Eu gosto de me apaixonar. Um conjunto de reações químicas desencadeadas durante um período muito singular. Dopamina, neuroepinefrina, ocitocina e mais uma série de “inas” capazes de nos deixar eufóricas, corajosas e entregues à relação que se inicia.
E, então, eu me deixo apaixonar com frequência. Ora por projetos, por histórias, espaços, cidades e ora por pessoas também. E é preciso despender altas doses de ousadia para saltar desse precipício. Apaixonar-se é também um ato de fé. Foi assim que me apaixonei por uma monogâmica convicta.
Não era parte do plano. Optar pela não monogamia nunca foi uma escolha por converter amores. Aliás, fazer essa travessia não tem sido tarefa fácil sequer para mim. Há muitos dias em que eu questiono minha capacidade de permanecer firme à decisão de negar o amor romântico e tudo aquilo que aprendi sobre ele. Trazer outro alguém comigo, portanto, em tempo algum pareceu uma alternativa segura.
Mas me apaixonei por uma monogâmica, canceriana, também apaixonada. Uma paixão daquelas que nos deslocam do centro e colocam tudo em perspectiva. Paixão que faz a gente querer abandonar convicções e todo o resto para viver desse frio gigante na barriga. Um impulso inconsequente, por vezes irresponsável, rumo ao infinito de incertezas que se estendem à nossa frente.
Foram algumas séries de jantares em que ríamos juntas por puro deleite da companhia e fechávamos a cara imediatamente depois pensando que, em algum momento, teríamos de encarar a impossibilidade de seguirmos juntas. Como construir uma relação entre pessoas que têm entendimentos tão diversos sobre o que significa sentir-se satisfeita e plena em um relacionamento? Como seguir se não se tem para onde ir?
Ser não monogâmica, para mim, significa vincular-me. Não há em mim o desejo de manter relações pela metade. Eu quero mesmo é imergir, mergulhar, me banhar dos pés à cabeça nos amores que cruzam meu caminho. Quero redigir livros completos com a mesma pessoa, não apenas contos. Ou, então, que seja um enorme compilado de contos, com as mesmas personagens, mas nos inúmeros universos paralelos que pudermos explorar juntas.
Quero amar irrestritamente e me sentir amada. Quero satisfazer-me e satisfazê-la. Quero estar aí e quero que ela esteja aqui também. Não sou capaz de amar só um pouquinho. Eu amo uma imensidão e é nessa imensidão que me proponho a construir a vida ao lado dos amores que escolhem ficar.
E, talvez, aí, resida uma pontinha de esperança. Não na promessa de que serei apenas dela, mas na convicção de que quando estivermos juntas estarei por inteiro. Não na fidelidade, mas na mais genuína parceria. Não no “felizes para sempre”, mas na disponibilidade para percorrer a aspereza e a maciez da vida. Não na leveza, mas na profundidade. Não na obrigatoriedade, mas na intensa vontade de estar.
Abrir mão da não-monogamia seria como abrir mão de mim mesma. Abrir mão da monogamia, para ela, também. Mas talvez, então, possamos encontrar uma rota alternativa. Uma rota traçada enquanto caminhamos, em uma estrada ainda sem nome, rumo ao completo desconhecido.