Majur fala sobre novo álbum, autoconfiança e legado social
Lançado no início deste mês, novo álbum de Majur marca uma nova (e animadora) fase da cantora, incluindo participações de Ivete Sangalo e Xamã
No início deste mês, Majur lançou o seu novo álbum de estúdio: Arrisca. Mesclando inúmeros gêneros musicais, do afrobeat ao blues, a cantora busca evidenciar as inúmeras transformações e reinvenções pelas quais passou enquanto mulher e artista. E em entrevista exclusiva à CLAUDIA, a performer revelou um pouco mais sobre este processo criativo que promete potencializar e transmitir as suas mensagens para um público ainda maior. Confira:
CLAUDIA: Como você definiria a sua evolução desde o primeiro disco até este projeto mais recente?
Majur: O ‘Ojunifé’ marca um processo muito importante de encontro comigo mesma. Eu estava tentando entender quem era a Majur. E para fazer isso, precisei aprofundar em minha identidade. Então esse primeiro álbum carrega o poder de me fazer mergulhar nos lugares mais secretos, trazendo a verdade à tona. Eu sinto que, de lá para cá, tudo o que aconteceu em minha vida, enquanto cantora, artista e mulher, todas as minhas transformações e transições, estão refletidas neste novo disco. Arrisca sou eu mostrando as minhas conquistas. Mas é uma celebração não apenas do que aconteceu comigo, mas também no Brasil, especialmente no campo feminino. Sinto um grande orgulho de ser referência para tanta gente, e com esse trabalho inédito, quero dizer para as pessoas: ‘Tenham coragem. Garotas, garotos e garotes: arrisquem, é tudo ou nada. Enquanto estivermos vivos, é o momento certo para fazer tudo acontecer e ser feliz’.
CLAUDIA: Quais foram as suas maiores influências na criação das novas faixas?
Majur: Precisei buscar muitas coisas para criar cada faixa. Uma parte veio de Salvador e de minhas raízes. Em duas músicas, Momento de Cheiro e Onde For, eu trago especificamente essa energia baiana, aquele swing do axé music. Delírios e Vibes já vai para um R&B, tem um jogo de voz, eu faço um rap, e trago esse som mais sensual. Também brinco com o pop num movimento de acessar aquelas pessoas que antes eu não acessava através de um disco completamente regional. Mas, agora, quero abrir esse campo para o Brasil e o mundo. Estudo música desde os cinco anos de idade, então existe uma qualidade vasta de estilos e formas que eu posso cantar e performar no palco. Com esse novo álbum, estou entregando isso.
CLAUDIA: Há alguma canção específica deste novo álbum que tenha um lugar especial em seu coração?
Majur: Seu Amor é muito especial, pois é a música do meu casamento. As pessoas não viram, mas eu cantei essa canção para Amazonas [marido e coreógrafo de Majur] no dia da cerimônia.
CLAUDIA: E qual foi a canção mais difícil de desenvolver, em termos de produção e composição?
Majur: Pimenta de Cheiro, de longe. Ela tem muitos sons – sopro, percussão, bateria e vários instrumentos específicos que fomos entendendo e construindo até chegar ao resultado final. Foi um processo longo entre iniciar a produção e apresentar a música para a Veveta cantar.
CLAUDIA: Como as suas vivências enquanto mulher trans atravessam o seu trabalho?
Majur: O meu corpo é político, então a minha vivência enquanto mulher trans atravessa tudo. A partir do momento que eu saio de manhã, num horário que as travestis não conseguem andar livremente, eu já estou construindo e atravessando tudo. Imagine então eu subir num palco e cantar para milhares de pessoas, ser filmada e divulgada através de uma televisão ou revista. Todos os meus movimentos são transgressores, transformadores e futuristas. Eu sou uma cantora e pessoa afrofuturista, especialmente por ser uma mulher trans e negra no Brasil.
CLAUDIA: A música te ajudou a criar um senso de confiança e autoestima ao longo de sua vida? Como?
Majur: A música foi capaz de me transformar como ser. É a minha mãe, é a minha deusa, é quem me fez pensar sobre quem eu era e me transformar em quem eu sou de verdade. E hoje, me possibilita viver os meus sonhos, construir um legado para a minha família e para o Brasil inteiro. Eu tenho o maior orgulho de ser musicista e cantora. É muito foda quando a música consegue nos transformar e nos usar para transformar o mundo. Me sinto feliz e útil.
CLAUDIA: Qual impacto e legado você deseja deixar para as próximas gerações?
Majur: Meninas e meninos trans, menines, pessoas pretas do Brasil e do mundo inteiro: podemos tudo o que quisermos. E não adianta, o mundo pode dizer que não podemos, mas estou aqui para dizer: só nós somos capazes de fazer e construir os nossos caminhos. Se uma porta se fechar aqui, outra irá se abrir em outro lugar. O mundo não é apenas onde estamos vivendo; ele é muito maior do que imaginamos. A cidade que você está não equivale ao seu tamanho. O próprio Brasil pode não ser grande o suficiente para você. Somos 7 bilhões de pessoas no mundo: existem milhares de oportunidades. Nunca pense que é o fim, pois sempre existirá uma saída. Somos capazes de transformar todas essas saídas em possibilidades de existir, coexistir, expandir e se multiplicar.