Amo, logo me entrego. Me entrego dos pés à cabeça, mas sem perdê-la pelo caminho. Gosto dela, a cabeça, no lugar. Nem tão presa, nem tão solta. Flexível, mas firme. E é de cabeça que mergulho na vastidão que é amar.
Mas não quero amar sem ressalvas. Amar sem película protetora alguma, sem colete salva-vidas, sem um paraquedas de segurança, é pura negligência, insensatez. Longe de mim querer relações apenas sensatas, onde não há espaço para as nossas tremendas incoerências. Sou incoerente sim. Me contradigo mais do que costumo admitir. Isso quer dizer que olho com cuidado para tudo que cabe dentro de mim e, então, sei -às vezes não tão bem assim-, apontar o que não cabe.
E não cabe a necessidade de apequenar-me. Não cabe o silenciamento. Não cabe o deslegitimar do meu sentir. Não cabe não poder ser quem sou por inteiro. Já coube. Agora não mais. E, portanto, cabe desconfiar. Cabe escolher me proteger, esperar mais um pouquinho para ficar nua, observar à certa distância. Cabe entregar tanto quanto é seguro.
A gente confunde as coisas. Amar é também saber onde não se pode ir. É sobre poder ir no tempo que dá, até onde faz sentido. É, acima de tudo, permitir que o amor seja possível. Sim, porque para saltar de cabeça é importante saber o que há naquelas águas. A profundidade, temperatura, se há correnteza e do que é feito o fundo. É preciso conhecer a si mesmo e, então, conhecer quem salta junto, para que possamos seguir saltando.
Amar é um exercício de entrega. Uma entrega com respeito e cuidado. Uma entrega com o coração e a cabeça no lugar. No fim, talvez, esse seja mesmo um exercício de confiança. Confiança nos nossos próprios critérios, no nosso discernimento e na nossa capacidade de amar a própria trajetória.