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“Ter muita idade é revolucionário”, defende Mirian Goldenberg em novo livro

<i>A Bela Velhice</i>, novo livro da antropóloga Mirian Goldenberg, é antes uma confissão e, depois, um manifesto. No país que ignora os idosos, ela se diz uma militante na defesa do direito de envelhecer com força, alegria e desejo sexual

Por Patrícia Zaidan Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO
Atualizado em 27 out 2016, 23h40 - Publicado em 15 out 2013, 22h00
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  • “Vamos durar até 90 anos. De que adianta viver tanto, sentindo medo desde os 40?”, diz Mirian
    Foto: Reprodução/ Daryan Dornelles

    O colo da antropóloga Mirian Goldenberg está na capa de seu vigésimo livro, A Bela Velhice (Record), que será lançado na primavera. Para provocar, Mirian escolheu expor o pescoço – o que as mulheres com mais de 50 anos detestam mostrar, porque é ele que primeiro as trai, revelando a verdadeira idade que têm. Há ênfase nas rugas e manchinhas. Unhas rentes e sem esmalte completam a foto. Nascida em Santos, professora da Universidade Federal do Rio de Janeiro, ela tem 56 anos. E já se diz idosa: “Brinco com os meus alunos: `Fala alto, porque sou velha’”. Quer, com isso, afirmar que “ter muita idade é bom, lindo e revolucionário”. Mirian decidiu estudar os velhos em 2007, ao voltar da Alemanha, onde viu setentonas cheias de gás e de amor para dar. “Eu pensei: `É isso. As brasileiras, aos 30, já estão mal-humoradas, se queixam de que falta homem, de que estão gordas ou flácidas. Perdem o viço décadas antes das europeias'”. No estudo, mais de 1 700 homens e mulheres falaram sobre o outono da existência, e o material entrou em dois livros anteriores. O que a antropóloga traz agora é o impacto que a pesquisa causou em sua vida particular.

    POR QUE O LIVRO MEXEU TANTO COM VOCÊ?

    Nem todos somos brancos, negros, gays ou héteros. Já velhos, todos seremos. Nunca vivi do meu corpo, mas das minhas ideias. Mesmo assim tinha medo de envelhecer. Até os 40, não havia usado sequer filtro solar. Fui à dermatologista e ela perguntou: “Por que você não corrige as pálpebras, não preenche os lábios e põe Botox? Vai rejuvenescer dez anos”. Fiquei em crise. Eu me lembrei que, aos 20, tinha achado A Velhice, de Simone de Beauvoir, um livro cruel, que deixa a sensação de que envelhecer é virar um cadáver ambulante. Dei uma guinada quando pensei: “Vamos durar até 90 anos. De que adianta viver tanto, sentindo medo desde os 40?” Dos livros que eu escrevi, esse foi o que mais me ensinou.

    A JORNALISTA MARÍLIA GABRIELA DIZ QUE ENVELHECER DA PORTA PARA DENTRO É ÓTIMO, NOS TORNA SÁBIAS. DA PORTA PRA FORA É UM DESASTRE, O CORPO CAI, TUDO DÓI. VOCÊ QUIS GLAMOURIZAR A VELHICE?

    Não quis glamourizar nada, mas mudar o foco. Se eu olhar só o que cai, não tenho saída. As mulheres que mais sofrem são as fixadas na aparência: vão despencar. Quem olha para a Marília não vê o que caiu, e sim que ela é inteligente, ágil e sedutora. Para ter uma bela velhice, é preciso criar um projeto de vida, cultivar as amizades, colocar energia naquilo que ainda não realizou.

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    O QUE APRENDER COM OS VELHOS QUE PESQUISOU?

    A maioria não se sente excluída. Tenho um aluno de 60 anos na graduação muito interessado. Vamos passar a ver velhos com vivacidade, comprando, casando, querendo sexo. Com filhos criados e situação profissional mais resolvida, muitas mulheres revelaram estar livres para um chope e para viajar. Cerca de 80% disseram: “Estou no melhor momento da vida, posso ser eu mesma”. Usam uma expressão, que acho ótima: “Apertei o botão do f…-se”. Também estou nessa. Ainda espero que as pessoas me amem, que elogiem minhas palestras, mas liguei o f…-se! Antes, sofria se pusesse uma vírgula fora do lugar. Como os velhos, não tenho mais tempo a perder.

    VOCÊ NUNCA SE SENTE INSEGURA?

    Ainda me sinto peixe fora d’água em festas. Não uso salto, não sei fazer um cabelo diferente nem conheço moda. Não é uma cobrança exterior. É subjetiva. O desejo de ser aceita é uma miséria subjetiva. Então, acho que até os 70 direi um “f…-se” bem mais sonoro.

    É VERDADE QUE OS HOMENS ENVELHECEM MELHOR?

    Isso é um mito criado pela mulher. Ela acha grisalho bonito, que as rugas dão charme e a barriga dele é sinal de poder. O homem tem mais dificuldades: ele se aposenta, perde a referência profissional e os amigos do escritório. Inseguro, apega-se aos filhos e ao futebol na TV. A mulher administra melhor, embora seja comum esperar o divórcio ou a viuvez para experimentar a liberdade tardia.

    VIVENDO MAIS, ATÉ OS 80, A FALTA DE DINHEIRO PREOCUPA?

    As pessoas negam a velhice, não se preparam. Pensam: “Velho é o outro, não vai acontecer comigo”. Não acontecia, o Brasil era um país de jovens. Mas está envelhecendo. É preciso poupar dinheiro.

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    COMO A MENOPAUSA É VISTA?

    As mulheres falam pouco nela. A TPM, a gravidez, as oscilações hormonais servem de treino. Na menopausa, não senti calor nem perdi a atração sexual. Dos 50 aos 52, tive insônia, ansiedade, fiquei vulnerável à agressividade cotidiana. Mas, a gente sabe, ela é datada, vai passar.

    HÁ UMA MÁXIMA QUE DIZ QUE TER FILHOS É A GARANTIA DE PROTEÇÃO NO FUTURO. ISSO SE CONFIRMOU?

    Não. As pesquisadas contaram que quem lhes dá atenção, acompanha ao hospital, é a amiga. Não querem cobrar dos filhos, mas existe uma tristeza por não tê-los presentes. Às vezes, relatam que eles exploram, pedem dinheiro e favores. Algumas se sentem um traste quando os filhos não se mostram parceiros. Elas acabam descobrindo que o principal capital de que dispõem é a amizade.

    COMO O MARIDO VÊ O SEU ENVELHECER? VOCÊS TÊM FILHOS?

    Não tenho filhos, por opção. Adoro a minha enteada, de 19 anos. Eu brinco com meu marido – coisa que aprendi com a pesquisa. Ele diz que adora me ver rir de qualquer bobagem. Para ele, é mais atraente uma mulher que ri do que uma linda, maquiada e chata para caramba.

    POR QUE PÔS NA CAPA UMA FOTO QUE SUGERE NUDEZ?

    Não tenho vontade nem coragem de posar nua. Foi uma brincadeira para simbolizar liberdade e felicidade. Discuto com a Secretaria de Idosos, no Rio, direitos dos velhos, como a acessibilidade. No plano subjetivo, estou criando a mentalidade de que é preciso construir a bela velhice desde muito cedo. É minha militância lúdica, mas ela é muito política.

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