Por horas e horas da tarde de ontem (10), a hashtag #CancelNetflix dominou os trending topics mundiais do Twitter. Em diversos países, internautas propunham boicote à plataforma de streaming após a entrada no catálogo do filme francês Mignonnes (Lindinhas, em tradução livre), acusado de sexualizar suas protagonistas, um grupo de meninas na faixa etária dos 11 anos.
A polêmica já havia sido instaurada em agosto, durante as primeiras promoções do longa, quando a plataforma usou uma foto das garotas em poses sensuais para divulgá-lo, uma imagem bem diferente da usada na divulgação francesa. Na ocasião, após uma chuva de críticas, a Netflix se pronunciou pedindo desculpas pela escolha inapropriada da imagem e afirmando que, de modo algum, ela representava o filme, que chegou a levar o prêmio de Melhor Direção no Festival Sundance de Cinema.
We're deeply sorry for the inappropriate artwork that we used for Mignonnes/Cuties. It was not OK, nor was it representative of this French film which won an award at Sundance. We’ve now updated the pictures and description.
— Netflix (@netflix) August 20, 2020
Mignonnes conta a história de Amy (Fathia Youssouf), uma garota senegalesa de família muçulmana que, divida entre o contraste dos valores tradicionais de sua mãe e da aparente liberdade da cultura da Internet, decide juntar ao grupo de dança de sua vizinha Angelica (Médina El Aidi-Azouni), e, com uma “consciência de sua feminilidade crescente”, como descreve a sinopse, impulsiona a equipe a adotar coreografias cada vez mais sensuais, despertando nas colegas a esperança de alcançar a fama por meio da participação em um concurso de dança.
A trama, segundo explicou a diretora Maïmouna Doucouré, é um espelho da sociedade e uma reflexão sobre a percepção que meninas têm de si mesmas e de sua feminilidade em uma sociedade que tanto sexualiza mulheres, especialmente nas redes sociais. A suposta liberdade encontrada por Amy no grupo de dança é mesmo liberdade, perguntou ela em um vídeo divulgado no canal da Netflix no YouTube. “O real questionamento de Mignonnes é: podemos nós, mulheres, realmente escolhermos quem queremos ser, para além dos padrões que nos são impostos pela sociedade?”, disse.
O público, contudo, parece não concordar com as visões de Doucouré e dos críticos. No Rotten Tomatos, em que a crítica o deu 88% de aprovação e classificou o filme como “um olhar cuidadoso sobre as complexidades da infância na era moderna”, a avaliação da audiência é de apenas 3%. Nojento, abominável e vergonhoso são algumas das palavras usadas pelas pessoas que deixaram reviews negativas. No YouTube, o vídeo dela já possui quase 10 mil dislikes.
Em entrevista à Deadline, a diretora revelou que chegou a receber ameaças de morte, após a polêmica dos pôsteres de divulgação. Ocupada com o lançamento do filme na França, ela contou não tinha visto antes os cartazes do filme. “Eu não entendi o que estava acontecendo. Foi quando vi como era o pôster”, relatou, contando que foi acusada de estar fazendo apologia à hipersexualização infantil, especialmente por pessoas que não haviam assistido o filme.
“Eu espero que aqueles que não viram, o vejam, e mal posso esperar por suas reações”, continuou. “Com sorte, eles entenderão que estamos no mesmo lado nessa batalha. Se juntarmos forças, podemos fazer uma grande transformação nesse mundo que hipersexualiza crianças.”
A Netflix não se pronunciou até o momento.