Após comandar filmes religiosos bem-sucedidos como Nosso Lar e Kardec, o diretor Wagner de Assis volta a explorar temáticas kardecistas e espiritualistas em Ninguém é de Ninguém, estrelado por Carol Castro, Danton Mello, Rocco Pitanga e Paloma Bernardi. Porém, ao invés de concentrar os esforços em abordar e divulgar conceitos espíritas — como costuma fazer —, o cineasta optou por evidenciar conflitos humanos, que independem de dogmas ou correntes espirituais.
O resultado é uma experiência que, por mais que soe propagandista em certos momentos, consegue encontrar fôlego para se conectar com os mais variados tipos de público, independente de suas crenças.
O enredo de Ninguém é de Ninguém
Para isso, ele adaptou o livro homônimo de Zibia Gasparetto, que aborda um relacionamento tóxico entre o casal Gabriela (Castro) e Roberto (Mello). Ambos têm filhos e vivem uma rotina aparentemente saudável, até o momento em que o marido perde o emprego e a esposa recebe uma promoção.
Enciumado pelas conquistas da parceira, ele une forças com Gioconda (Bernardi), esposa do chefe de Gabriela (Pitanga), para fazê-la ser demitida da empresa em que acabou de ser promovida. Todo esse plano “maquiavélico” é movido por três pilares: possessividade, obsessão e ciúmes, sentimentos que acabam sendo as engrenagens centrais do roteiro. Tudo gira em torno destes tópicos.
O resultado, apesar de soar um pouco desordenado, é predominantemente efetivo e relevante. Inúmeras situações clássicas de relacionamentos abusivos são retratadas em cenas carregadas de extrema crueza e honestidade, o que torna a mensagem da produção ainda mais potente. E, claro, a sensação de estar assistindo a algo autêntico é proporcionada pela excelente performance de Carol Castro que, sem sombra de dúvidas, carrega o longa nas costas.
Aqui, não estamos menosprezando o trabalho de seus outros colegas de elenco, como Danton Mello ou Rocco Pitanga. Todos entregam um ótimo trabalho. Porém, a quantidade de nuances entregues por Castro faz com que nós, espectadores, consigamos nos engajar e nos conectar com a trajetória de Gabriela sem grandes esforços.
Tom novelesco acaba suavizando o filme de forma positiva
Há momentos em que o tom da narrativa assume um caráter quase “novelesco”, com constantes reviravoltas e revelações dramáticas exageradas. Contudo, essa pegada “soap opera”, na maioria das vezes, traz uma leveza e dinamismo extremamente bem-vindos à experiência.
Aliás, o equilíbrio entre a leveza e a seriedade, e a alternância entre essas duas atmosferas, é o que salva “Ninguém é de Ninguém” de cair num emaranhado de diálogos expositivos que, ora servem como uma propaganda religiosa, ora tentam garantir que o público compreenda a mensagem principal à qualquer custo.
Que fique claro: o novo projeto de Wagner de Assis está longe de ser ótimo ou uma vivência indispensável. Todavia, ao desviar de sua abordagem predominantemente dogmática, o diretor cria uma trama universal o suficiente para furar a bolha de um subgênero que, frequentemente, tende a ser pouco inventivo.
“Ninguém é de Ninguém” chega nesta quinta-feira aos cinemas nacionais.