Ilustrações coloridas dos genitais e dos órgãos do sistema reprodutivo geralmente são as primeiras imagens apresentadas a crianças e adolescentes quando vão estudar sexualidade. Nos livros escolares, vêm acompanhadas de textos sobre reprodução, métodos contraceptivos e DSTs.
Pouco se fala sobre prazer – muito menos sobre satisfação para as mulheres – e em que medida ele faz parte da construção de uma vida saudável e plena. Ainda estamos distantes de desmistificar o clímax feminino.
Nesse processo, são decisivas a noção de que as mulheres não apenas podem ter orgasmos como são multiorgásmicas e a conclusão científica de que o clitóris corresponde ao pênis em matéria de prazer.
Com cerca de 8 mil terminações nervosas, o órgão é responsável pelo gozo inclusive no sexo vaginal. Entretanto, esses conhecimentos não são muito difundidos, e a sexualidade feminina ainda provoca controvérsias, dúvidas e vetos.
Para entender o que pensam e quais as atitudes das mulheres brasileiras em relação a sexo, CLAUDIA, em parceria com a empresa de pesquisa digital MindMiners, entrevistou 1.328 mulheres maiores de 18 anos.
Conhecemos os desejos, os obstáculos e as aspirações femininas. Para 95% delas, sexo é um ato de prazer e para 84% não há vida feliz sem satisfação sexual. No entanto, 61% afirmam estar descontentes nesse campo. Boa parte das inquietações passa pelo questionamento do que seria normal no sexo e de como, finalmente, conquistar o próprio prazer.
Atenção ao seu corpo
Para começar esse papo, vale retomar a anatomia – desta vez, ampliando o olhar sobre o que trazem os livros didáticos. É comum as mulheres (considerando aqui as que têm genitália biologicamente feminina) nomearem o próprio genital como vagina, esquecendo outros elementos que formam a vulva, como os lábios e o clitóris.
“Assim, tudo gira em torno de um buraco que serve para penetração, o que nem sempre é proveitoso para elas”, afirma Mariana Stock, fundadora da Casa Prazerela, em São Paulo, que se propõe a orientar mulheres a ter mais satisfação no sexo.
Esse desconhecimento, aliado a inibições, reverberou nas respostas que recebemos. “Só após 12 anos de casamento descobri o formato do clitóris, o que ajudou a me masturbar melhor” e “Às vezes fico com vergonha de falar o que eu gostaria de descobrir sobre o prazer do meu corpo com o parceiro” estão entre as revelações e desabafos.
As entrevistadas também entregaram seus dilemas e questões: “É normal sentir dor ou desconforto?” ou “Como alcançar satisfação sexual sem ter um parceiro?”. E muitas queriam saber como ter um orgasmo. “Até hoje nenhum médico conseguiu me explicar por que não consigo”, escreveu uma delas.
46% têm dificuldade para chegar ao orgasmo e 7% nunca tiveram um. O problema é que relações insatisfatórias tendem a desmotivar novas tentativas, criando um ciclo que raramente cessa. Já em uma relação proveitosa, pelo contrário, o corpo libera dopamina, neurotransmissor de recompensa, despertando o desejo de repetir a experiência.
Grande parte das mulheres (72%) afirmou transar com menos frequência do que gostaria e 39% disseram ficar muito preocupadas e não conseguir relaxar totalmente na hora do sexo. As maiores de 35 anos têm mais facilidade em alcançar orgasmos do que as mais jovens, talvez porque experiência e adaptação ajudem no prazer.
Explore-se
Uma em cada quatro mulheres entrevistadas nunca se masturbou
Os especialistas são unânimes em afirmar que a masturbação ajuda – e muito. Um bom começo é procurar conhecer seus pontos de prazer. “A masturbação é essencial e inclui tocar o corpo todo, se massagear para entender suas áreas erógenas, que não estão apenas nos genitais. Ela melhora até as relações”, aponta a ginecologista Halana Faria, do Coletivo Feminista Sexualidade e Saúde, em São Paulo.
Entretanto, 25% das entrevistadas confessaram que nunca se masturbam. Entre as que o fazem, a frequência é menor para mulheres de 45 anos ou mais. Na outra ponta, que inclui as mais jovens, 22% afirmam se masturbar mais de três vezes por semana.
O hábito é bastante democrático, já que não exige investimentos além do autocuidado. É importante que seja mantido mesmo em relacionamentos estáveis. Para impulsionar orgasmos, os vibradores costumam ser eficientes. Entre as mulheres que responderam à pesquisa de CLAUDIA, 25% já usaram esse tipo de estímulo.
7% afirmaram estar muito satisfeitas com o próprio corpo e 23% disseram conhecê-lo completamente e saber como ter prazer com ele. A média de satisfação é quase uma nota vermelha: 5,8 em uma escala de 0 a 10 pontos.
O nível de conhecimento é de 7,3. Esses números são sinais de alerta, já que as mulheres que apontaram maior satisfação com o corpo relataram que chegam ao orgasmo com maior facilidade, não aceitariam o relacionamento se não estivessem felizes com o sexo e não desejam mudar a vida sexual.
Experimentações
Embora 92% das participantes concordem que para o sexo ser bom é necessário empenho nas preliminares, nem todas estão dispostas a experimentar novas modalidades sexuais. Entre as possibilidades mais rejeitadas estão as que incluem uma terceira pessoa, como troca de casais e ménage à trois.
Por outro lado, cerca de 80% afirmaram que já fizeram ou já receberam sexo oral e mais da metade já fez sexo anal. Quanto aos fatores que inibem o sexo no cotidiano, a menstruação foi apontada como um impeditivo para relações sexuais por três em cada dez mulheres. Mas o maior motivador para deixar de transar é a presença dos filhos no mesmo cômodo.
Tendência positiva
As mais jovens tiveram mais conversas sobre sexo com os pais e pretendem abordar o assunto com os filhos
Em meio a um cenário que muitas vezes se apresenta negativo para a emancipação das mulheres no que se refere à sexualidade, a perspectiva parece se mostrar mais otimista.
Pelo menos no que depender das conversas entre pais e filhos, que demonstraram ser mais comuns para a atual geração. Entre aquelas com mais de 55 anos, apenas 6% mantinham diálogo em casa sobre o assunto. Já entre as que estão na faixa de 18 a 24 anos, um terço pôde contar com essa abertura com os pais.
A boa notícia é que, atualmente, 86% das mulheres já falam ou pretendem falar com os filhos adolescentes sobre sexo. Discutir essas questões com clareza permite que eles tracem os próprios limites, evitando tanto abusos e gravidez precoce quanto inibições para exercer a própria sexualidade de maneira livre.
Diálogo aberto
Uma em cada dez mulheres nunca se sente à vontade para falar sobre sexo, inclusive com amigas ou médicos – 32% das que estão em um relacionamento não abordam o tema com o parceiro (ou a parceira).
As que mantêm esse diálogo fazem sexo com mais frequência, são muito mais propensas a novas experiências, ficam significativamente menos preocupadas durante as relações e entendem que elas podem ser prazerosas mesmo após anos de relacionamento. Entre as mulheres do primeiro grupo, que não conversam com o parceiro, 75% afirmam que gostariam de ter uma vida sexual diferente e 71% que não conseguem relaxar durante o sexo.
Já entre as do segundo grupo, que dialogam, esses índices despencam para 48% e 38% respectivamente. As conversas sobre sexo com médicos não estão em dia para 66% das mulheres, sendo que uma das principais queixas delas é de que os profissionais não costumam dar ouvidos para as dificuldades femininas em busca de prazer.