Maisie Williams será eternamente Arya Stark de Game of Thrones, mas sua ligação com o mundo Fashion a levou personificar a musa punk Jordan na série Pistol, e, agora, será ninguém menos do que Catherine Dior, na série A New Look, que estreia dia 14 na Apple Tv Plus.
Catherine foi a irmã mais nova de Christian Dior (Ben Mendelsohn), a inspiração para seu primeiro perfume – Miss Dior – que, durante a invasão nazista na França, protagonizou uma história de amor e de coragem, lutando pela resistência francesa e influenciando o famoso irmão. Pelo que vimos no trailer, poderemos nos emocionar com essa história até hoje menos explorada pelos que não acompanham ícones da Moda.
Nascida em 1917, Catherine viveu uma vida privilegiada até as tragédias começarem a marcar a casa dos Diors. Seu irmão Raymond voltou traumatizado da Primeira Guerra Mundial, sofrendo de PTSD (estresse pós-traumático). Outro irmão, Bernard, era esquizofrênico. O pai, Maurice, perdeu a fortuna, e por isso ela passou a adolescência com ele em uma fazenda na Provença.
Apenas no final dos anos 1930, já com 20 e poucos anos, é que foi morar com Christian em Paris. Ele já era ilustrador de moda trabalhando para Lucien Lelong. Em Paris, Catherine passou a ter uma vida social mais agitada, testemunhando a boemia parisiense com artistas e intelectuais, ao mesmo tempo em que a Alemanha crescia com Hitler ao poder.
Christian e Catherine eram amigos íntimos. Ela ajudava a omitir que ele era gay e Christian mantinha a discrição quanto ao fato de que ela tinha um relacionamento com um homem casado e pai de três filhos, Hervé des Charbonneries.
Como trabalhava como vendedora, Catherine era perfeita para exercer certas tarefas sem chamar atenção, como comprar um rádio para que seus compatriotas pudessem ouvir a uma transmissão de Charles de Gaulle, o líder das Forças Francesas Livres. Como vários designers naquele período, Christian vestia as esposas de oficiais nazistas, mas ainda assim Catherine usava o apartamento que dividia com ele para realizar reuniões e fornecer inteligência às forças britânicas que planejavam o Dia D. O pânico veio quando, junto com 26 colegas, Catherine desapareceu. Christian esperava apenas o pior.
Um agente duplo infiltrado traiu Catherine e os membros da Resistência foram presos e espancados em um apartamento em Paris, mesmo antes de serem transferidos para um campo de concentração. Por nove meses, os Diors não tiveram sequer uma única informação sobre Catherine. A essa altura, os relatos das condições devastadoras nos campos de concentração começaram a surgir. O mais provável era que estivesse morta.
Mesmo com conexões fortes através de suas clientes, Christian não conseguiu a libertação de sua irmã, que estava no campo de concentração de Ravensbrück, no norte da Alemanha. Foi um período no qual o estilista só encontrou esperança se dedicando exclusivamente ao trabalho e na confiança da vidente, Mme Delahaye, que garantiu a ele que Catherine voltaria viva.
Apenas em meados de abril de 1945 um sinal de vida chegou até o estilista, através de uma amiga casada com um diplomata francês que localizou Catherine. Ainda assim, o resgate demorou, porque a jovem florista tinha sido transferida para o subcampo de Markkleeberg, em Buchenwald, antes de conseguirem chegar até ela.
Quando a Cruz Vermelha conseguiu a liberação dos prisioneiros, ainda havia o longo caminho para casa e, do grupo de trezentas mulheres, onze morreram na viagem de volta. As cicatrizes físicas e psicológicas eram claras e Catherine só chegou à Paris no final de maio de 1945. Christian foi ao seu encontro na estação de trem, mas não a reconheceu. Estava doente demais até para se alimentar, mas ele cuidou pessoalmente de sua recuperação.
Depois que retornou, algumas poucas informações surgiram sobre a traumática prisão de Catherine pelos nazistas, uma vez que ela se recusava a contar o que testemunhou. Sabe-se que foi levada para trabalhar numa fábrica de peças para aviões e se manteve firme e determinada a resistir.
