Entenda porque deputadas se revoltaram contra mais uma manobra de Cunha
Como forma de protesto, Luiza Erundina (PSOL-SP) sentou-se na cadeira de Eduardo Cunha (PMDB-RJ), acompanhada por Moema Gramacho (PT-BA) e outras mulheres que também inviabilizaram a fala dos demais representantes presentes.
Em meio a gritos de “golpista”, com exemplares da Constituição em mãos, placas com mensagens “Fora Cunha” e “Ouçam as mulheres”, um grupo de deputadas ocupou, na noite desta última quarta-feira (27), a tribuna do plenário em protesto a mais uma manobra ministrada pelo presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ). Como forma de protesto, Luiza Erundina (PSOL-SP) sentou-se na cadeira de Cunha, acompanhada por Moema Gramacho (PT-BA) e outras mulheres que também inviabilizaram a fala dos demais representantes presentes.
O clima acirrado tomou conta da votação que havia sido suspensa anteriormente, mas foi realizada mesmo após a polêmica, e aprovou com 221 votos à favor, 167 contra e uma abstenção, a formação de duas novas comissões técnicas permanentes na Casa: a de Defesa dos Direitos da Mulher e a de Defesa dos Direitos da Pessoa Idosa. O texto substitutivo foi redigido pelo relator João Campos (PRB-GO), conhecido por pertencer à bancada religiosa, mas ainda faltam votar os destaques. Com criação das duas, a quantidade de comissões passou de 23 para 25.
“Ouçam as mulheres”
Entre as contestações da ínfima parcela feminina na Câmara, está a necessidade de que assuntos sobre os direitos das mulheres sejam tratados por elas mesmas. Ao contrário do que acontecerá com pautas como o “direito do nascituro” e a remuneração das mulheres, que antes era de responsabilidade da Comissão das Mulheres, e passarão a ser da competência de Comissão de Seguridade Social e Família e Comissão de Trabalho e Serviço Público, respectivamente.
O uso da expressão “direito do nascituro”, também rendeu várias críticas por parte das deputadas, por fazer menção ao “Estatuto do Nascituro”, que entre os vários retrocessos, permite que os embriões possuam direitos similares aos das pessoas nascidas, reforçando, assim, uma posição contrária àquelas que lutam pelo direito das mulheres de sentenciarem sobre a própria gravidez.
O projeto, em sua íntegra, também prevê que a realização do aborto seja expressamente proibida em qualquer circunstância – até mesmo no caso de violência sexual. Essas mulheres seriam obrigadas por Lei a prosseguirem com a gravidez resultada do estupro, e poderiam revindicar a “paternidade” do estuprador, além da pensão alimentícia.
“Quem sabe das necessidades e dos interesses das mulheres somos nós mulheres. Não aceitamos que nenhum homem nos substitua para dizer quais são os nossos direitos”, declarou a deputada Luiza Erundina (PSOL-SP) sentada na cadeira de Cunha: “Nós somos mais de 50% da população brasileira e somos menos de 10% nessa casa. Essa desvantagem na representação é um déficit na democracia brasileira e essa proposta vem comprometer as conquistas das mulheres brasileiras”.
“Não somos contrárias a criação das comissões da mulher ou do idoso, mas sim a forma como esta comissão foi trazida aqui, somente para contemplar os aliados [de Cunha] com cargos nas novas estruturas”, completou Moema Gramacho (PT-BA).
Jandira Feghali (PcdoB-RJ) fez coro às críticas de suas companheiras: “Estamos criando um meio instrumento, estamos fazendo de conta que estamos debatendo a questão da mulher e rompendo um acordo. [Estamos] mexendo com uma questão da seguridade que em nenhum momento entrou nessa discussão”.
A deputada Erika Kokay (PT-DF) também endossou o discurso das vozes femininas: “É uma comissão executiva: para incentivar, para receber denúncia, para fiscalizar, para oferecer prêmios, mas não para discutir o mérito das matérias no que diz respeito às mulheres. Queremos discutir a violência contra a mulher, a desigualdade salarial que atinge as mulheres e tantas outras questões”.
Retrocesso
Segundo as deputadas, a aprovação do projeto redigido por Campos (PRB-GO) representou não somente um benefício aos aliados do presidente da Câmara, mas uma quebra de acordo relativo à abrangência dos novos colegiados, e um retrocesso nas conquistas históricas alcançadas a duras penas pelas mulheres no âmbito político, que sequer foram consultadas antes do encaminhamento do texto a Cunha.
O relator contrariou as críticas realizadas por suas companheiras: “Não concebo a ideia de que a política relacionada à remuneração das mulheres seja discutida fora do contexto da política dos trabalhadores em conjunto na Comissão de Trabalho e Serviço Público”. Ele também acredita que o debate do “direito do nascituro” não deve ser restrito apenas à Comissão das Mulheres, incumbindo a Comissão de Seguridade Social e Família desta atribuição: “já que as feministas entendem que o tema aborto diz respeito apenas às mulheres e não ao nascituro e nós entendemos que o tema aborto diz respeito tanto à mulher quanto ao nascituro.”