Se fosse possível descrever a vida de Renata Alves de Paula, de 54 anos, em uma palavra, “monótona” estaria fora de cogitação. Mãe, enfermeira e criadora do Vênus Talks — plataforma de conteúdo dedicada à saúde da mulher acima de 45 anos —, ela sempre prezou pelo caráter e determinação. No início de sua carreira, por exemplo, abandonou o cargo no Hospital Sírio Libanês para trabalhar com internação domiciliar — tudo pelo amor aos pacientes.
Aos 29 anos, a vida mudou avassaladoramente quando deu à luz a sua primeira filha. Apesar da maternidade ser um sonho, veio acompanhada de complicações: “Eu tive placenta prévia e sangramentos, devido a ter uma gravidez tubária, mas eu não estava nem aí. A Laura iria nascer e seria minha filha guerreira”.
Um ano depois, mais um tumulto: uma hemorragia no útero. “Entre o tempo de parar na porta do hospital até ser operada, não se passaram mais de 15 minutos. Eu tentava sentir a minha própria pulsação e percebi que estava morrendo.”
Feita a cirurgia, Renata teve que retirar um ovário e uma trompa, foi logo avisada de que não poderia ter mais filhos. Mas, surpresa: um mês depois, a empresária estava grávida de Luca.
Após o nascimento do pequeno, porém, Renata entrou na menopausa, com apenas 30 anos. “Não foi uma revelação avassaladora, eu estava bem e fui viver a minha vida. Fiz uma dieta nesse processo e emagreci bastante. Alguns meses depois, me olhei no espelho enquanto provava biquínis, pois eu iria para a praia, e não restava mais nenhum vislumbre dos meus peitos. A solução foi evidente, eu iria colocar silicone”, diz, entre risadas.
O que começou como uma simples vontade de desfilar sua versão ideal em frente ao mar a levou a descoberta de um câncer de mama.
“Eu falei: ‘É fim de ano, vou fazer meus exames e, em janeiro, eu coloco prótese’.” Ela correu para fazer o que pensava serem exames pré-operatórios: uma mamografia e um ultrassom. A mamografia veio limpa, mas o ultrassom acusou a doença.
“O médico achava que eu já sabia do nódulo e me questionou quem era meu mastologista, e eu respondi: ‘Quem conhece meu peito é o senhor, meu ginecologista e meu marido’. Eu não tinha isso. Ele ficou espantado e avisou que eu não colocaria silicone.”
Sem tempo para pensar, a descoberta feita numa sexta-feira foi seguida de uma série de exames, entre eles, o estadiamento — que realiza a localização e a extensão do câncer.
“Me deitaram numa maca e o médico enfiou três agulhas no meu peito, sem anestesia. Depois colocou o sutiã, que eu só poderia tirar na mesa de cirurgia. Foi brutal, e é uma violência”, comenta, com choro preso na garganta.
Quatro dias após o diagnóstico, aos 32 anos, ela realizava a cirurgia de retirada de um dos quadrantes da mama. Tamanha rapidez é reconhecida como dádiva pela enfermeira.
Renata descreve esse momento como um dos piores fins de semana de sua vida. Ela pensava apenas nos seus filhos. “Quando você é mãe, o filho é o coração que bate fora de você. Eu sonhava com eles e, claro, em acompanhar a vida deles, e com o diagnóstico do câncer era como se tudo tivesse acabado. Meu único medo era não ver meus filhos crescerem”, comenta.
Mas, ela não tinha plano B — veria seus filhos em cada etapa e viveria saudável para acompanhá-los. Na cirurgia, retiraram o quadrante e o gânglio sentinela. Ela acordou com duas próteses, deixando apenas uma cicatriz de lembrança.
Devido à descoberta em estágio inicial, seus médicos não recomendaram a realização de quimioterapia ou de radioterapia, apenas controles a cada três meses.
Desde então, ela faz uma festa a cada Outubro Rosa. “Em fevereiro, descobri que o SUS trata a menopausa e o climatério. Percebi que não poderia deixar esse tratamento e essa vivência ficarem somente comigo, daí surgiu o Vênus Talks. É a ressignificação do câncer de mama e da menopausa, é hora de falar sobre mulheres.”
Em maio, realizou a primeira edição do Vênus Day Talks, no hotel Rosewood, em São Paulo.
Eu não poderia deixar esse tratamento e essa vivência ficarem somente comigo, daí surgiu o vênus talk. A vida após o câncer continua, mas ele me tornou mais humana.
Renata Alves de Paula
“A vida após o câncer continua, mas ele me tornou mais humana.” Hoje, com os cabelos compridos, ela já sabe qual será seu presente de aniversário: doar suas madeixas para pacientes em tratamento.
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