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Chef brasileira comandará novo restaurante do Museu do Louvre

Alessandra Montagne fala sobre o sentimento de assumir a novidade e garante: "Pode-se esperar uma comida bem temperadinha e acolhedora"

Por Marina Marques Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO
15 fev 2024, 10h00
A chef Alessandra Montagne
A chef Alessandra Montagne já é dona dos restaurantes “Tempero” e “Nosso” (Maki Manoukian/Divulgação)
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Com um currículo como o de Alessandra Montagne, alcançar o posto de chef de um dos restaurantes do Museu do Louvre não deveria ser uma surpresa assim tão grande.

Nascida no Morro do Vidigal, no Rio de Janeiro, e criada na cidade mineira de Poté, Alessandra chegou em Paris em 1999, aos 22 anos, para estudar o idioma.

“Vim pra cá para fugir de uma realidade muito difícil, um casamento abusivo”, conta. Na França, sua carreira decolou. Ao se formar numa escola de gastronomia parisiense, conseguiu uma vaga no restaurante franco-chinês Yam’Tcha, que acabara de receber sua primeira estrela Michelin.

Em 2012, veio a realização do sonho de abrir seu próprio lugar, o Tempero, onde era comum ver uma fila de pessoas na porta. Um desses clientes era o renomado chef Alain Ducasse, que se tornaria seu mentor.

Foi justamente de Ducasse que partiu o convite para assumir a novidade no museu. “Foi surreal, eu atendi o telefone e era o Alain Ducasse. Ele disse que estava respondendo a uma licitação”, diz a chef.

Time de chefs do Museu do Louvre
Da esquerda para a direita, os chefs: Sébastien Millier, Vivien Durant, Jessica Prealpato, Alain Ducasse, Arnaud Chevalier, Alessandra Montagne, Florent Ladeyan e Christophe Clarigo (Philippe Vaurès Santamaria/Divulgação)

O contato era para se juntar à equipe do chef francês, que assumiria todos os restaurantes do Louvre e sugeriu que ela ficasse com um deles. “Eu não conseguia nem responder”, relembra a brasileira. Mas, assim que recuperou o fôlego, é claro que respondeu um bom e claro “sim”.

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A chef carioca conta que o espaço já tem nome e cardápio definidos, mas que ainda não pode revelar muito do projeto. O que já é sabido é que podemos esperar por uma gastronomia acolhedora e com tempero brasileiro.

“Vou fazer tudo que puder para as pessoas ficarem felizes. E, óbvio, eu sou brasileira, não tem como não colocar o que eu sou no que faço. Então terá um temperinho brasileiro aqui e ali, com certeza.”

A seguir, você confere a entrevista completa com a chef Alessandra Montagne:

CLAUDIA: Como foi receber o convite para assumir um dos restaurantes do Museu do Louvre?

Alessandra Montagne: Menina, foi surreal. Eu atendi ao telefone e era o Alain Ducasse. Ele disse que estava respondendo a uma licitação: “Eu queria que você viesse comigo. Vou assumir todos os restaurantes do Louvre e queria que você ficasse com um”. Eu não conseguia nem responder, aí ele perguntou “Você está me ouvindo?”. E eu falei: “Eu tô, chef!”; “Você quer ou não quer?”; “Eu quero!” [rindo]. Ficamos de nos encontrar para falar sobre tudo. Quando eu desliguei o telefone, fiquei parada no meio da rua, sem entender o que estava acontecendo. Lembro do dia, da hora e até de como estava vestida, de tão forte que foi o impacto. Eu aceitei sem nem me perguntar muito para onde estava indo, o que iria fazer, se era um negócio bom ou não. Eu só confiei porque o Alain nunca me colocaria numa roubada. Depois me encontrei com o diretor financeiro e com o pessoal da organização para entender o que significava isso tudo e foi algo inacreditável. Então senti emoção, antes de mais nada, e também um reconhecimento muito forte.

A chef Alessandra Montagne
Nascida no Morro do Vidigal, no Rio de Janeiro, e criada na cidade mineira de Poté, Alessandra chegou em Paris em 1999 (Maki Manoukian/Divulgação)
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“E, óbvio, eu sou brasileira, não tem como não colocar o que eu sou no que faço. Então terá um temperinho brasileiro aqui e ali, com certeza.”

Alessandra Montagne, chef de cozinha

– Você ainda não pode revelar muito, mas o espaço já tem nome definido?

Sim, o espaço já tem nome e já está tudo definido. Em um projeto dessa envergadura, tudo já foi apresentado antes e aprovado com o museu. Já tem cardápio, as receitas já foram todas testadas, já temos fotos dos pratos… Tudo está pronto, agora é só fazer a reforma e abrir. Mas eu não posso falar mais do que isso porque é o Louvre que vai anunciar primeiro – eles vão anunciando aos pouquinhos no decorrer do ano.

– Qual será sua função oficialmente?

Eu vou ser a chef desse restaurante dentro do Museu do Louvre. Você passa pela entrada, sobe uma escada rolante e lá tem vários restaurantes, entre eles o meu, com meu nome na porta.

 – O que podemos esperar do cardápio?

