O frio no estômago. Náusea. Abismo. Fui eu quem pedi, quem propôs e argumentou por mais de três anos, mas tornar real é muito diferente. O arrepio que descia a espinha me colocava em estado de sobrevivência. Sentia tesão e repulsa. Extasiada e paralisada. Era o primeiro dia de um estar diferente no mundo e desagarrar-me da pele que usei por tanto tempo me deixava exposta. Carne viva. Viva, em carne.
Essa foi a sensação do primeiro dia não-monogâmica. Ao contrário do que se possa esperar, não me senti livre. A verdade é que consegui visualizar com maior nitidez as amarras que me prendiam e o quão imobilizantes eram. Tive vontade de sair correndo e pedir pra voltar atrás. Mas segui.
Àquela altura, só a decisão já causava movimentos internos mais intensos do que eu poderia prever. Em mim existia o ímpeto de controlar meu parceiro com ferocidade. Um desejo profundo de mantê-lo à vista, criar regras rígidas e vigiar cada passo que desse. Mas como diz minha amiga Satta, “não pago terapia para isso”.
Nossos acordos eram apenas dois. O primeiro, evitar relações com pessoas do nosso círculo de amizades. O segundo, fazer exames periódicos. Só. Valia apaixonar-se, valia namorar, viver histórias e ser. Tudo que, na minha cabeça, tornava o amor aquele lugar com sentido. Mas, honestamente, doeu.
Aprendi, nessa experiência de abrir uma relação, que não se pode reescrever uma história que já foi vivida. Não se começa do zero. É preciso continuar de onde parou. É preciso, também, de muito acolhimento, conversa, autoconhecimento.
Eu estava intelectualmente prontíssima para a não-monogamia. Mas emocionalmente? Com certeza não. Mas fui assim mesmo e foi assustador. E bom. E intenso. Porque as coisas nunca são uma coisa só e é por isso que viver é bom.