O time de basquete do bairro de Bonsucesso estava prestes a perder uma importante partida, até que uma investida maldosa causou o afastamento de um dos mais promissores jogadores da equipe. O técnico Ramon (David Junior) já havia sido expulso da quadra após acusar de negligência o juiz, e tudo indicava que os garotos iriam perder a partida. Porém, do nada, um jogador misterioso surgiu em campo e realizou a jogada campeã. No meio das comemorações, percebemos que o tal jogador misterioso na verdade era uma jogadora misteriosa, a Gabriela (Giovanna Coimbra). Esse pequeno trecho da novela ‘Bom Sucesso‘, que aconteceu há algumas semanas, apenas mostra o quanto as tramas da Globo têm mostrado o esporte feminino e, consequentemente, sua desvalorização.
Atualmente temos duas novelas que tratam do tema “mulheres no esporte“. Além da já-citada novela ‘Bom Sucesso’, que conta com a filha de Paloma (Grazi Massafera) e seu apreço por jogar basquete, uma das personagens principais da atual temporada de ‘Malhação‘, Anjinha (Caroline Dellarosa) é jogadora de futebol. As duas personagens compartilham as dificuldades relacionadas ao ambiente esportivo, como a presença majoritária de homens e o quanto elas são julgadas por estarem naquele mundo.
Longe de qualquer estereótipo sobre apenas garotas mais masculinizadas praticarem esporte, a abordagem de Gabriela em ‘Bom Sucesso’ é um alívio para a discussão. A garota tem uma vida normal na escola, mantém relacionamentos amorosos e traz o basquete como principal hobby. A trama de Anjinha gostar de futebol em ‘Malhação’, embora não tenha tanto destaque desde que a personagem engatou um namoro, ainda mantém alguns debates sobre o assunto. Recentemente a personagem passou por julgamentos por se vestir de uma forma mais “largada”, e isso lhe causou um pouco de insegurança por se comparar com outras garotas.
Anjinha gosta de futebol e muay thai, atividades físicas normalmente atreladas aos homens, e a trama trata tudo com muita naturalidade. Para os personagens daquele universo, e ao contrário do senso comum atrasado do nosso país, uma garota jogar futebol é a coisa mais normal do mundo, e Anjinha não deixa de ser mulher por se interessar pelo esporte. Algumas opiniões contrárias surgem, claro, mas o gosto pessoal de Anjinha é tratado de forma extremamente positiva por todo o roteiro do folhetim.
Mesmo mostrando como algo normal o fato de duas garotas gostarem de praticar esportes, as novelas não deixam de mostrar as dificuldades envolvidas. Gabriela só invadiu o time masculino disfarçada como se fosse uma Mulan porque não havia espaço para ela jogar nos times do bairro. A forma como a novela mostra Gabriela como a melhor jogadora do bairro (é só ver que ela conseguiu derrotar um time masculino em uma só jogada), e mesmo assim não consegue espaço para jogar, lembra episódios da vida real. A jogadora Marta do futebol, por exemplo, teve dificuldades em conseguir patrocínio mesmo tendo sido eleita a melhor jogadora do mundo tantas vezes consecutivas.
Voltando à ficção, as novelas brasileiras retrataram desde sempre o esporte masculino, mas de um tempo pra cá as mulheres foram conquistando espaço.. às vezes literalmente. Em ‘Malhação Sonhos‘, uma das histórias secundárias era a de Karina (Isabella Santonni), uma lutadora que se apaixonava pelo músico Pedro (Rafael Vitti). A trama fez tanto sucesso que eles se tornaram os protagonistas da temporada, jogando para escanteio os atores escolhidos como personagens principais. Com a promoção da personagem na trama, aumentaram também os debates sobre a presença feminina nos esportes. E, com sorte, esses temas ainda serão bastante discutidos em tramas atuais e futuras.
Esporte feminino também em séries
O tema, e as dificuldades, das mulheres nos esportes não é algo exclusivo das novelas brasileiras. Muitas produções em todo o mundo têm dedicado um espaço para discutir o assunto, e recentemente a série ‘Minas do Hóquei‘ da Netflix foi muito bem recebida pelo público.
A série originalmente foi lançada na Catalunha, na Espanha, e chegou ao serviço de streaming no final de setembro. A história é bem simples e mostra treze garotas que precisam se esforçar com o objetivo de manter o time de hóquei no colégio em que estudam. Assim como ‘Bom Sucesso’, as garotas vão percebendo que o universo do esporte desvaloriza as mulheres, mesmo quando elas jogam melhor que os rapazes. Sendo assim, elas se unem e lutam pelo espaço.