São Paulo, 13 de abril de 2020.
Isso é um diário. E, como tal, tem seus altos e baixos. Esse acabou sendo marcado por memória e perda, lá se foi Moraes Moreira.
Antônio Carlos Moraes Pires nasceu em Ituaçu, cidade baiana, há cerca de 470 km de Salvador. Para essa última, o ainda Antônio Carlos se mudou em 1966 para buscar o sonho de cursar Medicina. Na pensão onde morava, conheceu Paulinho Boca de Cantor e Luiz Galvão, que o apresentaram a Tom Zé. Essa pedra mágica no meio do caminho, que mudaria o curso dos acontecimentos para a nossa sorte e graça.
Em 1969, junto de Baby Consuelo, Pepeu Gomes, Paulinho Boca de Cantor e Luiz Galvão, forma o grupo Novos Baianos, que é de onde começa minha história com Moraes Moreira. “Acabou chorare, faz zunzum pra eu ver/Faz zunzum pra mim/Abelho, abelhinho escondido faz bonito/Faz zunzum e mel…”. E assim eu dormia sob uma composição e som acolhedor, pela voz de um baiano, sob a voz de minha mãe. Daí a memória de, ainda pequena, dançar na sala de casa com ela a trilha de “preta pretinha”, em um sábado ensolarado de faxina na casa.
Ou mesmo a memória dos tempos de gramadão da Faculdade de Letras da USP ao som de “A menina dança”, regado a bons debates sobre a política nacional, a literatura, a sociedade, os desatinos de se intentar a crítica literária sem passar por leituras minuciosas de Antonio Candido. Sem dúvida, para cada momento da minha vida, há de ter alguma composição de Moraes Moreira para pintar o céu da memória.
Como todo gênio da música, Moraes Moreira também passeou por ritmos e se provou versátil em composição. De primeiro a colocar voz em trio elétrico, do seu interesse pelo rap a partir do repente e propor experimento-encontro em um de seus discos, da ponte entre ritmos brasileiros e o rock n’ roll.
Obrigada, Moraes Moreira pela psicodelia, pela inovação, por um dos shows mais maravilhosos que já fui em minha vida (em 2012, com a Jazz Sinfônica), pela música de ninar, pela liberdade, pela poesia! Obrigada!
“ Vivemos num mundo insano
Queremos mais liberdade,
Pra que tudo isso mude
Certeza, ninguém se ilude
Não tem tempo, nem idade”
(Moraes Moreira, “Quarentena”, 17 de março de 2020)
Acompanhe o “Diário De Uma Quarentener”:
01/04 – A rotina do isolamento de Juliana Borges no “Diário De Uma Quarentener”
02/04 – O manual de sobrevivência de uma quarentener
03/04 – Permita-se viver “o nada” na quarentena sem culpa
06/04 – O que a gente come tem algo a ver com as pandemias?
07/04 – As periferias e as mobilizações na pandemia
08/04 – Um exemplo de despreparo em uma pandemia
09/04 – Como perder a noção do tempo sem esquecer a gravidade dos tempos
10/04 – Não é hora de afrouxarmos o distanciamento. Se você pode, fique em casa!
11/04 – 3 filmes para refletir sobre a pandemia da Covid-19
12/04 – Nesta Páscoa, carrego muitas saudades. Hoje, minha mãe completaria 54 anos