O mundo da música é um lugar de representação e não é apenas a voz que chega de forma marcante em alguns novos artistas.
Kynnie Williams tem 27 anos, é moradora de Macaé e desde muito nova o talento pra música foi percebido por seus pais. “Quando eu tinha uns dois anos, me escondia dentro de caixas de papelão, fechava lá dentro e cantava dentro da caixa, depois eu levantava pra poder escutar a diferença da acústica”, recorda.
A sensibilidade musical não era exatamente uma surpresa para a família, já que seu pai era músico, mas precisou se dedicar à carreira de geofísico, sem deixar a música de lado. “‘Feminina‘ era uma música que meu pai cantava muito. Fui crescendo e entendendo o que era ser mulher dentro de um país tão machista através da música”, explica a cantora.
Kynnie é a mistura de todas as suas referências musicais em uma pessoa só. Ela mistura estilos musicais como o R&B, Soul e Jazz com o Pop, e se inspira em artistas como Beyoncé, Iza, Gilberto Gil, e seus amigos do selo musical Inbraza, da Som Livre. “Eu somo tudo isso e entendo o que significa pra mim e faço minha própria essência”.
Seu pai também era compositor, e Kynnie cantava algumas das letras escritas por ele. “Tinha uma música que meu pai compôs e ele não conseguia alcançar uma parte dela, e então ele pediu pra eu cantar”, lembra. Em 2011, seu pai se inscreveu no SESI Música, mas não pode competir. Logo, Kynnie foi em seu lugar.
A confirmação de que era nos palcos que sua vida profissional seguiria, aconteceu depois de um convite do SESI para fazer um show só dela. “No início achei uma loucura, mas eles insistiram, então aceitei. Escolhi algumas músicas da época, e performei meu primeiro show. Ali percebi que nasci e gostava de fazer aquilo”.
Seu primeiro single é carregado de amor próprio
Seu primeiro lançamento foi o single “Simples Assim”, que surgiu depois de sua participação no programa musical The Voice Brasil, e Kynnie sentiu que precisava lançar algo autoral, mas que falasse principalmente, quem ela é.
A música é a junção de diferentes estilos musicais, além de muita personalidade e presença da cantora, que já somam mais 400 mil visualizações no Youtube. “A música surgiu de um pós termino, então é um grito de amor próprio. Começar com essa mensagem, referência de clipe, com uma equipe majoritariamente negra que pra mim é muito importante”, argumenta.
Vale ressaltar que a equipe que trabalhou no clipe da música é majoritariamente preta, algo que a cantora preza em todos os seus trabalhos. Seu objetivo além de se tornar referência para outras pessoas, é que quem atua ao seu lado também seja. “Começar com essa mensagem, referência de clipe, levar essa mensagem para entendermos que podemos chegar lá é muito importante”, explica.
Linda, Chique, sexy e braba!
A construção da autoestima da mulher negra é um processo que somente elas entendem a profundidade. Kynnie conta que, a palavra “linda”, por exemplo, quase nunca esteve presente em sua vida. “Amadureci e me reconheci como uma bonita tardiamente, com 23 anos, depois de um relacionamento. Eu precisava entender que eu era uma mulher bonita, que eu poderia ser bonita do jeito que eu era”, conta.
Assim como muitas, ela não se sentia representada em revistas ou na televisão. Essa movimentação interna começou, e um grande resultado surgiu. O Single “Linda, Chique, Sexy e Braba“, foi lançado no dia 19 de novembro, e é a materialização do que ela aprendeu a ser, e o que ela precisa lembrar todos os dias.
“Óbvio que vai ter dias que eu vou acordar odiando meu corpo, me achando horrorosa, porque boa parte da minha vida as pessoas me disseram isso”, diz a cantora. “Por muito tempo não aceitei minhas características negroides, odiando meus lábios, meu nariz, e hoje em dia eu entendo que tudo isso faz parte da minha ancestralidade e do meu sangue”.
A música é considerada por Kynnie seu entendimento de que sempre teve muita força, talento. “É um grito interno de que as pessoas não vão me parar, que já me pararam por tantas vezes e me diziam que eu não iria conseguir. Com ela, eu quero dizer para as outras pessoas que elas também vão conseguir, todos os dias que olho, canto ou escuto a musica, eu lembro o quanto eu sou linda, chique, sexy e braba”.
“Chique”, é no sentido literal
Além da voz e da beleza que a cantora carrega, uma outra característica chama muito atenção – seu estilo, único e notável, que não deixa Kynnie passar despercebida.
Suas inspirações para compor seus looks são filmes, séries e músicas de época, como “Um Príncipe em Nova Iorque” e “Um Maluco no Pedaço”. “Tudo o que é mais retrô eu me inspiro, eu amo essas composições que eu consigo me ver, principalmente porque são pessoa negras”.
Ela junta o antigo com o novo, e transforma suas roupas em explosões de cores e originalidade. Ela revela que as roupas de brechó também são peças chaves. “Vejo o que combina comigo, o que se assemelha, e vou colocando, não tenho necessariamente uma marca, de repente vai ser uma coisa que passou na mão de milhares de pessoas até chegar a minha”.
“Beyoncé disse uma vez que ela é uma lenda em construção, então eu sinto que também quero ser uma lenda em construção. Ser alguém que as pessoas vão lembrar daqui uns 15, 20 anos, que gerações vão entender e falar com uma figura simbólica dentro da musica brasileira”, diz a cantora.
Trilhando seu caminho sabendo exatamente quem é, e construindo novas narrativas, Kynnie deseja ir ainda mais longe. “Eu superei muita coisa, eu persisti. Me acho uma pessoa muito persistente, quero ir muito mais longe, construindo tudo aquilo que já sonhei”.