Amanda Seyfried está de costas no fundo do quarto 702 do hotel Mandarin Oriental, na rua da moda em Paris. Da cabeça aos pés de Givenchy verão 2016 — calça de alfaiataria de cintura alta, uma camisa de renda e um peep toe de salto nas alturas da torre Eiffel, tudo preto —, ela se serve um suco de laranja, entre macarons, frutas, baguete, croissant dispostos no buffet. “Hoje eu sou o barman: o que posso oferecer a você?”, diz ela, antes mesmo do “hello”. A voz é baixa, as palavras saem sem pressa. Um efeito da meditação, talvez?, que ela pratica em Los Angeles. O humor parece mais uma boa defesa para a timidez. “Oh, é horrível”, ela diz, revirando os olhos de maneira afetada. “Eles me trazem queijos o tempo todo e eu me sinto uma americana mimada em Paris.”
Há dois anos Amanda tem feito a ponte aérea L.A. (ou Nova York)-Paris, desde que substituiu a atriz Liv Tyler como rosto e corpo do perfume Very Irrésistible, da Givenchy. “Estávamos saindo do clima ‘pra baixo’ da crise econômica e procurávamos alguém que nos inspirasse um estilo de vida divertido e feliz, leve”, diz Alain Lorenzo, presidente do LVMH Fragrances, braço do grupo de luxo que se ocupa dos lançamentos de perfumes, de Kenzo a Acqua di Parma. Amanda, desta vez, não é apenas o rosto de transição do perfume inspirado na amizade entre a atriz Audrey Hepburn e o costureiro Hubert de Givenchy. Ela é a nova Audrey no ano em que a Givenchy se prepara para comemorar os 60 anos do primeiro perfume da maison com a novidade: o Live Irrésistible. O perfume foi apresentado na mesma semana do lançamento do Dior Poison, um floral ácido (rosa e laranja) feito para meninas veneno que aproveitam a noite nos clubs nova-iorquinos. É o oposto do espírito da combinação de abacaxi com pimenta na versão eau de parfum e framboesa e limão para a verão eau de toilette da nova linha assinada por Dominique Ropion, pensada para alguém “único e impertinente, alguém que não se leva a sério”. “Não poderia ter nada mais a ver comigo”, diz Amanda. Nesta entrevista, Amanda, que acaba de filmar com David Lynch os 18 episódios do novo Twin Peaks, fala de auto-imagem, da aversão por premiações do gênero Oscar e do que aprendeu com Ricardo Tisci, estilista da Givenchy.
Como você se sente ao ser convidada para representar hoje o papel de Audrey Hepburn para Givenchy nos anos 60?
Completamente lisonjeada. Não me sinto nada sofisticada, que é o que a marca me inspira. Mas neste caso penso que a questão é muito mais sobre “ser você mesma”, de ter consciência de quem você é. Então, visto assim acho o casamento sob medida para mim: divertido, solar, jovem. É o complemento perfeito para o imagem de sedução misteriosa e sombria da moda Givenchy, que é uma roupa que me faz sentir mais mulher.
O que é um estilo de vida irresistível?
Ter liberdade de ir a qualquer lugar – não falo de viagem, mas de estar presente no momento presente. Espero chegar lá um dia!
Você e o perfume sempre foram bons amigos?
Na verdade, tenho uma relação ambígua, que reflete a da minha avó materna, meu ícone, e da minha mãe (fica vermelha) ao mesmo tempo. Minha avó sempre adorou perfume, bem franceses, bem fortes, e minha mãe sempre foi alérgica a eles. E toda vez que minha mãe vinha a Paris minha avó pedia um novo frasco — minha mãe tinha tanto bode que agora eu não consigo nem me lembrar da fragrância favorita da vovó. Na minha adolescência, minha irmã (Jennifer, três anos mais velha) passava Poison, que eu detesto, mas está tão ligada a minha memória com ela que, nela, eu passei a gostar. É um pouco como a relação com a música: tem aquela que cola na sua cabeça e é péssima, mas te faz lembrar alguma coisa, do gênero “ah, naquele ano eu estava fazendo isso e aquilo…”. Hoje, eu adoro passar perfume para sair à noite — da mesma forma que reservo maquiagem e salto para ocasiões especiais.
