Síndrome do marido em casa
"A culpa não seria mesmo das mulheres que criam homens mimados enquanto mães melosas?"
“Amor, pega um café? Amor, o passeador vem hoje? Amor, coça as minhas costas? Minhas camisas estão sem botão. Ei, vai ao supermercado hoje?” Não, não é um relato de uma conversa no século passado. Foi ontem. O marido da Anna voltou para casa. Não é desemprego (podia ser). Não é aposentadoria (podia ser). Não é caso de doença (Deus o livre). Eduardo simplesmente tirou 3 dias de férias. Um respiro em seu cotidiano de muita ralação.
A dona da casa, se é que podemos cunhar Anna com esse título, tonteou. Acostumada a organizar sua vida e das suas meninas – sempre a mil com seu cotidiano de três empregos, esqueceu o beabá da cartilha da mulher de cama e mesa. Casada pela segunda vez, imaginou que sua nova relação havia ganho um upgrade da não-senzala. Tolinha. E as mulheres maduras com as quais eu converso me pedem uma crônica sobre o tema.
Elas estão abismadas com a postura mimada dos homens entre 40 e 60 anos. Ainda querem uma mulher-empregada, uma esposa dedicada. Querem uma governanta. Querem uma faz-tudo. Perguntam tudo. Pedem tudo. Fica claro entre os mais jovens, na faixa de 20 a 40 anos – a situação já é melhor, mas talvez por sermos nós a geração de despedida do papel esposa perfeita X marido exigente, geração sanduíche entre a escravidão do lar e a real divisão de tarefas, ainda soframos com essa raspa do tacho.
O que incomoda, número 1, é que muitas mulheres aceitam. O que incomoda, número 2, é que muitos maridos não se tocam. E lá venho eu com minhas caraminholanças. A culpa não seria mesmo das mulheres que criam homens mimados enquanto mães melosas? Não seria culpa da mulherada – louca para casar e ser gueixa, a manutenção do modelo “pode-pedir-que-farei?” Não seria culpa do machismo latente, que se não domado vira feminicídio? Estando o macho pagando mais em casa, a mulher tem que servir? O que fazer então? A primeira coisa é reclamar.
Devolva ao parceiro a noção que ele é um sem-noção. Mostre que você não é uma boca pra beijar, uma xota pra transar, mãos para só você arrumar a cama, o banheiro, a sala, o tudo. Dê um treinamento a ele. Um dia, bem irônica, faça ele ser você.
Sete horas de pé, café tomado, organizar a casa, ver o que será pro almoço e jantar, levar filhos ou netos na escola, malhar, ir pro trabalho, na hora do almoço no serviço ir ao banco quitar boletos, sair cansada do trampo, pegar metrô, transporte público ou aquele carro pago com seu suor, voltar pra casa, organizar jantar, lavar a louça, assistir a novela enquanto faz a lista de afazeres do dia seguinte, tomar banho, dar gostoso, alimentar o cão, apagar as luzes, pegar água para madrugada, se lembrar do remédio dele e, se der, dormir.
A segunda dica é espalhar mini espelhos pela casa para ele dar de cara com o feitor babaca que tirou três dias de férias. A terceira é fazer ouvido de mercadora e não fazer absolutamente nada, ou melhor, abrir uma garrafa de Chianti geladinho, colocar La Casa de Papel no Netflix, retocar as unhas, ler seu livro favorito e estalquear as amigas no Insta. E quando ele perguntar “O que tem pro jantar?” Você responde: Capim. Tá bom pra você, Eduardo?
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