Quase todo sábado vejo uma mesma cena: a minha avó, sentadinha no sofá, empolgada em ver a neta e o bisneto chegarem juntos na casa dela. Aos 95 anos, miudinha, reclama do novo andador enquanto está sintonizada na TV e em tudo mais o que acontece à sua volta. Lúcida! Sábia! Resiliente! Outro dia, com seu carregado sotaque mineiro, tentou dizer em voz alta: “Pensa em tudo o que já fiz, nossenhora”. Nesse momento, me lembrei do meu pai e das minhas três tias contando com brilho nos olhos sobre como ela se dedicou ao trabalho de cuidar da família. Me pus a pensar, então, sobre como era a rotina de uma mãe de crianças e adolescentes por volta dos anos 1960. Você já para pensar quanto gasta com as crianças, versus estes custos no passado?
A comparação com este século, em que estamos agora, me deu um nó na cabeça. Enquanto vovó, com o controle remoto em mãos, alternava entre assistir o Terço de Aparecida e Largados e Pelados, iniciei mentalmente uma lista de gastos que deveriam fazer parte do orçamento doméstico do passado.
Ensino? Todos se formaram em renomadas escolas públicas. Colônia de férias? A meninada ocupava a rua. Brinquedos? Natureza. Escolinha de futebol? Qualquer lugar público com dois chinelos fazendo as vezes de trave já era o suficiente. Atividades extracurriculares? “Rouba bandeira” e “queimada” eram as coisas mais divertidas para se fazer após a aula. Eletrônicos? Rádio ou TV na hora da novela, do noticiário e do futebol.
E quem cuidava dessa criançada, gente? A tia, a prima, a vizinha, as amigas da igreja, o dono da mercearia… Plano de saúde? Com o celular em mãos, até “dei um Google” para descobrir quando a tradicional Unimed foi fundada. Resposta da busca: 1975. Hum, seguimos. Terapia? Claro que não! Aparelho invisível para os dentes? Menos ainda. Roupas? Certamente muito menos do que agora.
É… no tempo dos nossos avós, talvez de nossos pais, a planilha de gastos com os filhos era bem diferente. As últimas férias escolares evidenciaram que o cuidado com os pequenos é mesmo uma grande responsabilidade, muitas vezes solitária e não mais coletiva, um desafio gigante diante de um contexto social e econômico centrado no papel dos pais — ou apenas da mãe, é preciso dizer.
Diferentes institutos de pesquisa têm divulgado dados que apontam retrocessos sobre a condição financeira das mulheres e, consequentemente, de sua autonomia.
“Creches ficam mais caras, dificultam o trabalho de mulheres e limitam toda a economia”, dizia o título de uma matéria de jornal de uma segunda-feira qualquer. O levantamento da ECA International apontou que a alta dos custos de cuidados infantis no mundo é um dos fatores que tira 10% do PIB global, graças à menor participação feminina no mercado de trabalho.
Segundo a Bloomberg Economics, estima-se que a economia perde US$ 237 bilhões por ano nos Estados Unidos e € 242 bilhões na União Europeia em razão da redução das cargas de trabalho das mulheres para cuidar dos filhos.
Para não trabalhar apenas para pagar escola, muitas mulheres estão optando por reduzir a carga horária, renunciar a promoções ou até mesmo desistir de tudo e ficar em casa.
Também por razões econômicas e patriarcais, estão sendo “escolhidas” para cuidar dos idosos, já que manter um profissional nessa função é tão caro ou mais caro do que um salário.
Agora é assim: toda vez que aguardo a água ferver para passar o café no coador de pano na casa da vovó, me pego refletindo sobre a evolução das responsabilidades e dos custos associados ao cuidado dos filhos e de todos.
E como isso dita o dia a dia das mulheres e de toda a sociedade. É crucial reconhecer os desafios contemporâneos — e a pressão financeira certamente é um deles.