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Padre Júlio Lancellotti: ícone do apoio à população de rua está sob ameaça

O religioso afirma ter sido alvo de uma campanha de difamação feita por um político - Arthur do Val, o Mamãe Falei, que é deputado estadual em São Paulo

Por Da Redação
16 set 2020, 16h30
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  • O padre Júlio Lancellotti, coordenador da Pastoral do Povo de Rua da Arquidiocese de São Paulo, registrou um boletim de ocorrência por ameaça, nesta terça-feira (15). O religioso foi xingado por um motoqueiro enquanto fazia seu trabalho de atendimento a pessoas em situação de rua no centro de São Paulo.

    Júlio Lancellotti afirma ter sido alvo de uma campanha de difamação feita pelo deputado estadual e pré-candidato à Prefeitura de São Paulo Arthur do Val (Patriota), o Mamãe Falei. O religioso publicou um vídeo no Twitter, em que não cita diretamente o nome do político, mas afirma que os ataques se intensificaram após declarações de um candidato.

    “Estava aqui na praça com os irmãos de rua e passou uma moto por aqui e o cara falou: ‘padre filho da puta que defende noia [usuários de drogas]’. Depois dos ataques de alguns candidatos à prefeitura contra mim, estou cada vez mais em risco. Então quero deixar claro: se me acontecer alguma coisa, se eu for atingido por alguém, vocês sabem de quem é a culpa, de quem cobrar”, disse.

    Arthur do Val, que além de político é youtuber, possui vários vídeos chamando o padre de “cafetão da miséria”, além de criticar ONGs e setores da igreja que atuam na Cracolândia da capital paulistana. Após as declarações do padre, ele negou que o tenha ameaçado ou incitado que outras pessoas o ameaçassem. As declarações foram publicadas em um vídeo, postado nas redes sociais na noite de terça (15).

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    “Não tem ‘algum candidato à prefeitura’, tem eu, Arthur do Val, que estou questionando tudo aquilo que o senhor [Padre Júlio Lancellotti] faz e mantém as pessoas na miséria. Eu não estou ameaçando. É mentira. Eu duvido você achar um vídeo meu, uma postagem minha sequer, ameaçando o padre de fazer alguma coisa, alguma violência contra ele ou incentivando que outras pessoas o façam”, disse Arthur.

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    A importância do trabalho de Júlio Lancellotti

    Júlio Lancellotti, de 71 anos, natural de São Paulo, foi ordenado sacerdote em 1985, aos 37 anos. Ele já havia tentado seguir carreira religiosa antes, mas mas era considerado “insolente” pelas autoridades da igreja, devido, especialmente, a seus trabalhos com a população em situação de rua e os LGBTQIA+.

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    Ele se formou como auxiliar de enfermagem e, depois de finalizar o curso, Júlio passou a se dedicar à assistência social, cuidando de crianças abandonadas. Anos depois, quando foi ordenado padre, passou a atuar ainda mais fortemente na área e ajudou na criação da Pastoral da Criança, na formulação do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) e trabalhou com detentos e detentas. Em 1991, fundou a Casa Vida, que acolhe crianças portadoras do vírus HIV – instituição que já recebeu diversos prêmios voltados aos Direitos Humanos.

    Atualmente, dedica boa parte de seu trabalho à Pastoral do Povo de Rua, que lhe trouxe ainda mais visibilidade. Todos os dias, depois de celebrar a missa das 7h na Paróquia de São Miguel Arcanjo, no bairro da Mooca, se une a voluntários para servir café da manhã para as pessoas em situação de rua, distribuir roupas e o que mais precisarem. Apesar de seu trabalho ser muito bem visto pela maioria das pessoas, o padre já sofria há tempos com discursos de ódio e ameaças nas redes sociais, especialmente por parte dos moradores da Mooca. As pessoas o acusam de ter atraído a população em situação de rua para o bairro, devido à assistência que presta, o que “desvalorizaria” a região.

    Além do trabalho com a população de rua, o padre  também é conhecido por iniciativas voltadas a outras parcelas vulneráveis da população, como a comunidade LGBTQIA+. Em suas missas, recorrentemente pede perdão à comunidade por conta do preconceito de alguns líderes religiosos. “Recebo muitas mensagens de pessoas que são expulsas de suas igrejas por assumirem sua orientação sexual. Ninguém pode achar que a homofobia vem de Deus, que a LGBTfobia vem de Deus, isso é pecado. É crime e pode ser denunciado. Todos somos irmãos independente da condição sexual”, disse ele em uma das celebrações que viralizou nas redes sociais.

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    Em uma outra ocasião, o padre sofreu represália da própria igreja por participar de um ato em memória à vítimas de transfobia no Largo do Arouche e lavar e beijar os pés de uma mulher transsexual enquanto pedia perdão pela intolerância e desrespeito da comunidade. No ano seguinte, repetiu o gesto durante a Via Sacra do Povo de Rua.

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