O caso aconteceu em 2013. Robinho foi condenado a nove anos de prisão por violência sexual em 2017. Mas a discussão está em alta atualmente, em 2020, porque, mesmo com a condenação por estupro, o Santos Futebol Clube contratou o atacante para o time e, depois da repercussão, suspendeu a contratação, em comum acordo com o jogador. Neste sábado, jogador disse a UOL que seu único erro foi ter traído a esposa.
Em novembro de 2017, Robinho foi condenado por violência sexual em grupo contra uma jovem albanesa de 22 anos, pela nona seção do Tribunal de Milão. No entanto, o sistema de justiça italiano possui três instâncias. Por isso, a decisão não é definitiva e foi contestada pelas defesas do jogador do Santos e de Ricardo Falco, outro acusado brasileiro do crime.
O caso aconteceu em uma boate de Milão chamada Sio Café, em janeiro de 2013. Além de Robinho e Falco, outros quatro brasileiros teriam participado da violência sexual. De acordo com reportagem do Globo Esporte, publicada nesta sexta-feira (16), os quatro acusados deixaram a Itália no decorrer da investigação e estão sendo processados num procedimento à parte.
Em abril de 2014, quando foi interrogado, Robinho negou a acusação, mas admitiu que manteve relação sexual com a vítima – segundo ele, uma relação consensual de sexo oral e sem outros envolvidos. No entanto, a perícia realizada por determinação da Justiça identificou a presença do sêmen de Falco nas roupas da jovem.
Reportagem expõe conversas gravadas de Robinho
A reportagem publicada pelo GE mostrou que as interceptações telefônicas realizadas contra os envolvidos, com a permissão da Justiça italiana, ao longo da investigação do caso foram cruciais para o veredito, em 2017.
Essas gravações, feitas entre os acusados, foram transcritas na sentença e uma das mais decisivas para a condenação em primeira instância foi uma conversa entre Falco e Robinho, que indicou ao tribunal que os envolvidos tinham consciência da condição da vítima.
“Ela se lembra da situação. Ela sabe que todos transaram com ela”, diz Falco. “O (NOME DE AMIGO 1) tenho certeza que gozou dentro dela”, responde Robinho. “Não acredito. Naquele dia ela não conseguia fazer nada, nem mesmo ficar em pé, ela estava realmente fora de si”, completa Falco e o atacante concorda em seguida.
Na transição de uma outra conversa, dessa vez feita com o músico Jairo Chagas, que tocou na boate no dia do crime, Robinho afirma que sabia que a mulher estava embriagada, ou seja, sem condições de consentir uma relação sexual. “Estou rindo porque não estou nem aí, a mulher estava completamente bêbada, não sabe nem o que aconteceu”, diz ele, segundo a transcrição obtida pelo GE.
Em janeiro de 2014, o músico e o jogador voltaram a se falar e Robinho assumiu que tentou fazer sexo oral com a vítima. “Mas você também transou com a mulher?”, Jairo pergunta. ” Não, eu tentei”, responde o atacante. “Eu te vi quando colocava o pênis dentro da boca dela”, contrapõe o músico. “Isso não significa transar”, responde Robinho.
Para a justiça italiana, ainda de acordo com a reportagem do GE, as escutas realizadas a partir de janeiro de 2014 são “auto acusatórias”.
Lei italiana x Lei brasileira
De acordo com o artigo 609 octies do Código Penal Italiano, a violência sexual de grupo, da qual Robinho foi condenado, “consiste na participação, da parte de várias pessoas reunidas, a atos de violência sexual”. Os atos dos quais o artigo se refere estão referidos no 609 bis, que diz:
“Qualquer um que, com violência ou ameaça ou mediante abuso de autoridade, obriga outro a ter ou sofrer atos sexuais é punido com a reclusão de cinco a dez anos. Quem induz alguém a ter ou sofrer atos sexuais está sujeito à mesma pena: 1) Abusando das condições de inferioridade física ou psíquica da pessoa ofendida no momento do fato; 2) Enganando a pessoa ofendida ao substituir o culpado por outra pessoa.”
A fim de comparação, no Brasil, o Código Penal entende como estupro o ato de “constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, a ter conjunção carnal ou praticar ou permitir que com ele se pratique outro ato libidinoso” (Art. 213).
Mais recentemente, a Lei nº 13.718/2018 incluiu no CP o artigo 215-A a importunação sexual, que é “praticar contra alguém e sem a sua anuência [consentimento] ato libidinoso com o objetivo de satisfazer a própria lascívia ou a de terceiro”.
Por fim, o fato de a vítima de um abuso sexual estar embriagada faz com que o ato possa ser enquadrado como “estupro de vulnerável”, no Brasil. Segundo o artigo 217-A, inciso um, “incorre na mesma pena quem pratica as ações com alguém que, por enfermidade ou deficiência mental, não tem o necessário discernimento para a prática do ato, ou que, por qualquer outra causa, não pode oferecer resistência.”
