A série “The White Lotus” foi um dos grandes sucessos da pandemia, merecidamente premiada com seu humor ácido, incômodo e politicamente incorreto. Diante disso, vimos nascer uma franquia de uma rede mundial fictícia de resorts de luxo – que dá nome à série – onde o staff e os hóspedes são nada menos do que pesadelos ambulantes. A fórmula é exatamente a mesma: um local paradisíaco, pessoas buscando escapismo e um crime que surpreende a todos. Para nos manter ligados, temos duas personagens de volta: Tanya McQuoid (Jenniffer Coolidge) e seu marido, Greg, que ela conheceu na temporada passada. No mais, são os mesmos arquétipos, mas em situações diferentes.
O showrunner e diretor, Mike White, revelou uma habilidade ímpar de abordar temas culturais, sexuais e contemporâneos sem poupar ninguém, e com isso a série ganhou prestígio de crítica e público. Jovens ou mais velhas, as mulheres do universo do White Lotus não têm muito a simpatia dele, em geral são narcisistas e implacáveis, mas os homens não ficam atrás.
Se na primeira temporada havia duas narrativas – a da equipe do hotel e a dos hóspedes – agora a sugestão é que teremos menos conflitos de bastidores e o drama estará mesmo nos convidados. Tanya segue alheia ao drama que a cerca, tanto que nem menciona o fato de que houve um assassinato no White Lotus Havaí. O crime foi claramente abafado, pois nenhum hóspede (nem mesmo os americanos) sequer menciona o ocorrido. Se houver uma terceira temporada, a equipe de advogados e de comunicação da rede White Lotus devem ter alguma participação!
Seguindo a tradição, na primeira cena estamos com duas pessoas recém-chegadas ao hotel, cheia de sonhos e esbarrando com um dos hóspedes que está de saída. No caso, Daphne Sullivan (Meghann Fahy) ,uma linda americana que quer dar um último mergulho antes do check-out, mas esbarra em um corpo boiando. Assim como a gerente Valentina (Sabrina Impacciatore), logo somos informados de que há mais de um corpo, em um aparente suicídio coletivo ou assassinato seguido de suicídio. São mais vítimas do que a temporada 1, no qual era apenas um corpo. Quem está morto?
A lista de suspeitos sempre é ampla. Valentina e Daphne estão “salvas”, mas os outros estão em risco. Os já conhecidos Tanya e Greg estão passando por uma crise matrimonial (ela desconfia de infidelidade do lado dele). Além disso, Tanya não vive sem sua assistente, Portia (Haley Lu Richardson), que está sob grande tensão na relação tóxica com sua chefe. Temos os Di Grasso (pai, avô e neto) viajando sem as companhias femininas para “encontrar antepassados em uma cidade perto do resort”. São representantes de uma cultura masculina abominável: Dominic (Michael Imperioli) é um homem que paga por serviços sexuais explorando jovens locais; Bert (F. Murray Abraham) é um idoso que se recusa a entender que assedia mulheres e apenas Albie (Adam DiMarco) parece ser sensível. Ainda não esbarramos com Quentin (Tom Hollander) e seu filho, Jack (Leo Woodhal), mas as jovens Lucia (Simona Tabasco) e Mia (Beatrice Grannò) são o desespero da gerente Valentina e a fonte de seus problemas, e podem ser facilmente vítimas infelizes dos hóspedes do White Lotus. Para fechar, tem os casais perfeitos com Daphne e seu marido, Cameron Sullivan (Theo James), o amigo de faculdade dele, Ethan Spiller (Will Sharpe), e a esposa cínica de Ethan, Harper Spiller (Aubrey Plaza). Harper e Cameron antagonizam abertamente, mas ao mesmo tempo há uma tensão sexual entre eles.
Embora seja divertido adivinhar quem pode morrer (já cravei minha tese e vou ver se acerto!), o curioso é ver como os hóspedes do White Lotus representam tantas pessoas dos dias de hoje em uma ótima sátira social, onde o fator determinante é o balanço entre sexo (ausência, desejo e equilíbrio) e intimidade. Se os milleniums foram cutucados com Paula e Olivia no Havaí, na Itália o foco é engajamento e “distanciamento”. Harper, Ethan, Daphne e Cameron são ricos, mas Harper é obcecada em resolver os problemas do mundo enquanto os outros não poderiam se importar menos. A diferença é que enquanto Daphne e Cameron se veem sem ilusões, Harper e Ethan estão longe de serem mais do que colegas de quarto em uma relação assexuada.
Não se iluda com o tom de aparente superficialidade de The White Lotus. A série dá voltas, mas, quando chegamos ao final, estamos diante de um espelho muito claro, que nos faz refletir sobre convivência e amor, e a resposta geralmente é bem longe da esperada. Assim como a vítima do crime… quem você tem na sua lista?