Personagens LGBT são até “comuns” nas novelas das 21h, no sentido de aparecerem com certa frequência. Às vezes estereotipados, outras vezes protagonizando beijos que incomodam a ala mais conservadora (lembra da Fernanda Montenegro em ‘Babilônia‘?), mas pouco a pouco eles foram ganhando seu espaço na teledramaturgia.
Mesmo assim, esse é um tipo de assunto pouco comum em tramas que são transmitidas mais cedo. Por isso é muito importante o que está rolando na atual novela das 18h ‘Orgulho e Paixão‘.
A trama, ambientada em 1920 e baseada em obras de Jane Austen, vai muito bem de audiência e segue na tentativa de criar histórias com protagonistas de vários livros. Entretanto, existe um núcleo secundário (criado pelo autor Marcos Bernstein) que fala justamente sobre a aceitação de um LGBT.
Luccino (Juliano Laham) nunca foi um personagem muito importante em ‘Orgulho e Paixão’. Sua função na história sempre foi ser parceiro do irmão Ernesto (Rodrigo Simas) e dos corredores de moto Brandão (Malvino Salvador) e Mariana (Chandelly Braz).
A coisa começou a mudar quando Mariana decidiu participar das corridas de moto. Como se trata de uma sociedade bem machista (estamos falando do começo do século passado), ela não podia competir por ser uma mulher, então teve a ideia de se vestir de homem. Assumindo a identidade de Mário, ela passou a competir ao lado dos outros homens e até ganhou corridas. E foi nessa parte que Luccino começou a crescer em ‘Orgulho e Paixão’.
O personagem nunca havia sentido atração por mulher alguma, mas passou a sentir desejos por Mariana quando a via caracterizada de Mário. Ele sempre se sentiu diferente dos outros e nunca se interessou pelo sexo oposto, e foi graças ao disfarce que Luccino percebeu como seu coração batia mais forte por homens. Desde então, ele passou por todos os sentimentos comuns aos LGBTs: precisou se aceitar, foi se abrindo com as pessoas próximas e até se apaixonou por Otávio (Pedro Henrique Müller), um personagem que passa pelos mesmos dilemas.
Todas as cenas de Luccino a respeito de sua orientação sexual são muito bem escritas, bem atuadas e não dão margem para qualquer abordagem rasa em busca de audiência. Tudo é muito realista e o público de casa não só compra o drama de Luccino como também passa a torcer pelo personagem. A forma como os personagens vão aceitando e deixando claro que não vão deixar de amá-lo por causa disso também é muito reconfortante.
Existe uma falácia de que ser gay é algo moderno, ou que é algo “estimulado” por meios externos e atuais, mas a verdade é que a homossexualidade existe desde sempre. E uma novela das 18h (e ainda mais de época) ter a oportunidade de falar do assunto de uma forma delicada e sem qualquer estereótipo agrega muito a esse tipo de discussão sobre tolerância e respeito.
Tem personagem que destrata Luccino por ser homossexual? Tem sim, pois nada no mundo é perfeito. O pai do personagem o expulsou de casa após descobrir isso, mas a mensagem que passa ao espectador de casa é: “ele é um personagem de cem anos atrás, com um comportamento retrógrado“.
A torcida é para que tenhamos mais e mais novelas com representatividade e abordando assuntos delicados. Principalmente com a qualidade que vemos em ‘Orgulho e Paixão’.