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De Ruth e Raquel a Hitchcock, Eva Wilma relembra os 67 anos de trajetória

“É uma questão de respeito à competência”, afirma a atriz, de 86 anos, sobre a presença de veteranos na teledramaturgia  

Por Ana Carolina Pinheiro Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO
Atualizado em 18 set 2020, 11h50 - Publicado em 18 set 2020, 11h41
 (Miro Branco/CLAUDIA)
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A rotina na quarentena foi definida como depressiva por Eva Wilma, 86 anos. Para contornar o clima caótico instaurado pela pandemia, a escolha foi dar continuidade às atividades que já fazia, só que com adaptações. “Olha tenho feito fisioterapia em casa três vezes por semana e aproveitei para colocar minhas leituras e estudos em dia”, revela a atriz, que também teve uma agenda agitada de entrevistas nas últimas semanas. Com uma memória apurada, o relato de seus 67 anos de carreira se entrelaça com a história dos 70 anos da televisão no Brasil.

Foi dentro de casa, que a paulistana estreitou os laços com a arte, dedicando-se principalmente ao balé. Aos 14 anos, Eva já era bailarina clássica e flutuava sobre os linóleos dos principais teatros do Brasil. De coxia em coxia, veio o convite para estrear nos palcos, com Procópio Ferreira, e depois na recém-chegada televisão, em Namorados de São Paulo, renomeada para Alô, Doçura!, na extinta TV Tupi. A fórmula do programa, que contava histórias e dilemas cotidianos de casais, ficou no ar de 1953 a 1964, ganhando um espaço no Guiness Book por ser a série nacional mais longa. Nos dois primeiros anos de exibição, Eva e o também ator do programa, John Hebert, interpretaram um casal, que foi estendido para a vida real. O casal, que se separou em 1976, teve dois filhos Vivien Riefle Buckup e John Herbert Riefle Bucku.

No livro Eva Wilma Arte e Vida (Imesp), a atriz relembra histórias que viveu nas emissoras pelas quais passou, como Tupi, Record e Globo. São mais de 34 peças de teatro, 54 trabalhos na televisão e 21 filmes no currículo carregado de encontros e gratidão. Da versão original de Mulheres de Areia, na qual interpretou as icônicas gêmeas Ruth e Raquel, a Tia Íris, que está no ar na reexibição de Fina Estampa, Eva transita entre personagens com os mais variados comportamentos e bagagens. Assim como sua carreira, para uma das damas da televisão, fazer arte é sinônimo de trabalho em equipe de constante renovação. Em entrevista a CLAUDIA, Eva Wilma celebra autores da teledramaturgia, a vivacidade de profissionais experientes e a cultura

Em uma entrevista em junho, você definiu a quarentena como algo depressivo. O que tem sido a sua válvula de escape nesses meses?

Você tomar conhecimento do que está acontecendo no mundo, especialmente no nosso país, é angustiante, dá muita vontade de consolar as famílias. É uma situação muito triste. Mas, olha, além de fisioterapia, leitura e estudos, também estou me preparando com aulas de canto, que continuo tendo online. Há dois anos, faço o musical Casos e Canções, junto com o meu filho, que é compositor, violinista e cantor. Resolvemos não parar nesse momento e continuar se apresentando em lives de dentro de casa. Então, tem também os ensaios, mas tudo em um clima intimista.

Como que a relação com a arte foi construída entre você e seus pais?

Na minha infância, meus pais se revezavam ao piano. Minha mãe era concertista, já meu pai tocava de ouvido. Eles me proporcionaram aulas particulares com Inezita Barroso. Então, cantar e dançar já era um hábito desde a minha segunda infância por conta dessa generosidade deles me proporcionarem essas aulas. Além disso, no colégio, tinha aula de canto orfeônico, aproximando-se desde músicas populares a clássicas. Ou seja, a música sempre foi muito presente. Mas estava convencida de que me entregaria à carreira de bailarina clássica, até porque a minha mestra foi quem criou o corpo de baile do Teatro Municipal de São Paulo, Maria Oleneva. Quando tinha 14 anos de idade, fizemos uma turnê de dois meses se apresentando em todo os teatros, sendo que íamos de navio e fazíamos aula a bordo. A partir dessa experiência, recebi o primeiro convite para atuar no primeiro teatro de arena. Logo de cara fiz Uma pulga na balança, com Procópio Ferreira.

