105 anos de Clarice Lispector: como a autora virou ícone da Geração Z?
Mesmo 48 anos após sua morte, os títulos da escritora alcançaram o marco dos mais vendidos em 2025
Neste mesmo dia (10), nos anos 20, nascia uma das autoras mais vendidas de 2025. Clarice Lispector conquistou o feito raro de atravessar as barreiras do tempo, consolidando-se como um sucesso absoluto entre diferentes públicos — dos jovens das gerações Z e Alpha até estrelas hollywoodianas mais maduras, como a atriz Cate Blanchett.
Quando pensamos em 1920, a impressão imediata é de uma distância exorbitante. Há 105 anos, o mundo era outro: ideias, percepções e modos de viver não chegariam nem perto dos atuais. Mas, tudo é uma questão de perspectiva.
Mas, depois de tantas décadas, a dúvida que surge para muitas pessoas é: como uma autora falecida há quase 50 anos ainda consegue alcançar tantas pessoas?
“Por causa de sua atualidade, que também é atemporal. A obra clariceana dialogava com questões de seu tempo, mas antecipava outras que só emergiriam nas décadas seguintes. Tanto que quase todos os grandes críticos e escritores da época sentiram a necessidade de escrever sobre ela”, responde Evando Nascimento, autor do prefácio da reedição de Todos os contos (Rocco, 2025).
A “rainha” dos memes
Em algum momento da vida, você provavelmente já se deparou com frases marcantes atribuídas a Clarice Lispector — o que, de certa forma, ajudou a despertar a curiosidade de novos leitores.
Nos últimos anos, a escritora se tornou uma espécie de ícone pop, estampando memes e postagens virais. O fenômeno começou com uma brincadeira da personagem Fatinha (Juliana Paiva), em Malhação (2012), que citava frases aleatórias dizendo serem de Clarice. A onda tomou conta da internet.
O que muitos talvez não saibam é que grande parte desses bordões jamais foi dita pela autora. Mesmo assim, Evando explica que, apesar do “impacto ruim”, o fenômeno também aproximou novas gerações de sua obra.
“Difundiram péssimas frases como se fossem dela. Até poemas ruins atribuíram à escrita clariciana. Mas isso também ajudou a criar um interesse por uma autora que morreu com alto prestígio, mas era considerada ‘hermética’ por muita gente.”
Atualidade nas discussões de gênero
Em um momento em que o Brasil se vê em meio a protestos e discussões sobre a brutalidade e a misoginia que assolam o país, as palavras de Clarice retornam ao cotidiano comum.
Muito antes de a linguagem feminista ganhar os vocabulários, a escritora já discorria sobre o incômodo e o sufocamento que atravessavam a vida das mulheres. Contos como “Amor”, “Laços de família” e “A imitação da rosa” revelam protagonistas que vivem a tensão entre o papel de esposa perfeita e a sensação de inadequação silenciosa.
Ao mesmo tempo, personagens como Joana, de Perto do coração selvagem, rasgam qualquer moldura de docilidade feminina. Rebelde e inquieta, a personagem parece dialogar diretamente com jovens leitoras que questionam padrões de gênero, maternidade obrigatória e expectativas sociais.
Evando lembra que a obra não apresenta uma “essência feminina”, mas uma experiência radical de liberdade: “A ficção clariciana é muito libertadora, rompendo com dogmas ancestrais. Há um questionamento intensivo do aprisionamento das mulheres ao simples papel de esposa submissa.”
A escrita que envolve jovens e adolescentes
A força que Clarice tem entre adolescentes hoje não é à toa. Ela retrata como poucos os temores da juventude. Contos como “Os desastres de Sofia”, “Mistério em São Cristóvão” e “Preciosidade” conseguem capturar inseguranças, medos e desejos — temas constantemente ressaltados pelos booktokers. E, num momento em que saúde mental, crises de identidade e busca de pertencimento são temas centrais para jovens, Clarice parece falar exatamente a língua deles. O que Evando resume como “uma verdadeira experiência estética e reflexiva, muito além do entretenimento”.
Atualmente, seus livros deixaram de fazer parte apenas do cotidiano escolar, em que muitos jovens se forçavam a ler apenas para cumprir as regras da base curricular. Hoje, sob a influência das redes sociais e de personalidades famosas, esse público passou a “dar uma chance” para a autora. Não por acaso, em 2025, suas obras compuseram a lista de títulos mais vendidos durante a Bienal do Livro do Rio de Janeiro.
A força das novas adaptações
Mas todo esse sucesso não é espontâneo. Nos últimos anos, houve um trabalho contínuo para manter o nome de Clarice Lispector em circulação.
Há mais de uma década, a editora Rocco tem investido em trazer novas feições aos livros da autora, com capas chamativas, coleções especiais e diferentes projetos editoriais. A nova estética também se tornou um atrativo de modo geral.
Neste ano, Todos os contos retorna às livrarias com o prefácio de Evando, ao mesmo tempo em que obras ganham versões em HQ, como a adaptação recente de A hora da estrela, que aproxima a narrativa do público mais jovem.
No audiovisual, as releituras também exercem o papel de estender o interesse pela autora a novos públicos. O filme A paixão segundo G.H., protagonizado por Maria Fernanda Cândido, percorreu festivais internacionais e reabriu discussões sobre o romance, considerado um dos mais radicais da literatura brasileira.
Clarice como símbolo identitário do Brasil
Clarice não é apenas uma autora importante. Ela é um símbolo emocional brasileiro. Patrona da Literatura Pernambucana, com infância no Recife, naturalizada brasileira após fugir da perseguição nazista, sua história ecoa debates contemporâneos sobre migração, pertencimento e identidade.
Para muitos leitores, sintetiza a imagem da escritora brasileira moderna: urbana, inquieta, sensível, sofisticada e coloquial. Um rosto e uma voz que representam um certo Brasil para o mundo.
Encerrar a matéria com Clarice é também um gesto afetivo: uma forma de pensar quem somos como mulheres, leitoras e habitantes de um país em transformação. Uma autora que nos olha de volta — e que, 105 anos depois, continua questionando o que queremos ser daqui para frente.
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