Preferia passar fome do que se abaixar e pegar a comida jogada no chão pelos guardas. Seu grupo era unido e cometiam erros “acidentalmente” enquanto trabalhavam, num esforço para quebrar máquinas de fábrica.
Quando os alemães se renderam, os guardas dos campos de concentração forçaram os presos a marcharem longas distâncias, desnutridos, para mudá-los de endereço. Nesse período, ainda mais inocentes morreram. Catherine nunca contou à família ou amigos como conseguiu sobreviver.
Os documentos provam que ela foi libertada pelas tropas soviéticas em 21 de abril de 1945, mas como há evidências que sugerem que as tropas soviéticas violariam mulheres prisioneiras de guerra mesmo quando as libertavam, não há certeza se ela ainda teve que viver mais esse abuso. Seja como for, ela aparentemente ficou incapaz de ter filhos depois dos horrores que suportou quando foi capturada.
Sua saúde nunca mais foi a mesma: artrite crônica, reumatismo e problemas renais, lesões nos quadris, costas e pés, bem como cicatrizes visíveis eram problemas constantes – além da insônia, pesadelos, perda de memória, ansiedade e depressão. Por um tempo, preferiu ficar isolada na Provença, mas seu amor por Hervé também sobreviveu à Guerra: ficaram juntos até a morte dele, em 1989.
Embora sempre fosse um sonho, foram nesses anos traumáticos que Christian Dior começou a planejar se tornar designer por conta própria – motivo pelo qual a história de Catherine está incluída na série The New Look. Afinal, a coleção revolucionária de Dior é 1947, apenas dois anos depois do fim da guerra.
A conexão é óbvia. Catherine, como florista e apaixonada por flores, inspirou a coleção de Christian, batizada como La Corolle, uma alusão às pétalas das flores, um desenho que ele usou para criar o modelo de cintura fina e saia arredondada. Os modelos quebraram as convenções da moda militarista e pragmática da época, trazendo uma aura mais romântica e nostálgica.
Aos 42 anos, Christian Dior passou a ser o estilista mais adorado do mundo. Muitos acreditam que foi seu amor por sua irmã que o fez desejar trazer beleza de volta à vida das mulheres. Uma resposta à escuridão e trauma que quase a destruíram. E, se o new look é apenas indiretamente aludido às flores de Catherine, o perfume Miss Dior lhe foi oficialmente dedicado. A fragrância floral, para ele, era “o perfume do amor”.
Uma certa ironia é que santo de casa não faz milagre. Mesmo convivendo com um gênio da moda, Catherine nunca foi ligada em roupas glamorosas. Da Dior, tinha apenas algumas peças. Em geral, preferia designs simples para poder se movimentar e trabalhar em seu jardim.
Nunca se afastou da política ou perdeu sua coragem, indo testemunhar pessoalmente num julgamento em 1952 contra as 14 pessoas que a torturaram no escritório da Gestapo parisiense. O fato foi considerado um escândalo por envolver tortura e abusos sexuais.
Quando Christian morreu repentinamente de ataque cardíaco, em 1957, aos 52 anos, deixou sua propriedade para Catherine e um amigo próximo, Raymonde Zehnacker, mas apontou sua irmã como sua “herdeira moral” e a pessoa que ele designava como responsável para manter a empresa, o que ela fez com discrição, mesmo longe de Paris, pois se mudou com Hervé para o sudeste da França, onde viveu até sua morte, em 2008, aos 91 anos.
Infelizmente, ela ainda passou por uma decepção familiar nos anos 1960, quando sua sobrinha, Françoise Dior, se declarou neonazista e se casou com uma figura de extrema direita. Catherine, que nunca mais pisou na Alemanha ou usava produtos alemães depois da guerra, se viu obrigada a fazer uma rara declaração oficial de que Françoise não falava pela Maison Dior.
Uma de suas raras vezes respondendo sobre o período da guerra, Catherine Dior explicou de onde tirou a força para sobreviver: “Ame a vida, meu jovem. Ame a vida”.
Alguém duvida do destaque de Maisie Williams com essa personagem incrível?