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O escritor Stefano Volp mostra o poder da vulnerabilidade pela literatura

O autor do livro "Homens Pretos (Não) Choram" apostou no empreendedorismo literário como sobrevivência e hoje colhe os frutos de acreditar no coletivo

Por Ana Carolina Pinheiro Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO
Atualizado em 20 abr 2021, 15h59 - Publicado em 19 abr 2021, 14h00
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 (Foto: Carolina Agyar (direção de arte e styling) e Victor Vieira (fotógrafo)/Divulgação)
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A mensagem “Ninguém solta a mão de ninguém”, viralizada como um grito de resistência após a eleição do presidente Jair Bolsonaro (sem partido), impulsionou o escritor, roteirista e músico Stefano Volp, de 30 anos, a tirar, ou melhor, colocar no papel, o sonho de escrever seu quarto livro, Homens Pretos (Não) Choram.

“Queria muito contar histórias que estavam dentro de mim, mas fazer um livro no Brasil não é barato, ainda mais com a pandemia, que chegou e deixou todo mundo mais ferrado. Pensei: ‘Vamos testar essa máxima da coletividade’. Felizmente, muitas pessoas me deram a mão”, diz ele, que bancou a produção com um financiamento coletivo. Recomendada por personalidades como a filósofa Djamila Ribeiro e o rapper Emicida, a obra tem sete crônicas protagonizadas por meninos e homens negros que se deparam com seus próprios sentimentos.

A aproximação do autor com a temática da masculinidade negra nasceu na primeira sessão de terapia, há três anos. De lá pra cá, a missão de abraçar suas vulnerabilidades se intensificou, principalmente com a solidão do isolamento social em seu apartamento, no Rio de Janeiro.

“O mundo fala muito alto e, de repente, se calou. Nesse silêncio, comecei a me ouvir mais e me apavorei, mas entendi que precisava falar e assumir essas fragilidades como um homem negro”, revela o filho da Dona Sueli, professora da rede pública. O ambiente familiar majoritariamente feminino, segundo ele, explica o elo que une as crônicas no livro: a sensibilidade dos detalhes.

Às vezes, o choro dói. Mas, depois que a gente coloca pra fora, vem um alívio”

A permissão para o afeto, que observava nas irmãs e na mãe, era inexistente diante da figura do pai, que faleceu em dezembro passado. Volp nunca viu uma lágrima escorrer no rosto de Seu Israel. “Minha mãe conta que a única vez que ele chorou foi no hospital, porque não queria morrer ali, e sim em casa. No fim, aconteceu como ele queria, deitado e com a Bíblia do lado. Ele foi muito ausente, mas a gente se entendeu”, revela. Volp lamenta que não tenha dado tempo do pai ver a repercussão que seu trabalho tomou.

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Assim como o escritor, todos os personagens do livro passam por transformações, começando por Heleno, um homem preto que está em seus últimos dias de vida e pede ajuda aos filhos para lembrar a última vez que chorou, algo que nunca aconteceu. Nas últimas páginas, encontramos Renatinho, um menino de 8 anos que perde a fala ao sofrer opressão na escola e no lar. Violência doméstica, homossexualidade e preterimento também são debatidos.

Apesar de sentir resistência do público masculino, nas leitoras o autor encontra escuta ativa para sua mensagem. Mães, filhas, companheiras o procuram na tentativa de dissolver essas barreiras impostas a homens e meninos afrodescendentes. “É triste, porque elas buscam também entender o que elas podem ter feito de errado”, lamenta, ressaltando a culpa que acompanha a existência feminina.

Segundo Volp, a maior provocação do livro é mostrar que existem arquétipos que restringem o homem negro na sociedade. O enfrentamento disso, para ele, se dá no confronto dessa estrutura machista e racista. “Será que o que eu espero de um cara com quem me relaciono passa por essa visão estereotipada? Será que meu pai foi ausente e desprovido de emoções por causa de dores desconhecidas? Será que ele sabe que é assim e que pode viver de uma maneira diferente? Às vezes, ninguém disse isso pra ele.”

Rumo às prateleiras

Mergulhar nos livros sempre foi um movimento natural para Volp, que cresceu em Duque de Caxias, na Baixada Fluminense. “A educação e a leitura me salvaram e me mostraram outro caminho de vida. Vi amigos se perderem”, lembra o escritor, que foi aluno de cursinho popular e levou sete anos para concluir a faculdade de jornalismo por questões financeiras.

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Seu terceiro livro, O Segredo das Larvas (compre aqui), de 2019, se tornou uma das distopias nacionais mais vendidas no Brasil pela Amazon. Após quatro lançamentos de forma independente, neste ano, o autor assinou contrato com a Harper Collins, por onde lançará um thriller psicológico ainda sem nome. O protagonista, um jovem negro bissexual, investigará o assassinato do melhor amigo.

A preocupação com as possíveis restrições ligadas ao seu trabalho aumentou ano passado, na fatídica ação do Blackout Tuesday (em português, terça-feira preta). Para quem não se lembra, após a morte de George Floyd, homem negro sufocado até a morte por policiais nos Estados Unidos, rádios estadunidenses escolheram o dia 2 de junho para interromper sua programação como forma de endossar as manifestações antirracistas. Na internet, o movimento foi adaptado com a publicação de um quadrado preto nas redes sociais.

A onda gerou o compartilhamento do trabalho de diversos profissionais pretos, como o de Volp. “Brinco que o racismo acabou ali. Aproveitei que as pessoas começaram a descobrir minha obra para criar um negócio novo, o Clube da Caixa Preta. É antirracista? Então, está aqui um projeto para você apoiar”, instiga. Com curadoria do escritor, o clube de assinaturas traz contos de todas as temáticas, sempre escritos por autores negros.

Com gosto e necessidade por empreender, o escritor abriu mais um CNPJ ao fundar a Editora Escureceu, em 2020. A proposta surgiu para resgatar clássicos escritos por pessoas negras nos últimos séculos. Os livros estão em domínio público, mas esquecidos no tempo. Não Tão Branca, uma obra da romancista e educadora americana Jessie Fauset, foi o primeiro lançamento do selo, que aconteceu também por financiamento coletivo.

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“Abrimos a campanha explicando a história da autora, que retrata o movimento do passing. Era quando negros de pele clara se passavam por brancos para fugir da escravidão. A campanha bateu 160% de apoio”, explica o fundador, que construiu um quadro de funcionários formado exclusivamente por negros. O lançamento da editora para este semestre será Clara dos Anjos, de Lima Barreto.

Longe das narrativas romantizadas e meritocráticas, Stefano Volp reconhece que fez de 2020, um ano de adversidade mundial, uma limonada. O desalinho individual foi exposto propositalmente por meio da literatura a fim de uma conexão coletiva. “Estamos em um momento frágil e o descaso do governo diante dessas situações é uma violência tremenda, mas temos que resistir como dá. O meu trabalho e os nossos corpos são um ato político. Identificar-se na fraqueza gera força para a transformação que precisamos. ”

Em tempos de isolamento, não se cobre tanto a ser produtiva

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