Pode-se esperar um cardápio gostoso, com uma comida bem temperadinha e acolhedora. Vou fazer tudo que estiver ao meu alcance para as pessoas que comerem lá ficarem felizes e gostarem do que estão provando. E, óbvio, eu sou brasileira, não tem como não colocar o que eu sou no que faço. Então terá um temperinho brasileiro aqui e ali, com certeza.

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– Qual você acha que será o maior desafio?

O mais desafiador será trabalhar com quase 80 funcionários, todos franceses ou de outros países do mundo. Estou acostumada a trabalhar só com pessoas de outras nacionalidades, mas elas vão ter que aderir ao projeto. Vou ter que despertar neles a vontade de ir adiante comigo – e é muita gente, né? Eu nunca dirigi 80 pessoas de uma vez. Vai ser um grande desafio e eu não vejo a hora de começar porque estou superempolgada. Nossa, não vejo a hora!

Novo restaurante fica dentro Museu do Louvre, em Paris
Novo restaurante fica dentro Museu do Louvre, em Paris (Guillaume Meurice/Divulgação)

“Eu não tinha nada, cheguei com a mochila nas costas. Vim pra cá pra fugir de uma realidade muito difícil, um casamento abusivo.”

Alessandra Montagne, chef de cozinha

– Em que ano você se mudou para Paris? Essa mudança veio da necessidade de fugir de uma realidade difícil?

Cheguei aqui dia 21 de novembro de 1999. Eu não tinha nada, cheguei com a mochila nas costas. Vim pra cá pra fugir de uma realidade muito difícil, um casamento abusivo. E vim atrás de conquistas, com um monte de sonhos na cabeça, mas em nenhum momento da minha vida eu tinha pensado em ser cozinheira e chegar aonde eu cheguei. Tenho a impressão de estar vivendo um sonho acordada. 

– Qual foi seu primeiro contato na vida com a gastronomia?

Foi quando eu saí para jantar em Paris no dia que eu cheguei. Meu padrasto me levou para comer no La Coupole, que é uma brasserie muito legal no Boulevard Montparnasse. Eu nunca tinha visto um lugar tão diferente, com todos aqueles garçons vestindo paletó e toda uma maneira de servir, uma coordenação impressionante. Eu vi aquilo e pensei: “Meu Deus, mas que lugar é esse?”. Com o passar do tempo, me dei conta de que aquilo era supernormal na França, mesmo nos restaurantes pequenos. E aí comecei a me interessar e querer entender o terroir francês. Na França, as pessoas são muito apegadas ao comer bem, com qualidade, e a comer da região deles – eles dão muito valor para as coisas da região. Por exemplo, tem a “pomme de terre de Noirmoutier”, que é uma ilhazinha. Eles veneram a batata de Noirmoutier e a gente pode até pensar “nossa, mas é só uma batata”, mas para eles é “a” batata: ela tem prêmios, tem nome, tem registro. Aqui é tudo assim. Camembert, por exemplo, é uma cidadezinha que tem uma rua, mas tem ônibus fretados que vão lá visitar Camembert. Eles são superapegados ao terroir deles e eu acho isso tão lindo, porque dão muito valor para os produtos e para os produtores, para quem faz, para as pessoas que trabalham a terra e as coisas vivas.    

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A chef brasileira Alessandra Montagne
A chef brasileira Alessandra Montagne (Maki Manoukian/Reprodução)

– Como você acha que carrega os sabores brasileiros na sua jornada?

Carrego para onde eu vou, sempre, sempre, sempre. Em todos os lugares por onde passei e trabalhei e nos meus restaurantes, sempre tem coisas brasileiras. É muito importante colocar a minha identidade, a minha assinatura. Mesmo tendo saído do Brasil muito novinha, a cozinha foi minha primeira maneira de me comunicar com as pessoas – e a cozinha que eu sabia fazer na época era brasileira, era a comida simples da roça, lá de Minas Gerais. Eu sempre carrego comigo o fato de que a única coisa que tenho, de verdade, são minhas lembranças, meu tempero, meu trabalho e minha cozinha. Posso ir pra qualquer lugar, mas sempre vou saber fazer o feijãozinho com arroz, uma barriga de porco, um pernil assado, um franguinho caipira, sabe? Isso é muito importante porque reconforta, é uma maneira de falar com as pessoas. Você fazer um prato, colocar uma mesa bonita e servir as pessoas, mesmo não sabendo falar um idioma. Você vê que a pessoa está ali feliz, sorrindo; ela prova a comida e acha que é algo mágico. Eu vivi várias vezes essa magia da doação através da comida sem conseguir falar com a pessoa ou entender o que ela estava dizendo. É realmente muito bonito.

– Acha que sua decisão de aceitar esse novo desafio vem de uma personalidade inquieta, de estar sempre pensando em fazer algo novo?

Eu nunca recuso nada. Quando se trata de projeto, eu sempre quero saber o que é e me interesso muito. Não sei se é uma questão de ser inquieta e sempre precisar de coisas novas… Talvez seja. Eu nunca tinha pensado nisso. Mas eu adoro coisas novas, adoro fazer coisas que nunca fiz e sair da minha zona de conforto. Pra mim é superimportante para continuar crescendo, até mesmo intelectualmente. Mas eu não sei responder [risos].

 

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