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Dani Moraes

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Dani Moraes é escritora, jornalista e especialista em escrita terapêutica
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Para quem o ano só começa depois do carnaval?

Vivo eu, você e todas nós essa vida que não para, mas escolhi ser ponte e apoiar as mulheres que, como eu, já viveram décadas desde o último Réveillon

Por Dani Moraes
22 fev 2024, 06h48
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  • Agora finalmente o ano começou. Essa afirmação deve ser uma piada ou uma percepção míope da vida real – ao menos se você trabalha e cuida da casa, dos filhos, dos pets e das plantas ou, quem sabe, de um familiar idoso, apoia um amigo em crise, ou coleciona um robusto kit de boletos personalizados com vencimento para janeiro. A sátira sobre a importância que o carnaval tem em nossa cultura diz que as coisas só engrenam depois da festa, mas me peguei incomodada com esse papo e fiz uma lista, rapidinho, de cabeça, do que rolou só nesses primeiros 50 dias de 2024. 

    O ano virou com trabalho. Dei uma jornada em grupo para mais de 40 mulheres todas as noites, entre o Natal e o Dia de Reis. A proposta era aproveitar o portal energético do momento para observar sonhos e receber insights.

    Por que será que essa época do ano é tão propícia para reflexões?, me perguntei. E foi fácil responder. É que essa é a hora em que coletivamente mais fazemos pausas. Uns mais, outros menos, mas via de regra o período tende a seguir um ritmo diferente do habitual – mesmo que muitas vezes a gente se sobrecarregue também com tarefas e preparativos para festas ou viagens. 

    Aqui, passados o Réveillon e mais 12 anos de espera, foi neste janeiro de longos meses que consegui vender um bem deixado por minha mãe. Sabe aquela história difícil, com enredo complexo, que parece nunca ter fim? Pois cheguei ao prólogo.

    Com isso, tome cartório, documentos, assina daqui, rubrica de lá, espera, marca, desmarca, pede favor, espera mais um pouco, depende de um, aguarda o outro. Ufa! Só aqui foram eras.

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    Em paralelo, férias das crianças e volta às aulas. Ou seja: entretém, deixa no tablet, manda sair do tablet, alimenta, para um pouco, joga um jogo, compra material, destralha armário, alimenta de novo, doa roupas, compra roupas. Mãe, tô com fome! Alimenta mais uma vez. O tênis não serve mais, a mochila rasgou, o carro quebrou. Vai na loja, pede para a avó. Troca o pneu. Troca o amortecedor. Troca a suspensão, faz rodízio, faz cambagem, regula o freio. Pronto: bora para mais um ano rodando 70 km/dia. Check. 

    Desiste da mudança de casa, ao menos no primeiro semestre. O trabalho, que estava aprovado, cai. Retoma a mentoria, persiste, insiste, desiste, chora, recomeça, insiste de novo. Aprende a dar autógrafos, prepara o envio, fica com medo, posta os livros. E o Instagram? Dá um tempo. Aham, mas tem que voltar! 

    Decide fazer a pós. Vai ser esse ano! Estuda, lê, define o planejamento, cronograma, bota no Notion. Estuda mais, leva a filha e as amigas ao cinema. Faz bolo, manda mensagem.

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    Marca reunião, dá mentoria, escreve, organiza o financeiro, paga conta, paga conta, paga conta. Reclama de pagar muita conta. Escreve. Assiste a palestra sobre prosperidade: alto nível de crenças limitantes e padrões de escassez instalados no sistema. Como apagar? Não apaga, mas atualiza (dizem). Como? Reiniciando mil vezes até reconfigurar o padrão. 

    Estuda mais, faz exercício. Aprende a meditar, começa, recomeça, falha, retoma. Tá gostoso! Hoje não deu, amanhã eu volto. Consegui. Falhei de novo. Voltei.

    O Tarado cruza a Ipiranga e a Avenida São João. O bloco pula e grita: fica, vai ter Boulos. Rima, maiô e meia arrastão. Camarote na varanda e a Charanga macetando, macetando – haja alegria para tanto folião.

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    O mini band arrebentou, o tapetinho de yoga esfarelou, o fone não conecta. Estica, sua, torce, cresce. Recomeça. Escreve mais. Compra na Amazon. Atende o interfone, faz mercado. Lê Byung-Chul Han. A Sociedade do Cansaço em edição ampliada nomeia o que se vive para descobrir novos jeitos de atravessar a exaustão até chegar ao contentamento. 

    Vivo eu, você e todas nós essa vida que não para, mas escolhi ser ponte e apoiar as mulheres que, como eu, já viveram décadas desde o último Réveillon.

    Passado o carnaval,  temos que reduzir a velocidade do cruzeiro, deitar no barco e descansar em movimento. Navegar até entender que a gente pode, sim, reconhecer os descaminhos, desacelerar, dizer não (ou sim para nós mesmas), e fazer do “a partir de agora” um verdadeiro ano novo, em que a pausa não espere 365 dias para acontecer.

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