A dançarina cearense Ana Carolina de Souza Vieira, de 30 anos, foi encontrada morta na manhã desta quarta-feira (4) no apartamento em que morava na Rua Vergueiro, no Sacomã, Zona Sul de São Paulo. O corpo da dançarina foi encontrado pelos zeladores do prédio, que suspeitaram do forte mau cheiro vindo do apartamento onde Ana Carolina morava. Ao entrar no local, eles encontraram o corpo da jovem na cama do quarto, coberto. As janelas estavam fechadas, havia um ventilador ligado e muitos incensos acesos. A polícia revelou que o corpo tinha sinais de violência e que a dançarina teria morrido há pelo menos três dias.
O ex-namorado dela, Anderson Rodrigues Leitão, confessou o crime. Em depoimento à polícia ele assumiu que estrangulou Ana Carolina e disse ainda que tomou veneno de rato para morrer abraçado com a ex-namorada. Anderson vai responder por homicídio e ocultação de cadáver.
Por que esse assunto é tão sério?
A violência contra as mulheres segue vitimando milhares de brasileiras todos os dias. Segundo dados revelados no Balanço dos atendimentos realizados em 2014 pela Central de Atendimento à Mulher da Secretaria de Políticas para as Mulheres da Presidência da República (SPM-PR), 43% das mulheres em situação de violência sofrem agressões diariamente; para 35%, a agressão é semanal.
Outro dado alarmante é que em 23,51% dos atendimentos os episódios de violência tiveram início logo nos primeiros meses de relacionamento. Em 23,28% as agressões se iniciaram no período de um a cinco anos. Embora muitos avanços tenham sido alcançados com a Lei Maria da Penha (Lei nº 11.340/2006), ainda assim, hoje, o Brasil contabiliza 4,4 assassinatos a cada 100 mil mulheres. A estatística coloca nosso país no 7º lugar no ranking de países nesse tipo de crime.
Uma pesquisa inédita, realizada com apoio da SPM-PR e Campanha Compromisso e Atitude pela Lei Maria da Penha, revelou um aumento da preocupação da sociedade com a violência doméstica e os assassinatos de mulheres pelos parceiros ou ex-parceiros no Brasil. Os dados revelam que o problema está bem mais perto do que imaginamos. Os casos de violência contra a mulher não estão restritos a uma classe social específica. Entre os entrevistados, de ambos os sexos e todas as classes sociais, 54% conhecem uma mulher que já foi agredida por um parceiro e 56% conhecem um homem que já agrediu uma parceira.
Mas o que é feminicídio?
A definição é simples. O feminicídio é caracterizado quando a mulher é assassinada justamente pelo fato de ser mulher. Tratam-se de crimes praticados com requintes de crueldade que tenham relação com o gênero feminino ou assassinatos cometidos pelos parceiros, por exemplo.
Sancionada no dia 9 de março pela Presidenta Dilma Rousseff, a lei do feminicídio é uma vitória para igualdade entre os sexos. A lei de número 13.104 altera o código penal para prever o feminicídio como um tipo de homicídio qualificado e incluí-lo na categoria dos crimes hediondos. Na prática, isso quer dizer que casos de violência doméstica e familiar ou menosprezo e discriminação contra a condição de mulher passam a ser vistos como qualificadores do crime. Os homicídios qualificados têm pena que vai de 12 a 30 anos, enquanto os homicídios simples preveem reclusão de 6 a 12 anos. Já os crimes hediondos são aqueles considerados de extrema gravidade e que, por isso, recebem um tratamento mais severo por parte da justiça. Eles são inafiançáveis e não podem ter a pena reduzida.
Crime passional? Não mesmo!
Mais do que propor providências mais rigorosas em resposta aos altos índices de violência contra as mulheres no Brasil, a lei do feminicídio traz a perspectiva de importantes mudanças. Graças a ela, fica cada vez mais evidente a existência de homicídios de mulheres por questões de gênero, possibilitando a criação de políticas publicas de prevenção e combate à violência contra a mulher.
Chamar casos como o de Ana Carolina de “crimes passionais” parece cada vez mais absurdo. Eles foram, por acaso, movidos por amor? De maneira nenhuma. O que ainda leva muitas mulheres à morte não é a paixão dos companheiros, mas sim a ideia de poder que eles têm sobre elas. E é essa ideia de poder que os leva a acreditar que são proprietários do corpo e da alma de suas parceiras.
Ao usar o termo “crime passional”, polícia e sociedade como um todo reforçam a ideia de que o amor levou à agressão, mas uma paixão supostamente arrebatadora nunca poderá servir como justificativa para violência contra a mulher. Quem ama não agride, não mata.