Talvez seja a tal magia do Natal que nos inspire a fazer algo pelo próximo e a olhar para aqueles que fingimos não ver ao longo do ano. Mas nós dois acreditamos que estar disponível para o outro deveria ser algo intrínseco, que move a gente, em todas as épocas do ano. Foi isso que encontramos na história do Marco.
Deixa te falar… Tudo aconteceu na década de 1970, em Bauru, no interior de São Paulo. Marco era um adolescente de seus 15 anos. Ele e os amigos juntaram dinheiro, pegaram o carro da mãe de um dos meninos, e foram ao bordel da cidade para sua primeira aventura sexual.
Na frente da casa, havia uma árvore bem grande, provavelmente uma mangueira. Ao passarem em frente ao local, Marco ouviu um choro vindo de trás do tronco. Era Tamires, uma garota, mais ou menos da sua idade, com os cabelos encaracolados e um vestido branco floral.
Ele perguntou a ela o que houve, e ela respondeu: “Eu só quero voltar para minha mãe”. Ficou intrigado e descobriu também que Tamires era de Corumbá (MS), cidade que faz divisa com a Colômbia e fica a mais de 1000 quilômetros de distância de Bauru.
Num impulso, saiu correndo com a menina em direção à cidade. Ela tremia e repetia que o “Genaro” iria atrás dela. Genaro era um capanga da cafetina do bordel que “cuidava” das garotas de programa da casa, onde Tamires tinha ido parar graças a uma falsa promessa de trabalhar como babá.
Marco levou a menina para sua casa e a escondeu no seu quarto. Então, foi até a casa da avó que morava próximo e pediu dinheiro a ela. A ideia era comprar uma passagem de trem para que Tamires voltasse para Corumbá.
Penou, mas conseguiu adiantar algumas mesadas e completar o valor necessário. À noite, em casa, planejou tudo com Tamires, orientando que ela permanecesse em silêncio e escondida ali. Afinal, como explicaria a seus pais e irmãos a presença de uma garota desconhecida em casa?
Depois que todos foram dormir, ajustou o despertador para bem cedinho, antes do horário que o pai costumava acordar para ir ao trabalho. Deixou sua cama para Tamires e foi dormir no corredor, do lado de fora do quarto.
Teve a impressão de que, assim que fechou os olhos, o despertador já tocou. Foi até a cozinha, pegou dois pães, duas bananas, chamou Tamires e saíram.
Ainda estava escuro e os cachorros dos vizinhos latiam alto. Às pressas, andaram cerca de um quilômetro e meio até a estação de trem de Bauru, hoje um prédio abandonado.
Chegando lá, se separaram, intuitivamente, para que não fossem vistos juntos. Tamires ficou esperando, enquanto Marco foi ao guichê e comprou a passagem para ela. Ele entregou o bilhete, ela entrou no trem.
Nisso, Marco lembra que a viagem duraria horas e achou que só pão e banana não seriam suficientes. Ela ficaria com fome. Foi correndo atrás de algum vendedor ambulante dentro da estação e comprou uma maçã. Quando ele volta, procura por Tamires em uma das janelas, sentada no seu banco, e entrega a fruta para a menina.
No mesmo instante, seis badaladas avisam a partida e o trem começa a se mover. Enquanto o trem se afasta da plataforma e de Marco, ele vê o cabelo ondulado dela voando para fora. Essa é a última imagem que ele tem da menina que ajudou a voltar para casa.
Nunca mais a viu nem soube se chegou a Corumbá. Sabe apenas que não titubeou em ajudar quem precisava. Uma atitude inspiradora que irá em breve para as telas em Manga Curta, com direção de Manu Quinalha e Marco Giafferi.
O que fica dessa história pra gente é: se um garoto de 15 anos se compadece de um choro no dia em que ele iria realizar um sonho juvenil, você não precisa esperar o fim de ano para fazer a diferença na vida de alguém.
Seja através de atos de bondade, doações, ou simples gestos de solidariedade. O importante é estarmos dispostos e atentos para ouvir. Tem sempre alguém atrás de uma árvore pedindo ajuda.