do passado”, explica a nutricionista Liliam Teixeira Francisco.
E, aí, a consequência desta seletividade acaba sendo entrar para a vida adulta rejeitando pratos e alimentos como legumes, verduras e frutas: “Quem tem o paladar infantil costuma preferir comidas mais prazerosas como fast food, frituras e doces, que são pobres em nutrientes”, afirma a especialista.
Consequências do paladar infantil
Claro, além dos perrengues sociais — como ser constrangido por colegas de trabalho e não conseguir frequentar inúmeros restaurantes —, o paladar infantil traz graves riscos à saúde, sendo a deficiência nutricional o mais preocupante entre eles: “Comer apenas frituras e doces aumenta os riscos de anemia, diminui os níveis de vitamina B12 no organismo e potencializa a quantidade de colesterol e triglicerídeos no sangue”, aponta.
Todavia, Liliam faz uma ressalva: “É importante entender que um mau hábito não é um transtorno alimentar. Por isso, a ajuda de uma nutricionista se torna essencial nesse processo de reeducação alimentar e melhora gradativa de um comportamento negativo que foi sendo estabelecido por anos.”
Como lidar (e superar) o paladar infantil
A seguir, Liliam Teixeira Francisco dá dicas para contornar o problema gradativamente (mas não se esqueçam: o auxílio de um profissional é essencial para superar a limitação de forma definitiva e segura):
1. Comece devagar
Para a nutricionista, a melhor decisão é começar a provar os alimentos de forma gradativa, tentando introduzir apenas uma comida nova por vez. “Claro, precisa provar pelo menos duas vezes para ter certeza se gosta ou não. Nada de desistir na primeira”, recomenda.
Ela reforça: “Vá aos poucos, não queira em uma semana sair experimentando tudo. É legal iniciar o processo com um alimento inédito por semana, depois uma nova opção por refeição e ir aumentando.”
2. Prepare os alimentos de formas diferentes
Liliam exemplifica: “Imagine que você experimentou uma couve-flor cozida, mas ela estava gelada e a experiência foi negativa. Neste caso, prove ela quente em uma próxima ocasião. Ou, então, mude algum tempero ou o modo de preparo. Insistir é a palavra-chave”, revela.
3. Siga o que a maioria gosta
A especialista recomenda que, ao iniciar o processo, comecemos pelas opções de alimentos que a maioria gosta: “No caso das frutas, uma opção comum seria a banana ou a maçã, ao invés de um abacate ou caqui, que são menos populares”, indica.
4. Experimente texturas diferentes
Liliam também indica experimentar texturas diferentes para alimentos que, em uma primeira degustação, não foram agradáveis. “Caso não tenha gostado de uma batata cozida, tente prová-la em forma de purê. Também é possível cozinhá-la em palitos e depois colocar no forno para assar”, diz. O que não faltam são possibilidades!
5. Vá ao mercado ou feira
É de extrema importância que estejamos sempre conscientes do que estamos comprando para consumir. “Vá ao mercado, olhe as opções e observe o que estiver disposto a provar. Você é a pessoa que precisa estar à frente deste processo”, afirma.
Paladar infantil x TARE (Transtorno Alimentar Restritivo Evitativo)
Por fim, a nutricionista esclarece as diferenças entre o paladar infantil e o TARE (Transtorno Alimentar Restritivo Evitativo): “O paladar infantil é apenas um mau hábito de alimentação. Contudo, ao se agravar, ele pode se transformar no TARE, que é esse distúrbio capaz de provocar graves consequências nutricionais por uma recusa alimentar, trazendo a necessidade de um tratamento que reúne acompanhamento médico, nutricional e psicológico”, clarifica.