Escrevo esta crônica, a última do ano, no final de semana natalino. Recebi vários telefonemas e dei boas risadas com mensagens, áudios e sinceros desejos de dias melhores. Ao mesmo tempo em que encerro uma fase de minha existência e estou nos preparativos para o retorno à minha casa, igualmente preparamos uma pequena decoração, quitutes e brincadeiras.
Foram dias agitados e arrastados, entre o cansaço e os compromissos. Alguns e-mails foram enviados no mexer das panelas e outros enquanto arrumava as crianças para dormir. Mães dormem pouco e trabalham o tempo todo. E neste ano, em particular, eu me sinto vivendo um enorme ano de 2020 que só teve aviso de chegada sem nenhuma intenção de acabar.
Os meses se misturaram e os dias da semana se confundiram com uma facilidade enorme. Estamos esgotadas. E fazendo comida, resolvendo problemas de trabalho, trocando receitas de pudim fáceis e baratas, penteando cabelos e mandando colocar os chinelos no pé sem sabermos onde largamos nossos passos na estrada.
Neste final de ano algumas pessoas retomaram, ainda que timidamente, os encontros e abraços das ceias natalinas. Esses pequenos gestos de aproximação foram cercados de muita emoção, e uma delas é o medo. Ainda estamos vivendo em grande risco por causa de inúmeras variáveis e variantes.
Neste ano que não termina, nesse pesadelo de notícias desgovernadas e de tantas mortes pela Covid-19, as lágrimas e as perdas são a marca traumática de uma tragédia que a história vai cobrar sem piedade sobre os tempos que vivemos.
Eu acordei hoje com uma música do Chico Buarque da minha memória afetiva e ela tocou o dia inteiro aqui dentro: “Apesar de você”. Apesar desta época pandêmica, na qual tantos vírus decidem nossas vidas, precisamos acreditar que “amanhã vai ser outro dia” e respirar para simplesmente lembrar que, apesar deles, estamos vivas, estamos aqui e as pessoas querem se amar sem parar. Existem formas e fórmulas para acabar com as variantes e variáveis.
Apesar deles, teremos a alegria poderosa dos amores verdadeiros e da vontade das parcerias e boas amizades. Apesar deles, teremos jardins floridos e risadas. Apesar deles, do ensino remoto/híbrido e todas as dificuldades de convívio social, ensinaremos respeito, carinho e compreensão às crianças, a base fundamental para uma convivência plural e acolhedora das diferenças. Apesar deles, as mães continuarão a se unir em coletivos e a lutar por direitos.
Apesar deles, “nosso coro vai cantar na sua frente” e cada pêsames e sofrimento que fomos obrigadas a falar e sentir serão nossa força para nossos brados de euforia. Vamos cobrar com juros todas nossas tristezas e todas as nossas dores.
Neste final de ano, essa crônica de mãe é um desabafo e um pedido: amanhã há de ser outro dia. Precisamos estar vivas para esbanjarmos nossa poesia materna pelas ruas. Como bem diz Conceição Evaristo sobre os tempos e heranças das escravizações: “Combinaram de nos matar. Nós combinamos de não morrer.”
Vivemos em tempos terríveis e, apesar de tudo, vamos combinar todo dia, mais um dia, todas nós sobrevivermos? Essa será a melhor resolução de Ano Novo que podemos fazer neste momento. É possível sermos melhores, sempre!
Dias mulheres virão!
Vamos conversar?
Se quiser entrar em contato comigo, Ana Carolina Coelho, mande um e-mail para: ana.cronicasdemae@gmail.com ou mensagem pelo Instagram: (@anacarolinacoelho79). Será uma honra te conhecer! Quer conhecer as “Crônicas de Mãe”? Leia as anteriores aqui e acompanhe as próximas!