Divórcio. Uma realidade cada vez mais presente na vida dos brasileiros. Em 2021, o número de divórcios bateu novos recordes. Foram 37 mil separações registradas apenas no primeiro semestre, um número 24% maior em comparação com o mesmo período de 2020.
Seja pelo excesso de convivência que escancarou as desigualdades de divisão de tarefas, conflitos antigos que estavam jogados debaixo do tapete ou, ainda, novas percepções sobre a vida, fato é que muitos casamentos foram desfeitos ao longo desses quase dois anos de pandemia.
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Para muitas mulheres brasileiras, essas serão as primeiras festas de fim de ano desacompanhadas de seus parceiros. Um situação que pode gerar angústia e medo do constrangimento, já que mesmo vivendo no século XXI, as mulheres que se divorciam ainda carregam inúmeros estigmas.
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Até 26 de dezembro de 1977, o divórcio não era uma possibilidade no Brasil. Antes disso, o que restava aos casais descontentes com o casamento era o desquite, que não eliminava o vínculo matrimonial. A mulher desquitada, assim como qualquer mulher, em qualquer tempo, que ousou romper com o sistema que a oprimia, era vista como um perigo à sociedade. Eram, então, consideradas fracassadas, promíscuas e, portanto, alguém a excluir do convívio.
Essas feridas sociais seguem, em partes, abertas. Perpetuou-se a responsabilidade unilateral sobre a manutenção do casamento. Um peso carregado arduamente pelas nossas avós, mães e por muitas de nós. Um peso colocado nas nossas costas desde que o matrimônio se tornou um dos sacramentos da igreja católica e, talvez, muito antes disso.
Os comentários inconvenientes de familiares nas confraternizações dessa época do ano podem agir como grandes gatilhos. Aquela pressão para que se engate rapidamente em um novo relacionamento, o machismo disfarçado de preocupação, os olhares desconfiados ou de “pena”, embrulham o estômago, geram ansiedade e intensificam ainda mais todos os desafios desse processo.
Não é por acaso que o divórcio desperta tanto medo sobre “como vai ser” e “o que vão dizer”. Há séculos somos definidas pelas nossas relações. Uma forma eficiente de promover o nosso apagamento e silenciamento. E, então, quando espreitamos pela fissura desse muro alto de expectativas, é comum que nos sintamos impotentes.
Mas é também fato que não precisamos desses títulos e rótulos. Somos inteiras e não partes da vida de outrem. Ainda que não possamos evitar todos os desconfortos dos fins de ciclos ou as tentativas de nos constranger, é sim possível passar por essa época do ano de cabeça erguida e não sucumbir ao que esperam de nós.
E talvez isso signifique se permitir não estar presente. Aproveitar para passar o fim de ano na casa daquela amiga que te convida há anos, mas que você nunca priorizou. Isolar-se em uma pousadinha qualquer ou, se nada disso for possível, apenas estar com quem vai saber exatamente o que dizer, ainda que nesse momento essa pessoa seja você mesma. Permita-se. Está aí uma boa forma de começar a abrir uma rachadura ainda maior naquele tal muro de expectativas.
Quem sabe o próximo ano não nos reserve uma travessia completa? Até lá, seguimos juntas.