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Ana Claudia Paixão

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A jornalista Ana Claudia Paixão (@anaclaudia.paixao21) fala de filmes, séries e histórias de Hollywood
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A atemporalidade da instabilidade sucessória nas séries

Seja em 'Succession', 'Becoming Elizabeth' ou 'House of the Dragon', o poder pode despertar o pior das pessoas

Por Ana Claudia Paixão
Atualizado em 19 ago 2022, 09h40 - Publicado em 19 ago 2022, 08h28
House of the dragon
Cena de 'House of the dragon', que estreia nesta semana.  (HBO/Divulgação)
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“Rei morto, rei posto”. O ditado popular simplifica a tradição de transferência de poder, um conceito que saiu da Corte francesa onde a lei determinava que “le mort saisit le vif” (o morto é substituído pelo vivo), ou seja, a soberania de um rei seria instantaneamente passada para seu herdeiro assim que morresse, sem precisar nem aguardar a coroação. “O Rei está morto, longa vida ao Rei” passou a ser o anúncio oficial dessa ordem natural das coisas. Se tudo fosse simples assim.

O meio usado por regentes para garantir continuidade sempre foi o de anunciar, desde que possível, quem será seu substituto. Porém, ao oficializar quem herda a coroa, se estabelece uma opção para quem não está satisfeito, ou seja, nem sempre é possível evitar complôs, guerras, assassinatos e golpes de estado que enchem as páginas de História. O conceito, claro, se aplica fora da monarquia também. A série Succession, da HBO Max, clara com seu título, é justamente sobre a briga de herdeiros de quem vai herdar o comando de um império de comunicação.

Não é à toa que Succession esteja ganhando todos os prêmios ao qual é indicada (alô, Emmys em setembro!) e seja comparada à Rei Lear, de William Shakespeare. A peça, considerada uma das mais densas do bardo inglês, fala de um rei que divide seu poder e terras entre duas de suas filhas, mas a ambição e ganância de ambas o torna andarilho e insano, no meio de todas as maquinações políticas. Portanto, não é surpresa que tantas tramas de filmes e séries ou livros usem a questão da transferência do poder como mola central da ação porque a ganância frequentemente induz a crimes e dramas.

Em Becoming Elizabeth, da StarzPlay, Elizabeth I e Mary I terminaram a 1ª temporada como inimigas (ainda veladas) em vez de irmãs. Tudo pela Coroa. Nem precisa lembrar que Game of Thrones foi outro título aludindo à disputa pelo trono. Agora vamos acompanhar House of the Dragon. A série, que é uma adaptação de alguns capítulos do livro Sangue e Fogo, reflete também sobre temas como sexismo e manipulação, com duas mulheres transformadas em inimigas mortais: Rhaenyra Targaryen e Alicent Hightower. Sempre usando a História como referência, tanto Daenerys Targeryen em Game of Thrones como Rhaenyra Targaryen em House of the Dragon lidam com os problemas da lei sálica.

De origem também francesa, a Lei Sálica estabelecia regras hereditárias e de sucessão, excluindo totalmente os direitos das mulheres e seus herdeiros. Um dos argumentos para isso era porque, através do casamento, a posse de tudo que uma mulher tivesse seria automaticamente passada para o marido, incluindo a Coroa. Em tempos em que as mulheres eram vendidas para alianças políticas, tornou-se necessário criar um impedimento de que um inimigo acabaria herdando o reino.

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Na série Game of Thrones, Jon Snow, filho do irmão mais velho de Daenerys, tinha prioridade sobre o trono porque seu direito vinha pelo pai. Ele não queria ser rei e Daenerys não queria compartilhar o que lutou para alcançar, mas a mera existência de um homem com maior direito do que ela tirou o equilíbrio e acabou com uma facada no coração. Literalmente. Em House of the Dragon, a aplicação de um conceito parecido com o da lei sálica na ordem sucessória dos Targaryens é o início de todo o drama da série.

house of the dragon
Na trama de ‘House of the dragon’, homens preferem matar e morrer do que ter uma mulher no trono. (HBO/Divulgação)

A série começa com a explicação do momento da saga onde a herdeira do Trono de Ferro seria uma mulher, mas ela “perde” sua vez justamente por causa do seu gênero. Como o karma é implacável, em seguida a situação se repete: o escolhido no seu lugar, Rei Viserys I, só tinha Rhaenyra como filha. Porém, em vez de manter a tradição da linhagem masculina, ele a declara sua sucessora. O que fica problemático depois que, no segundo casamento, ele tem filhos homens e sua esposa (Alicent) considera correto que eles sejam os sucessores oficiais, seguindo a tradição. Receita para uma guerra civil.

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Essa relação entre Rhaenyra e Alicent me fez pensar no final da 1ª temporada de Becoming Elizabeth, uma série escrita e dirigida por mulheres e onde o conflito entre Elizabeth I e Mary I deixou de ser puramente maniqueísta. Mary, que desconfia dos interesses de Elizabeth I, a avisa: “Sempre que há uma chance de poder, um homem procura a mulher que possa dar a ele”, ela diz. “E você deve sempre saber. Eles vieram pelo que você é [herdeira do trono] e vieram por si mesmos [para conseguir esse poder]”, completa. O resultado, tanto na história real como no fictício universo de House of the Dragon, é o derramamento de sangue. Provando que a sucessão de poder ainda é, e será por muito tempo, o gatilho para despertar o pior no ser humano. Fantasia ou não.

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