Posicionamento do Santos
Na última quarta-feira (14), o Santos se manifestou por meio de uma nota oficial sobre a contratação de Robinho. No comunicado, o clube diz ser “contra qualquer tipo de violência, especialmente contra a mulher” e ressaltou que “ainda não há condenação definitiva e o atleta responde em liberdade e não será o Santos que lhe dará uma sentença antecipada, prejulgando e o impedindo de exercer sua profissão”.
A nota ainda acrescenta que o Santos não mudará seu posicionamento em relação ao combate à violência contra mulher e ainda lamentou o que chamaram de “era dos cancelamentos, da cultura dos tribunais da internet e dos julgamentos tão precipitados quanto definitivos”.
O presidente do Santos, Orlando Rollo, disse, em entrevista à Folha de S. Paulo, que os santistas adoraram a contratação e que a reação negativa era de torcidas rivais, que teriam ficado com “dor de cotovelo”. “Robinho não está condenado com trânsito em julgado. Quem somos nós para atirar pedra em Robinho? Atire a primeira pedra quem nunca pecou. E será que ele pecou? Vamos esperar o desfecho do processo”, afirmou. A reportagem foi publicada no dia 11 deste mês.
Nesta sexta-feira (16), o apresentador Walter Casagrande, durante edição do Globo Esporte na TV Globo, se posicionou sobre o caso. “Eu estou assustado com a sociedade brasileira. Não é um apedrejamento no Robinho. É um apedrejamento na moral da sociedade brasileira. Não pode se inverter os valores. Robinho está condenado a nove anos de prisão por violência sexual na Itália. Está recorrendo, mas nesse momento ele é condenado.”
Apesar de já ter sido anunciado e registrado na Confederação Brasileira de Futebol (CBF), Robinho pode não jogar no Santos. É o que sugere Marcelo Teixeira, presidente do Conselho Deliberativo do clube, ao Globo Esporte. Segundo ele, o órgão tem o poder de vetar a contratação do jogador.
“A decisão de plenário é soberana. Se não aprovar (a contratação), nada daquilo que está feito tem validade em termos de regularização do jogador para atuar como profissional”, disse.
CLAUDIA tentou contato com o Santos Futebol Clube para um novo posicionamento, após as revelações da reportagem do Globo Esporte, mas até a publicação desta matéria não obteve retorno.
Mais tarde, na sexta-feira, o jogador e o time anunciaram a suspensão do contrato. No vídeo divulgado pelo jogador, Robinho diz: “Com muita tristeza no coração, venho falar para vocês que tomei a decisão, junto com o presidente, de ter a suspensão do meu contrato nesse momento conturbado da minha vida. Meu objetivo sempre foi ajudar o Santos Futebol Clube e se de alguma forma eu estou atrapalhando, é melhor que eu saia e foque nas minhas coisas pessoais. Pros torcedores do Peixão, aquelas pessoas que gostam de mim, com certeza eu vou provar para vocês a minha inocência. Um abraço”.
O time da Vila Belmiro também divulgou uma nota sobre a saída de Robinho. “O Santos Futebol Clube e o atleta Robinho informam que, em comum acordo, resolveram suspender a validade do contrato firmado no último dia 10 de outubro para que o jogador possa se concentrar exclusivamente na sua defesa no processo que corre na Itália.”
Perda de patrocinadores
A suspensão veio após pressão dos patrocinadores. Após o acerto com o Robinho, o Santos passou a conversar com os patrocinadores que demonstraram preocupação sobre a polêmica. Até então, duas marcas já haviam rompido o contrato com o clube.
A primeira foi a Orthopride, empresa de ortodontia, que anunciava nas camisas do Peixe desde maio de 2018. Ao GE, Richard Adam, diretor de operações da empresa, disse que tomou a decisão pois o público da marca “é majoritariamente feminino e, em respeito às mulheres que consomem nossos produtos, tivemos que tomar essa decisão”. “Queremos deixar claro que não fomos informados previamente sobre a contratação do Robinho, fomos pegos de surpresa pela imprensa no fim de semana”, completou.
O segundo rompimento de parceria foi anunciado nesta sexta-feira (16), pela empresa Kicaldo, que estampa a manga do uniforme do time. Em entrevista ao UOL Esporte, a marca diz que “a nossa posição é que o clube rescinda com o jogador Robinho. Estamos aguardando a posição do clube. Se eles rescindirem, a gente mantém a parceria. Se não, a gente não vai mais patrocinar a equipe”.
Na tarde de sexta-feira a empresa Philco também se posicionou em seu perfil no Instagram, afirmando que já encaminhou nota ao Santos e que “repudia veementemente a contratação do atleta Robinho, após a constatação dos fatos” e anunciou que, caso o clube não rescinda imediatamente o contrato, a empresa irá revogar o patrocínio.