E como surgiu a oportunidade na TV?

Antes de receber o primeiro convite, eu frequentava muito teatro, principalmente o Teatro Brasileiro de Comédia (TBC). Ficava esperando para falar com os atores e dizer que tinha gostado da peça. Em uma dessas conversas, me deram um recado do Cassiano Gabus Mendes, da Tupi, que foi o primeiro diretor artístico da televisão na América do Sul. Era uma proposta para atuar em Alô, Doçura!, tinha 19 anos e meu pai foi comigo. A série era inspirada no programa de rádio O Encontro das Cinco, do Otávio Gabus Mendes. Na época da escola, chegava correndo do colégio para ligar o rádio. Não perdia esse programa, que tinha personagens diferentes e muito humor.

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Como era a rotina de gravação em Mulheres de Areia para interpretar gêmeas em uma época em que não existia tantos recursos tecnológicos?

Mulheres de Areia original era feita quase que artesanalmente. Já a versão que foi refeita pela Globo tinha muitos efeitos especiais e tecnologia mesmo. Então, tive que estudar muito, mas também tínhamos mais tempo para ensaiar. Ficávamos a tarde toda.  Foi um trabalhoso, mas extremamente prazeroso, principalmente pelo talento da Ivani Ribeiro e de toda a equipe.

Nesses 70 anos, a autoria das novelas se concentrou na mão de autores homens. Acredita que ,por ser um espaço que simboliza poder, a inserção de mulheres foi e é mais lenta?

Um dos principais estímulos do ator é o texto, que a Ivani estruturava como ninguém. Ela foi pioneira e abriu caminhos para as mulheres das gerações seguintes. Felizmente, isso vem mudando ao longo do tempo e temos mulheres fantásticas escrevendo, inclusive para a televisão. A Duca Rachid e Thelma Guedes, que escreveram a novela Órfãos da terra, são exemplos de talentos contemporâneos.

Nas últimas semanas, internautas, principalmente famosos, usaram as redes sociais para manifestar o desejo de ver mais veteranos na televisão. A idade é o maior empecilho para o artista experiente que deseja ou precisa trabalhar?

Nessa minha carreira, tive a oportunidade de fazer um teste em Hollywood com o famoso mestre Alfred Hitchcock, nos estúdios da universidade. Ele estava procurando uma atriz latino-americana para uma personagem. Me perguntaram se eu faria o teste, e fiz. Quando conto essa experiência, por exemplo, sempre descrevo a emoção que tive de entrar dentro do estúdio e ver a equipe técnica com pessoas de todas as idades, inclusive veteranos. Isso não é um problema só do ator, é geral. É uma questão de respeito à competência. O mercado de trabalho está sufocante de qualquer maneira, mas pra quem está na idade da grande sabedoria fica mais complicado ainda.

Ferreira Goulart dizia que a arte existe, porque a vida não basta. Então, tanto a arte como a cultura são itens básicos para o nosso desenvolvimento como nação.

Eva Wilma, atriz
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A reexibição de Fina Estampa acendeu um debate sobre situações de submissão e estereótipos. Como você enxerga essas revisões em relação à obra de 2011?

Agnaldo Silva é o mesmo autor da Indomada e continuará escrevendo coisas maravilhosas, porque é um talento. Tecnicamente era uma outra época, mas o talento de quem escreve permanece.

E o que garantirá mais 70 anos para a TV no Brasil?

Se você fizer uma análise de todos os grandes autores e diretores nesse período, há uma evolução, junto com todos os recursos tecnológicos. Às vezes, nós atores podemos até achar isso menos estimulante. Mas, mesmo sendo até engraçado quando tem muito efeito especial, sabemos que tem a sua razão de ser. Não adianta, porque é o progresso tecnológico e não vamos regredir, não. Quando fiz uma novela chamada Araguaia, me falaram para olhar em um gramado e imaginar o Rio. Então, é preciso ter essa adaptação e respeitar.

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