As madrastas de Cinderela, Branca de Neve e João e Maria pertencem a uma classe de mulheres malvadas com apetite voraz, dispostas a fazer tudo para conquistar aquilo que desejam. Longe dos contos de fadas, o estigma associado a essa figura ainda está presente ‒ livros, séries e novelas não deixam negar. A realidade, porém, pode ser bem diferente, a partir da criação de um vínculo afetuoso na família.
“Quando oficializamos o relacionamento, em 2010, meu marido conversou com minha enteada sobre mim. Combinamos de nos conhecer e, desde então, passei a sentir um amor muito grande por ela”, afirma a nutricionista Luana Nascimento. Ela conta também que no início ficava receosa da criança não gostar dela. “Eu tinha medo da palavra madrasta.”
As famílias mosaico são formadas por um pai e uma mãe que pertenciam a outro relacionamento e são divorciados, separados, ou oriundos da destituição da união estável. Em 2021, o número de divórcios aumentou cerca de 4% comparado com o ano anterior, de acordo com o Colégio Notarial do Brasil, o que contribui para o crescimento desse tipo de estrutura familiar. Falar sobre elas e pensar em formas de desenvolver isso da melhor maneira possível é sempre importante.
Os julgamentos de quem está ao redor, entretanto, aparecem. “Muitas pessoas agem como se eu quisesse ocupar o lugar da mãe dela, o que não é verdade”, pontua Luana, que ainda diz “eu sempre achei importante ter uma boa relação com as duas porque sei que vamos participar da vida uma da outra, então me machucava alguns comentários, que normalmente eram feitos por pessoas que sequer nos conheciam direito.”
A sociedade estimula a competição feminina e estabelece que uma nova mulher na vida de um homem com filho não é o certo. Essa premissa, porém, traz malefícios para o âmbito familiar, especialmente para as crianças. “Somos vistas como bruxas, malvadas. Começamos o relacionamento pagando caro pela ideia de que estamos competindo com a mãe da criança, que no final é a maior prejudicada.”
Segundo a psicóloga de famílias Mariana Azevedo, a dinâmica familiar com a participação de companheiros que não são os pais pode ser saudável. “Basta todos estarem dispostos a construir isso.” O papel dos adultos, aqui, é fundamental, pois eles são os responsáveis por dar segurança à criança ou ao adolescente.
Outro fator necessário para o bom andamento desse processo são os limites, que devem ser estabelecidos em uma conversa entre os envolvidos. “Os pais precisam estar de acordo sobre até que ponto vai as interferências dessa terceira pessoa na criação dos filhos, por exemplo, além de regras entre a própria família serem pensadas. A madrasta também necessita de um espaço de escuta para falar sobre seu papel e o que deseja ou não fazer”, aconselha Mariana. Caso precisem de uma visão de fora, a terapia familiar pode ser o caminho.
Também é necessário não culpar seu enteado. “No começo, pode ser confuso para a criança, mas com o tempo você pode passar a confiança que ele precisa para que entenda sua intenção com aquele vínculo e saiba que você não está ocupando o lugar de outra pessoa”, esclarece a especialista.
Para Mariana, é possível que um laço amoroso de muita amizade entre madrasta e enteada também não se desenvolva. “Cada pessoa tem sua personalidade e nem sempre há uma grande proximidade. O importante, em todos os casos, é o respeito mútuo. Quem quiser aprofundar a dinâmica pode recorrer a uma terapia”, termina ela.