“Eu tenho uma irmã gêmea e nossa mãe sempre bebeu muito. Ela adorava chamar os amigos para nossa casa ou ir para a casa deles e ficar bebendo. Um dos amigos dela era amado por todo mundo. Ele era engaçado, legal, todos achavam ele confiável. Ele morava na mesma rua da minha outra irmã, mais velha. Várias vezes, quando ele estava em casa com a minha mãe, ele perguntava se, na hora de ir embora, ele poderia me levar até a casa da minha irmã ficar um tempo com ela. Minha mãe deixava, claro.
Ele parava o carro no meio do caminho e abusava de mim. Nunca me penetrou com o pênis, mas com o dedo e eu ficava muito machucada. Ele era bravo, falava que eu não poderia contar para ninguém, gritava comigo quando eu tentava fechar as pernas – o que não adiantava nada, porque ele tinha muita força.
A cena sempre se repetia. Toda vez que ele perguntava para minha mãe se poderia me deixar lá, eu começava a gritar, chorar, falava que não queria ir. Minha mãe nunca perguntou o motivo. Ela me abraçava e dizia que ia ficar tudo bem. Às vezes, me pergunto o por quê dela nunca ter perguntado mais sobre a situação.
Quantas meninas devem passar por isso? Muitas. O abusador na maioria das vezes é alguém bem próximo e a mãe não apoia ou pergunta o que está acontecendo. Simplesmente nos calamos porque não temos para quem pedir socorro.
Depois de 20 anos eu contei para minhas irmãs e para minha mãe. Para ela foi mais difícil, porque eu a culpava muito pela dor que senti. É uma dor terrível, uma tristeza. E a gente se pergunta: ‘Por que eu?’ Nunca tive uma resposta. Hoje tenho 39 anos e ainda me sinto bastante afetada pela situação. Chamo aquele monstro de fantasma, porque, do nada, aparece a dor, a tristeza, o choro. Deus me ajudou a viver, a seguir, mas não tem como esquecer.”
A partir de agora, CLAUDIA mantém esse canal aberto e oferece acolhimento para quem quiser libertar as palavras e as dores que elas carregam. Fale com CLAUDIA em falecomclaudia@abril.com.br.
*Nome trocado a pedido da personagem
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