O que mudou na sua relação com o corpo e a beleza depois dos 30 (Amanda nasceu em 3 de dezembro de 1985)?
Eu não tinha encarado os 30 como um divisor de águas, como um grande acontecimento, até o dia em que eles aconteceram! De repente eu entendi o significado de um marco na vida e, diante dele, senti que certas coisas deveriam começar a mudar: eu não tinha escolha se não me despir de coisas que já não me serviam mais. Estou falando principalmente de inseguranças ligadas à infância que não faziam mais sentido de serem carregadas por uma mulher adulta. Ainda tenho questões com meu corpo que, juro, preferia não dar a menor bola, mais ainda dou demais! Eu precisava e ainda preciso me aceitar como eu sou e entender o desafio de abraçar a impermanência.
Como se sente sobre quando se enxerga refletida no espelho?
Gosto muito mais de mim hoje do que aos 25. Não posso prever ainda se ficarei confortável com as rugas e as verrugas, mas hoje entendo que beleza e sabedoria ambas têm seu preço. Nenhuma delas vêm de graça.
Que impacto Paris e Ricardo Tisci (estilista da Givenchy) tiveram no seu modo de viver a vida e de lidar com a própria imagem?
Ah, eu aprendi demais com Ricardo. Acho que a primeira lição foi “se é transparente, é ótimo”! Eu me lembro exatamente de estar no meu primeiro desfile Givenchy e na passarela começaram a entrar em sequência modelos com saias longas de tule e de renda. Não víamos os seios nem a bunda, então entendi que se essas partes não estão expostas, a transparência é bela. Na verdade, a maior mensagem dele para mim foi a de que eu posso ousar, correr riscos. É algo enorme para mim. Mas hoje, se ele disser, experimente, eu experimento, mesmo se for além do que eu imaginaria possível em termos de roupa.
Além da sua avó com ícone de estilo, há alguém em Hollywood que te inspire?
Cate Blanchett. Eu não a conheço, não sei quais são as suas ideias ou sua postura de vida, mas admiro imensamente sua discrição. Não sabemos nada sobre sua vida privada e eu acho isso incrível. E ela está sempre bela no tapete vermelho.
O tapete vermelho é um lugar no qual você gosta de pisar?
Meu deus, não! Detesto premiações. É um circo! Tem muita politicagem, muita pressão, muito desequilíbrio entre a profissão e o sentido de estar ali naquela noite (Amanda abaixa a cabeça e cutuca as unhas da mão direita, pintadas com esmalte branco transparente). É fácil perder a cabeça nesse meio, esquecer o trabalho do ator. Não quero dar a ideia errada: ser nomeada ao Oscar é um grande reconhecimento da categoria, mas, puxa, quanta frustação existe no jogo que se passa nos bastidores.
Mas ao menos você está entre alguns bons colegas, todos (quase sempre) bem vestidos.
Mas mesmo depois de tantos anos de Hollywood, eu não me acostumo. Na verdade, eu não gosto mesmo da vida mundana, das grandes ocasiões sociais. Até meu próprio aniversário me estressa, (fuck)! Cumprimentar todo mundo, saber se tudo está correndo bem… Nunca fui festeira. Prefiro muito mais ficar em casa, de moletom, sem maquiagem, fazendo crochê na companhia da minha irmã e do meu cunhado.
Como você se desestressa?
Eu me dei de presente uma casa em Stone Ridge, no estado de Nova York. Eu mesma decorei cada cantinho. É lá que mora meu coração e é para lá que eu corro sempre que possível.
Depois de tantos tempo de Hollywood, o que você gostaria de fazer ainda no cinema?
Adoro Pedro Almodóvar. Especialmente Tudo sobre minha mãe. Mas ele tem Penélope Cruz e é tão maravilhoso assisti-la nos filmes dele!
Você adora comédia — e, como se vê, até humor negro. Pode nos contar uma piada?
Sou do tipo que nunca se lembra de uma piada na boa hora e quando coloca a cabeça no travesseiro, pronto!, três aparecem na cabeça. Mas eu tenho uma charada: o que é preto quando se compra, vermelho quando se usa e branco quando se joga fora?
(…)
Eu adoro porque levei vinte minutos para descobrira resposta — e é a única charada que eu consegui decifrar. Vocês também vão conseguir. Se não, procurem no google. (*)
(*) A resposta é carvão.