Desde sua 1ª temporada que o compositor Ramin Djawadi ganhou um papel de roteirista indireto da (complexa) trama de Westworld, série é baseada no filme de 1973, por sua vez, uma adaptação do livro de Michael Crichton. Porém, além da fotografia e interpretações espetaculares, foi a trilha sonora da série que ganhou o coração dos fãs.
É uma viagem visual e intelectual fascinante, especialmente interessante pelas escolhas musicais de Ramin, endeusado pelo seu icônico trabalho em Game of Thrones. Além dos temas originais de Westworld, em cada temporada o maestro trabalha em covers de rock que complementam a trama e nos encantam ao mesmo tempo.
Na temporada de estréia, a música do cabaret onde Maeve (Thandiwe Newton) trabalhava, nos dava muitas dicas do timeline, assim como o sentimento das personagens e as possibilidades da história. De Radiohead a Amy Winehouse, Rolling Stones ou Nirvana, foi uma delícia antecipar e acompanhar. Na 1ª temporada, os arranjos praticamente ficaram “presos” ao piano, mas aos poucos foi ganhando arranjos orquestrais grandiosos. Em uma entrevista de 2016, o autor comparou o uso da canção Fake Plastic Trees, da banda Radiohead, ao tema central de “Westworld”, onde decifrar o que é real é um dos desafios principais.
E é isso mesmo. A seleção feita por ele combina perfeitamente com a dualidade da trama. Ouvimos clássicos como No Surprises (Radiohead), Black Hole Sun (Soundgarden), Paint It Black (Rolling Stones), Back in black (Amy Winehouse), Seven Nation Army (White Stripes) e até A Forest (The Cure). Para Ramin, o fator surpresa foi uma das coisas que também o divertiu na curadoria, feita em sintonia com o showrunner, Jonathan Nolan, que escolhe as músicas de acordo com a cena e Ramin faz a versão “redux”, no piano, antes de orquestrá-la. Para ele algo fácil porque era o que fazia como adolescente, aprendia as músicas de ouvido e depois fazia seus próprios arranjos. No caso de Westworld, é a âncora mais próxima da “realidade”, uma vez que a música moderna às vezes distoa com o cenário do parque. Como ele mesmo descreveu, é um lembrete sutil que há algo pensado ali e apenas a música pode acrescentar. Ramin resumiu que cada orquestração é tratada como um evento.
Em uma série cuja tagline é sobre os sentidos, “Uma odisseia sombria sobre o destino da vida senciente na Terra”, a música ganha mesmo relevância. Naturalmente, no começo, o saloon parecia prender a trilha sonora ao piano, mas aí entra a genialidade de Ramin, que não ficou restrito ao som minimalístico nas temporadas seguintes. Se os temas modernos nos ajudam a manter a âncora da timeline, também a criam subtemas para as personagens. Na 1ª temporada o compositor gostou do arranjo de Paint It Black, usado para Hector (Rodrigo Santoro) no tiroteio épico. Já Codex, de Radiohead, encerrou a segunda temporada com muita emoção para Bernard (Jeffrey Wright). E o que dizer da inesquecível promo da 2ª temporada com Runaway, de Kanye West? É a trilha sonora exercendo seu papel e imortalizando momentos emocionantes. Que podem se repetir.
Paint it Black tocou quase sempre em que Rodrigo Santoro e seus companheiros bandidos estavam em cena, como quando voltou em Shogun World. Já Runaway foi pano de fundo de um flashback em que Dolores (Evan Rachel Wood) se lembra da visita ao mundo real antes de ser “acordada” como host. Back in Black sonorizou o momento em que Maeve assume controle de todos em Westworld.
Um dos mais belos momentos da série foi ao som de Nirvana, Heart-Shaped Box, com a história trágica e emocionante de Akecheta (Zahn McClarnon) na busca de sua amada, Kohana (Julia Jones). Já na terceira temporada, a revisitação de Wicked Games, de Weekend, também ganhou roupagem de destaque. Na trilha sonora ainda teve David Bowie (Space Oddity), Bjork (Hunter) e até Guns ‘n Roses com Sweet Child o’Mine. Cada arranjo orquestral mais envolvente que o outro.
Ainda não sabemos todos os covers da 4ª temporada, mas encerrar o 1º episódio com Videogames, de Lana del Rey trouxe romantismo e nostalgia. Afinal, como “Christina”, Dolores é uma roteirista de videogames. E reencontrar Teddy (James Marsden), que tinha sido sacrificado na 2ª temporada aos acordes do refrão (onde ela cantaria “it’s you, it’s you, it’s all for you”) foi emocionante.
Em breve teremos a assinatura de Ramin na trilha de House of the Dragon também. Não é à toa que ele já consta da minha dos mais requisitados compositores de trilha sonora do momento. Gênio!