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Novo álbum de Fernanda Takai é pura doçura em meio ao caos

"Será Que Você Vai Acreditar?" reflete sobre problemas políticos e sociais, mas sem perder a ternura. CLAUDIA conversou com a artista sobre o novo trabalho

Por Júlia Warken
Atualizado em 21 set 2020, 10h24 - Publicado em 10 jul 2020, 17h46
 (Fabiana Figueiredo/Divulgação)
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Fernanda Takai lança nessa sexta-feira (10) o álbum Será Que Você Vai Acreditar?, gravado durante a pandemia no estúdio que a cantora tem em casa. Ele é composto por dez faixas e títulos como Terra Plana e Amor Nos Tempos do Cólera dão pistas de que o disco faz alusão ao cenário sócio-político dos últimos anos. Isso fica ainda mais claro em Corações Vazios, na qual canta estrofes como “você pode insistir que o mundo é dos espertos e que agora é a vez da santa estupidez”. 

Fernanda confirma essa intenção por trás das faixas e se mostra surpresa com o fato de que algumas letras acabaram dialogando muito bem com a própria pandemia. “Corações Vazios é uma das canções mais novas do disco e ela tá vindo ‘pandêmica’, porque tá falando justamente dessa coisa desprotegida que a gente tá vendo. As pessoas com sede, a fome doendo. E quando isso acontece, quando as pessoas estão vulneráveis, não tem limite, tudo de pior pode acontecer. E isso é muito por conta de gente incompetente que teria que estar dando rumos ao país. A gente está numa nau desgovernada, com vários ministros que mais parecem inimigos de suas pastas e um presidente muito irresponsável. Eu acho que vem toda essa atualidade nas músicas, mas vem também essa sensação do nosso país, já há alguns anos, dando ré em vários conceitos”.

Fernanda Takai – Será que você vai acreditar (álbum)
(Fernanda Takai/Divulgação)

Seguindo essa linha de reflexão, a artista também fala da mensagem por trás do título do álbum – Será Que Você Vai Acreditar?. “Foi acreditando em tanta mentira que a gente parou no tempo e estamos retrocedendo. Eu acho que a arte acaba refletindo esse momento e a leitura das canções fica mais forte ainda quando você pensa na conjuntura de política e saúde e essa vulnerabilidade enorme que há hoje no Brasil”.

Outra faixa que acabou tendo uma ligação inesperada com a pandemia é Não Esqueça, talvez a mais emocionante do álbum. A canção é como uma carta de uma mãe ou um pai à filha. “Não esqueça de lavar as mãos”, diz a letra, junto com outros conselhos – o que soa mais atual do que nunca. Não Esqueça leva a assinatura de um grande amigo de Fernanda, o artista gaúcho Nico Nicolaiewsky. “Foi composta há uns seis ou sete anos e ele fez essa música para a filha dele, que também se chama Nina [como a filha de Fernanda]”, conta. Nico morreu em 2014, antes de lançar oficialmente a música, e Fernanda se emocionou muito ao descobri-la em uma gravação caseira do amigo. Nascia assim uma linda homenagem.

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No álbum, Não Esqueça vem logo após Terra Plana – essa sim composta especialmente para a Nina que é filha de Fernanda e do marido John Ulhoa. Foi John quem escreveu a música como presente de aniversário à filha – que completou 16 anos em outubro do ano passado. Quanto à flagrante alfinetada nos terraplanistas, Fernanda conta um fato curioso. “Ela é um tapa de luva nos terraplanistas, porque até eles podem cantar a música. Imagina a volta que o mundo deu… alguns acham que é uma defesa da terra plana. Completamente não, né”, diverte-se.

Por vezes pessimista (como na música Não Creio Em Mais Nada), noutros momentos esperançosa, dando conselhos, e até mesmo irônica (vide o tapa de luva), as reflexões sócio-políticas de Fernanda em Será Que Você Vai Acreditar? são sempre permeadas pela doçura característica de sua voz. “Mesmo na situação difícil que se vive, dá para transformar a tristeza e a melancolia em beleza. Acho que tinha que ser assim. Eu não quero que as pessoas fiquem tristes, quero que elas descomprimam. Estamos todos sentindo uma angústia, estamos vendo o tempo passar. E aí? Como é que a gente vai fazer daqui para frente? Ele [o álbum] tem que tocar no assunto, mas tem que dar um pouco de esperança. Tem que fazer um carinho, né?”.

Mas o álbum também tem outras particularidades. Há dois covers internacionais: One Day in Your Life, eternizada na voz de Michael Jackson e Love is a Losing Game, de Amy Winehouse. Fernanda se diz muito fã de ambos os artistas, em especial de Michael – cuja música Ben ela gravou no disco Luz Negra, de 2009. E o novo trabalho da mineira conta ainda com duas participações muito especiais de fora do Brasil. A japonesa Maki Nomiya empresta a voz para Love Song – de longe a canção mais alegre do álbum – e, diretamente de Toulouse, a franco-brasileira Virginie Boutaud aparece na faixa Amor nos Tempos do Cólera.

Maki é vocalista do Pizzicato Five, banda que teve grande influência no Pato Fu, segundo Fernanda. “Eu tenho ido a cada dois anos ao Japão para fazer shows, e a gente sempre se encontra – pra jantar ou ela dá uma palhinha no show. Acabamos desenvolvendo uma relação afetuosa”, conta. Virginie era vocalista da banda Metrô, nos anos 1980, e também teve influência na trajetória de Fernanda. “Quando eu estava começando, com minha banda de colégio, eu tocava músicas da banda dela. [Recentemente], a gente começou a se falar pelo Instagram”.

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Fernanda Takai
(Dudi Polonis/Divulgação)

Quando perguntada sobre qual é sua faixa favorita do novo disco, Fernanda cita uma outra parceria, com o poeta piauiense Climério Ferreira. São dele os versos de O Que Ninguém Diz – uma das músicas mais bem humoradas do álbum. “Eu já tinha usado os versos dele numa outra canção, que se chama Quase Desatento. É muito curioso como a gente trabalha, porque, durante muito tempo, ele fica me mandando versinhos – de três linhas mais ou menos. Eu vou guardando os versinhos e aí, quando eu vou ver, eles têm uma espécie de sequência. Eu começo a mudar de ordem e construo a letra a partir desses versos soltos”, explica.

Essa é primeira vez que Fernanda apresenta um álbum de maneira totalmente digital. O CD e o vinil só vão sair quando a fabricação, feita em Manaus, for retomada. Será Que Você Vai Acreditar? foi gravado durante a pandemia no estúdio que ela e John tem em casa, em Belo Horizonte. A artista conta que o lançamento acabou saindo antes do previsto, pois, longe dos palcos, o casal teve mais tempo para se dedicar – John produziu e mixou o álbum. Segundo Fernanda, só os dois trabalharam presencialmente no estúdio, por conta na pandemia.

“Foi terapêutico para mim e para o John. Foi bom acordar todo dia e ter esse objetivo de terminar o disco, mostrar que você consegue produzir mesmo numa situação dessas. E entregar o disco para quem gosta de me ouvir, num momento como esse, é mais um jeito de eu cumprir o meu papel de criar arte e de produzir conteúdo. E a arte realmente tem salvado os dias e as noites de muita gente – através de livros, séries, lives. Então eu acho que é um jeito de eu entregar uma coleção de músicas que as pessoas vão conhecer agora e podem acabar usando para descomprimir dessa situação de confinamento”.

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