Nunca se falou tanto sobre sexo, prazer e orgasmo. Mas, ainda assim estamos transando mal. Sim, estamos todos transando mal. Eu, você, a vizinha, a amiga que vive se gabando do fôlego do maridão. Todas estamos transando mal. E se você for a exceção, temos aí a confirmação da regra.
Eu demorei para constatar o óbvio. Acreditei era eu quem estava apegada ao meu antigo relacionamento, que não estivesse me entregando o suficiente, que desaprendi a comunicar meus desejos ou que meu corpo estava quebrado. Achei que pudesse estar ultrapassada ou que a conveniência dos 8 anos de casamento tivesse me colocado em uma zona de conforto. Pensei que fosse minha inexperiência com novos corpos, meu medo de ir além ou de parecer a sexóloga chata no meio da transa. Mas não. É um mal generalizado.
Em tempos de overdose de conteúdos sobre sexo e relacionamento, nas redes sociais, e uma abundância descomedida de gurus no assunto, parece mesmo que a satisfação sexual está a uma lista com “5 passos infalíveis” de distância. Que se nos tornarmos mulheres empoderadas e independentes, automaticamente acabaremos em relações íntimas profundas e transcendentais. Mas não é assim que funciona, na prática.
Em algum momento, a descoberta do prazer feminino, do clitóris, da potência erótica e sexual desse corpo com vulva se voltou contra nós. Aquilo que deveria ser um propulsor para novas experiências e sensações, acabou gerando cobranças e medos antigos com roupagens contemporâneas.
Agora, ao invés de servir sexualmente, nos obrigamos a gozar. Ao invés de performar o prazer, performamos a verdade sobre como estamos nos sentindo nessas relações. Queremos saber fazer e dizer por aí que somos livres nesse âmbito da vida.
Mas a verdade é que relacionar-se afetiva e sexualmente é exatamente sobre o não saber. É sobre entregar-se a um infinito desconhecido, a uma imensidão de possibilidades, a uma eterna pesquisa de nós mesmas, dos nossos corpos que mudam todos os dias, das nossas fantasias e quereres.
Transar bem não é sobre o tempo, sobre posições, sobre conseguir chegar ao orgasmo ou fazer a outra pessoa chegar lá. Não é sobre seguir um roteiro, um sem fim de regras, vestir lingerie ou amar o corpo que habita. A qualidade do sexo não se mede pelo diálogo, pelo telefonema no dia seguinte ou pelo carinho no final. Tudo isso pode fazer parte de uma boa transa, mas não é o que a garante.
Para transar bem, a gente precisa estar presente e entregue. Isso significa abrir mão de saber o que está fazendo. Pressupõe entender que cada transa é uma transa, em um espetáculo onde não há coreografias. É jogar-se no improviso, com frio na barriga mesmo. Saber que, às vezes, não vai encaixar e que, então, é possível tentar novamente. É colocar-se na posição de observadora de si e do outro. Sensibilizar-se. É pegar uma longa estrada, com vistas inusitadas, mas sem um destino final. É curtir a brisa na janela pelo puro deleite de poder fazê-lo. Enfim, permitir ser estranho, confuso, complexo e incrivelmente saboroso, assim como a vida.